Marques'Almeida mergulharam na tradição portuguesa para se apresentarem em Paris

A marca, criada por Marta Marques e Paulo Almeida, trocou a semana de moda de Londres pela de Paris. Com referências ao fado e às tradições, a colecção, apresentada esta quarta-feira, é uma interpretação das raízes portuguesas.

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Marques'Almeida completou um ciclo, voltando às origens. A dupla de criadores portugueses (Marta Marques e Paulo Almeida), sediada em Londres, estreou-se no calendário oficial da semana de moda de Paris, esta quarta-feira, no museu de arte contemporânea Palais de Tokyo, apresentando uma colecção de resort inspirada em técnicas, silhuetas e padrões portugueses, com o apoio do Portugal Fashion. Das referências a Viana do Castelo à imagem dos xailes com franjas, esta é uma interpretação pouco literal "de quem já está a viver em Londres há muitos anos", comenta Marta Marques ao PÚBLICO, por telefone.

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Marques'Almeida completou um ciclo, voltando às origens. A dupla de criadores portugueses (Marta Marques e Paulo Almeida), sediada em Londres, estreou-se no calendário oficial da semana de moda de Paris, esta quarta-feira, no museu de arte contemporânea Palais de Tokyo, apresentando uma colecção de resort inspirada em técnicas, silhuetas e padrões portugueses, com o apoio do Portugal Fashion. Das referências a Viana do Castelo à imagem dos xailes com franjas, esta é uma interpretação pouco literal "de quem já está a viver em Londres há muitos anos", comenta Marta Marques ao PÚBLICO, por telefone.

"Foi a primeira vez que decidimos olhar para as nossas raízes como inspiração", conta a criadora. "Estivemos sempre a olhar para a frente. E desta vez, depois de tanto tempo de explorar aquilo que fomos aprendendo noutros países e culturas, fazia sentido voltar às nossas raízes." 

Criada em 2011, a Marques'Almeida assegurou em 2013 uma posição permanente no calendário da semana de moda de Londres, depois de algumas temporadas na ModaLisboa. A marca é conhecida pelo uso de ganga, mas não se define pelo seu uso, antes este é um dos principais meios que utilizam para explorar diferentes tipos de construções, sempre num estilo effortless. No próximo mês, a marca regressa a solo português, com um desfile integrado no calendário do Portugal Fashion, entre 18 e 20 de Outubro.

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Com uma equipa em crescimento, actualmente são mais de duas dezenas de pessoas (três sediadas em Portugal), a Marques'Almeida deverá duplicar este ano a facturação em relação a 2015 (1,4 milhões de euros), superando os três milhões de euros. De acordo com a criadora, esperam facturar entre 3,2 e 3,3 milhões.

Fugir ao calendário

"Estamos num ponto de viragem importante para aquilo que vai ser o futuro da marca", admite Marta Marques. "Fomos apercebendo-nos, no último ano, das mudanças que estão a acontecer no mercado. Por causa do acesso directo ao consumidor, o modelo mais tradicional de venda se calhar não estava a funcionar tão bem", explica. Fugindo ao calendário tradicional de apresentações, as peças apresentadas em Paris (as mesmas que irão expor no Portugal Fashion) já começaram a entrar em loja.

Tal como outros criadores, a dupla portuguesa tem vindo a questionar a forma como tradicionalmente as colecções são criadas, apresentadas e comercializadas, já que "a maneira como as pessoas estão a consumir moda é diferente" e as peças correm imediatamente o mundo, a partir dos smartphones da plateia do desfile. Nos últimos anos, algumas marcas eliminaram o tempo de espera de seis meses, mostrando em passerelle aquilo que está já pronto para entrar em loja. Cunhou-se o termo see now, buy now e houve quem acreditasse que assim seria o futuro da indústria, mas até agora não se estabeleceu um modelo standard. Algumas marcas até voltaram atrás.

"Acho que não vai haver um segundo modelo. Cada marca vai ter de encontrar o que funciona mais para si", comenta Marta Marques. A dupla portuguesa está focada em encurtar a relação com o cliente final e na aposta na venda directa — para já, na loja online e em pop-up stores. "É quase como construir uma empresa nova. É um plano de negócio completamente diferente. Esperamos que [as vendas directas] apanhem rapidamente a venda grossista nos próximos dois ou três anos". 

"O que pretendemos é falar mais com o consumidor final", resume Marta Marques. "Sentimos que para a nossa marca isto é o que funciona. Nós sempre tivemos essa ligação", nomeadamente através das redes sociais, defende. "Criámos uma base de clientes bastante forte em Londres", aponta a criadora. "Gostávamos de fazer isso noutros territórios. Queremos perceber onde está a nossa pequena comunidade de M'A girls em Paris, em Los Angeles, em Itália, em Portugal, na Ásia...", continua. "De resto, o futuro está em aberto."

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Paulo Almeida e Marta Marques, no agradecimento no final do desfile

"Sentimos que as convenções do sistema não eram necessárias para nós", defende a criadora. "Não temos de mostrar sempre em Paris. Não temos de mostrar sempre a colecção seis meses antes. Nem temos de mostrar sempre enquadrados numa semana da moda. Se calhar podemos fazer um evento em Los Angeles na estação seguinte. Ou nem fazer uma colecção completa, mas uma cápsula..."

Raízes portuguesas

Ao som de Dead Combo, Sam The Kid (no seu tributo a Carlos Paredes), Gisela João e Marisa, a dupla de criadores explora vários símbolos da cultura portuguesa, num todo de 43 coordenados. "Temos o xadrez dos pescadores misturado com as riscas, temos as silhuetas de Viana, temos as saias folk, temos todas as franjas que vêm dos xailes, temos os looks de saias pretas a arrastar no chão, que para nós é a nossa versão de como o fadista se devia vestir hoje em dia", descreve Paulo Almeida, citado pela Lusa.

"Tem muitas inspirações em Portugal e no folclore", mas ao mesmo tempo, "não é muito literal", comenta Marta Marques, ao PÚBLICO. As franjas, por exemplo, surgem ora como vestidos compridos, ora como elementos de diferentes peças. Ao mesmo tempo, os bordados azuis a contrastar com o tecido branco de alguns vestidos remetem imediatamente para a tradição de Viana do Castelo, embora surjam em designs mais modernos. "Trabalhámos com artesãos em joalharia, carteiras e capacetes", revela ainda Marta Marques. 

Este ano, a dupla de criadores esteve entre os finalistas candidatos ao fundo de design do British Fashion Council (BFC/Vogue Designer Fashion Fund 2018), no valor de 200 mil libras (225 mil euros) – que acabou por ser atribuído à criadora Molly Goddard. Em 2014, foram premiados na categoria de Talento Emergente - Moda Feminina dos British Fashion Awards do BFC e, em 2015, receberam o prémio da LVMH para Jovens Estilistas de Moda – prémio da holding de marcas de luxo –, no valor de 300 mil euros, atribuído por um júri que incluiu, entre outros, Karl Lagerfeld e Marc Jacobs.

Também com o apoio do Portugal Fashion – embora fora do calendário oficial de Paris – Diogo Miranda e Luís Buchinho apresentam as suas colecções esta quarta-feira, ambos na Universidade de Paris Descartes.