António Costa já defendeu fim da PJ Militar
Corpo policial depende funcionalmente do Ministério Público, contando com cerca de seis dezenas de pessoas. Tem orçamento próprio e competência na investigação de crimes militares.
O primeiro-ministro António Costa defendeu, quando foi ministro da Justiça de António Guterres, entre 1999 e 2002, o fim da Polícia Judiciária Militar (PJM) através da sua fusão com a Polícia Judiciária (PJ).
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O primeiro-ministro António Costa defendeu, quando foi ministro da Justiça de António Guterres, entre 1999 e 2002, o fim da Polícia Judiciária Militar (PJM) através da sua fusão com a Polícia Judiciária (PJ).
Mais tarde, em 2006, o Governo de José Sócrates chegou a equacionar essa fusão, mas sem sucesso. Acabou por recuar dada a oposição das chefias militares. A proposta chegou a ficar registada preto no branco, mas a medida nunca seria aprovada em Conselho de Ministros.
Segundo o relatório do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado apresentado pelo Governo socialista em Março de 2006, a PJM devia ser transferida para o Ministério da Justiça. O relatório sublinhava que "as vocações da PJM, em grande parte coincidentes com as da PJ, e a sua reduzida dimensão, dificilmente legitimam a existência de uma estrutura autónoma". Na altura tinha cerca de 60 pessoas.
Por outro lado, frisava o mesmo documento, a PJ e a PJM tinham “competências similares, ainda que relativamente a crimes distintos" e que, por isso, previa-se com a fusão "ganhos de sinergias por partilha de uma mesma máquina".
Até 1975, era à hierarquia militar que competia a investigação de crimes cometidos no seio da instituição. “As autoridades militares acumulavam o exercício da autoridade judiciária com a competência para instaurar procedimento disciplinar e averiguar a prática de ilícitos disciplinares”, descreve um coronel de infantaria na reserva, Gil Prata, num artigo publicado na Revista Militar, em 2012.
“Era urgente a criação de um serviço que se dedicasse exclusivamente à investigação criminal, com pessoal habilitado com os necessários conhecimentos técnico-jurídicos e militares”, refere o mesmo artigo. O que veio a suceder em 1975, nos tempos do PREC – Processo Revolucionário Em Curso. O Serviço de Polícia Judiciária Militar foi criado na dependência directa do Conselho da Revolução, tendo como objectivo investigar os crimes militares e instruir os respectivos processos. Em 1993, este serviço passa a depender do ministro da Defesa e assume o actual nome: Polícia Judiciária Militar.
“Para a investigação dos crimes estritamente militares, o legislador atribuiu competência específica” a este corpo policial, descreve Gil Prata, que já foi subdirector da Judiciária Militar. Em causa está a especificidade dos ilícitos em questão e a sua “evidente preparação para desempenhar as funções de investigação e de coadjuvação das autoridades judiciárias, pois é uma polícia especializada e vocacionada para actuar nas unidades militares onde se colocam questões de segurança e disciplina militar”.
Catálogo de crimes
E que tipo de crimes são estes? Da traição à pátria até ao favorecimento do inimigo, vários dos ilícitos descritos no Código de Justiça Militar aplicam-se sobretudo a situações de guerra. Mas também fazem parte do catálogo a corrupção activa e a passiva, bem como o homicídio de superior hierárquico ou de subordinado. A PJ Militar encontra-se na dependência funcional do Ministério Público e a nível administrativo depende directamente do Ministério da Defesa.
A revisão constitucional de 1997 reviu todo o sistema de justiça militar e acabou com os tribunais militares em tempo de paz. Este tipo de crimes passou a ser julgado nos tribunais comuns. Com uma nuance: existe sempre um juiz militar entre o colectivo encarregue deste tipo de casos, não sendo obrigatório que seja licenciado em Direito. A reforma demorou alguns anos a entrar em vigor, obrigando à adaptação da Lei Orgânica da Polícia Judiciária Militar (em 2001) e do Código de Justiça Militar (2003). Só em 2004, o quadro legal ficou estabilizado. E a PJM permaneceu como “corpo superior de polícia criminal auxiliar da administração da justiça, organizado hierarquicamente na dependência do Ministro da Defesa Nacional e funcionalmente dependente do Ministério Público para efeitos da investigação criminal”.
O seu orçamento triplicou nos últimos anos: passou de 810 mil euros em 2014 para 2,5 milhões neste ano. Verba que foi, mesmo assim, inferior à de 2016, ano em que a Judiciária Militar recebeu um orçamento de 2,8 milhões, parte dos quais (1,1 millhão) para salários.
As relações entre a PJM e a PJ nem sempre foram fáceis nos últimos tempos. E se na Operação Zeus houve uma colaboração mútua que permitiu apanhar mais de 40 militares envolvidos num esquema nacional de corrupção nas messes, o mesmo não sucedeu no caso de Tancos. Já no caso das mortes no curso dos Comandos, cujo julgamento começa esta quinta-feira, foi investigado exclusivamente pela PJM. Com São José Almeida