Europa, China e Rússia tentam salvar acordo com novo "mecanismo de pagamentos"

A ideia é criar um sistema que permita às empresas europeias contornarem as sanções norte-americanas. Diplomatas e analistas duvidam da sua eficácia.

Foto
O anúncio foi feito por Federica Mogherini, responsável pela política externa da UE LUSA/ANDRE PICHETTE

Os países que se mantêm no acordo sobre o programa nuclear do Irão concordaram em continuar a trabalhar em conjunto para manterem as relações comerciais com Teerão, apesar de todo o cepticismo que rodeia o regresso da segunda fase de sanções norte-americanas, marcado para Novembro.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Os países que se mantêm no acordo sobre o programa nuclear do Irão concordaram em continuar a trabalhar em conjunto para manterem as relações comerciais com Teerão, apesar de todo o cepticismo que rodeia o regresso da segunda fase de sanções norte-americanas, marcado para Novembro.

O Presidente dos EUA, Donald Trump, decidiu em Maio abandonar o acordo e restaurar as sanções económicas contra o Irão, incluindo as que têm como objectivo forçar os principais clientes do petróleo iraniano a deixarem de comprar ao país.

Num comunicado emitido no final de uma reunião entre Reino Unido, China, França, Alemanha e Rússia, à margem da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, o grupo disse que está determinado a desenvolver um mecanismo de pagamentos para que seja possível manter as transacções comerciais com o Irão.

"Conscientes da urgência e da necessidade de se alcançarem resultados tangíveis, os participantes saudaram a apresentação de propostas práticas para se manterem e desenvolverem canais de pagamento, em particular a iniciativa para se estabelecer um Veículo para Fins Especiais, para facilitar os pagamentos relacionados com as exportações iranianas, incluindo o petróleo", disse o grupo em comunicado.

Vários diplomatas europeus disseram que a ideia deste mecanismo é criar um sistema de troca directa, semelhante ao que foi usado pela União Soviética durante a Guerra Fria, para trocar petróleo iraniano por bens europeus sem que o dinheiro mude de mãos.

A ideia é contornar as sanções dos EUA que vão ser repostas em Novembro, mediante as quais Washington pode impedir o acesso ao sistema financeiro norte-americano por parte de qualquer entidade bancária que permita transacções com o Irão.

Numa conferência de imprensa após a reunião, a responsável pela política externa da União Europeia, Federica Mogherini, disse que a decisão de criar aquele mecanismo já tinha sido tomada, e que agora é a vez de os técnicos se encontrarem para fixarem os pormenores.

"Em termos práticos, isto significa que qualquer membro da União Europeia pode criar uma entidade legal para permitir transacções financeiras legítimas com o Irão, o que vai permitir que as empresas europeias continuem a fazer negócios com o Irão em conformidade com as leis da União Europeia, num mecanismo que estará aberto a outros parceiros no mundo", disse Mogherini.

Muitos diplomatas e analistas duvidam que este mecanismo possa servir para contornar as sanções norte-americanas, já que Washington poderá acrescentar a proibição do sistema de troca directa ao seu pacote de sanções.

"A chave é manter todas as possibilidades em aberto, para darmos a indicação aos iranianos que a porta não se está a fechar", disse um diplomata francês, sob anonimato.

A União Europeia não tem conseguido desenhar um mecanismo que possa proteger as empresas europeias das sanções norte-americanas. Na segunda-feira, o banco estatal francês Bpifrance deixou cair um plano para ajudar empresas francesas a manterem os seus negócios com o Irão.

O ponto fundamental do acordo, negociado durante mais de dois anos pelo ex-Presidente dos EUA, Barack Obama, é que o Irão trave o seu programa nuclear em troca do alívio das sanções que têm debilitado a economia do país.

Mas o actual Presidente norte-americano considera que o acordo é mau porque não inclui restrições ao programa de mísseis balísticos e ao apoio de aliados na Síria, no Iémen, no Líbano e no Iraque.

O regresso das sanções norte-americanas contribuiu para uma grande queda da moeda iraniana. O rial já perdeu cerca de dois terços do seu valor este ano, chegando este mês a um valor mínimo histórico face ao dólar.