Carlos Tavares: CMEC são filhos dos CAE e mantiveram "equivalência financeira"
O antigo ministro da Economia de Durão Barroso garante que os contratos polémicos da EDP foram criados com um objectivo de neutralidade financeira face aos instrumentos que visavam substituir, os CAE, que davam rentabilidades que ninguém "desdenharia ter".
O antigo ministro da Economia Carlos Tavares, que teve a tutela da Energia no governo de Durão Barroso, rejeitou esta terça-feira no parlamento que tenha sido "o pai" dos CMEC, contrapondo que estes são filhos dos CAE, e mantiveram "equivalência financeira".
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O antigo ministro da Economia Carlos Tavares, que teve a tutela da Energia no governo de Durão Barroso, rejeitou esta terça-feira no parlamento que tenha sido "o pai" dos CMEC, contrapondo que estes são filhos dos CAE, e mantiveram "equivalência financeira".
"Tenho lido na comunicação social que serei pai dos CMEC. Agradeço e não me envergonharia, mas os CMEC são filhos dos contratos de aquisição de energia [CAE], que constituíam um negócio que cada um de nós não desdenharia ter", afirmou Carlos Tavares na sua intervenção inicial na comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas na energia.
Segundo o antigo governante, a intenção dos CMEC era que "se mantivesse equivalência financeira" em relação aos CAE, "embora os CMEC tivessem riscos" que os cessantes CAE não comportavam.
Carlos Tavares saiu do governo, em Julho de 2004, e o decreto-lei 240/2004, que define as condições da cessação dos CAE e a criação de medidas compensatórias designadas custos para a manutenção para o equilíbrio contratual (CMEC), foi publicado em Dezembro, já com o governo de Santana Lopes demitido por Jorge Sampaio.
O antigo ministro da Economia realçou que ao longo das sucessivas fases de privatização da EDP, o Estado se foi apropriando "sucessivamente dos CAE, que constituía fluxo de caixa", considerando que "houve uma transferência de riqueza dos consumidores de energia, para o Estado, para os contribuintes, foi uma opção que foi feita".
Logo na intervenção inicial, o actual presidente da Caixa Económica Montepio Geral apelou à "compreensão [dos deputados] para as limitações naturais que decorrem, sobretudo, de memória sobre factos que aconteceram há 14 anos", bem como "o facto de não ser nenhum especialista em energia" e estar fora do sector desde que saiu do governo em 2004.
CMEC eram "solução equilibrada"
O antigo secretário de Estado da Energia Franquelim Alves também afirmou no parlamento, durante a manhã, que o princípio que norteou a criação dos CMEC era o da "neutralidade", garantindo que, quando saiu do governo em 2004, tinha sido encontrada "uma solução equilibrada".
"O princípio sempre assumido que foi que a base, a neutralidade económica, tinha de ser conseguida. Essa discussão envolveu muita gente. A temática específica dos CMEC [custos para a manutenção para o equilíbrio contratual] levou meses e meses. Encontrámos uma solução equilibrada", disse o secretário de Estado da Energia, do governo de Durão Barroso, que está a ser ouvido na comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas na energia.
Em resposta ao deputado do PS Hugo Costa sobre a paternidade da legislação que criou os CMEC (o decreto-lei 240/2004), Franquelim Alves sublinhou que não assistiu "ao parto da criança", uma vez que saiu do governo em Julho de 2004 e o diploma foi publicado em Dezembro, já com o governo de Santana Lopes, mas adiantou que as negociações envolveram "um núcleo ministerial que trabalhava em articulação com a ERSE e a REN, que ajudava bastante nas considerações a ser tidas em conta na transacção dos CAE para CMEC".
"Não houve preocupação em aumentar as receitas da EDP, mas de conseguir um quadro estável [na sequência da cessação dos CAE, imposta por Bruxelas] e isso bastaria para assegurar os objectivos da EDP no quadro de capitais", declarou, contrapondo que "ninguém aceitaria trocar um contrato blindado por incertezas totais".
À data importava também, acrescentou, "o interesse nacional, preservar o sistema eléctrico português, que precisava de se adaptar ao aumento da concorrência [decorrente da criação do mercado ibérico]".
Segundo o antigo governante, os CAE eram "contratos blindados", o que implicava que o governo tivesse de negociar com a eléctrica então liderada por João Talone para "dar o passo em frente", referindo que nesse processo nunca houve a "intenção de silenciar a ERSE", que "tinha liberdade total".
No entanto, admite, que a decisão política – de optar pelos CMEC – divergiu da do regulador do sector, que preconizava que este mecanismo não era a melhor solução.
Já questionado sobre os assessores contratados então pelo gabinete do ministro da Economia, Carlos Tavares, à Boston Consulting Group (BCG) – Ricardo Ferreira e João Faria Conceição –, Franquelim Alves disse que não os conhecia antes de chegar ao ministério e que "ambos tinham conhecimento e capacidade, sem dúvida, e foram determinantes do ponto de vista técnico na elaboração da componente técnica" dos CMEC.
"Não tenho nenhuma prova em contrário de que não tenham trabalhado em estreito cumprimento das orientações políticas dadas e com total independência", acrescentou mais tarde quando o deputado do CDS-PP Hélder Amaral insistiu nas contratações feitas à BCG.
Ricardo Ferreira é actualmente director do Departamento de Regulação e de Concorrência da EDP, empresa em que ingressou em Maio de 2005 e João Faria Conceição é administrador da REN - Redes Energéticas Nacionais.
Também questionado sobre a substituição de Jorge Borrego por Miguel Barreto à frente da Direcção-Geral de Energia, Franquelim Alves adiantou que foi uma "opção por alguém com um perfil diferente que não viesse directamente do sector", tendo o nome sido proposto por "contactos normais, com várias entidades".
Às questões do deputado do BE Jorge Costa sobre se as negociações para o decreto-lei 240/2004 previam incorporar a extensão da concessão do domínio hídrico à EDP, o antigo governante disse não ter "qualquer memória sobre isso".
"Não me recordo dessas questões de extensão do domínio hídrico, de todo", afirmou, ressalvando que "o projecto não estava fechado, estava sujeito a debate no processo conducente a aprovação. Havia espaço a interacções sucessivas".