Joana e Lucília
A nova procuradora-geral da República poderá também ter, daqui a seis anos, a oportunidade de sair por cima. Basta não estragar o que tem sido feito.
Marcelo e Costa assinaram um acordo ontem em Belém – a substituição de Joana Marques Vidal no cargo de procuradora-geral da República. É provável que esse acordo tenha um anexo importante, a assinatura da própria Joana Marques Vidal, que já tinha manifestado não ser defensora de reconduções naquele cargo.
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Marcelo e Costa assinaram um acordo ontem em Belém – a substituição de Joana Marques Vidal no cargo de procuradora-geral da República. É provável que esse acordo tenha um anexo importante, a assinatura da própria Joana Marques Vidal, que já tinha manifestado não ser defensora de reconduções naquele cargo.
A decisão é de alto risco político. É verdade que Joana Marques Vidal fez história ao deixar, finalmente, o Ministério Público trabalhar e cumprir a Constituição, não discriminando ninguém pela cor da pele ou estatuto social. E todos sabemos que a Justiça durante longos anos contemporizou com o estatuto social – réstias de feudalismo que chegaram aos nossos tempos.
A herança de Lucília Gago é, por isso, pesada. Vai ter sobre si um escrutínio muito mais apertado do que tiveram os seus antecessores, nomeadamente de quem suspeita que, ao não reconduzir Joana Marques Vidal, o Governo e o Presidente estão a dar um sinal de que, afinal, preferem complacências anteriores. Mas não há nenhuma razão para duvidar das capacidades da mulher que a própria Joana Marques Vidal escolheu para suceder a Maria José Morgado à frente do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa. A ideia de que todas as investigações que estão em curso em todo o país dependem exclusivamente da vontade de Joana Marques Vidal é não entender o sistema. É verdade que a opinião pública adora personalizar a Justiça, mas as investigações complexas não dependem de um procurador ou dois. O Ministério Público é uma estrutura que, se tiver luz verde para trabalhar, funciona – às vezes melhor, às vezes pior, como qualquer instituição criada por homens e mulheres.
Do ponto de vista da opinião pública, o melhor que podia acontecer a Joana Marques Vidal era efectivamente a não recondução. É o chamado “sair por cima”, numa espécie de estado de graça com que nenhum dos seus antecessores foi bafejado. Lucília Gago poderá também ter, daqui a seis anos, a oportunidade de sair por cima. Basta não estragar o que tem sido feito.
P.S.: O que aconteceu a Rui Rio para, horas antes da decisão de substituir a procuradora-geral da República, ter convocado uma conferência de imprensa para comunicar ao país que até defendia a recondução de Joana Marques Vidal – coisa de que toda a gente legitimamente duvidou, tendo em conta as posições do presidente do PSD sobre o Ministério Público –, mas que, em simultâneo, também defendia a não recondução? Mistérios da política e de uma liderança da oposição com imensas dificuldades em distanciar-se do Governo em funções.