Os deslocados que viram desalojados – a política do Ensino Superior
Fica difícil os estudantes e as suas famílias reconhecerem que estudar vale a pena, quando se trata de uma escolha entre a sua sobrevivência ou a permanência no Ensino Superior.
Com o início de mais um ano letivo para os estudantes do Ensino Superior, é hora de dar as boas-vindas a cerca de 44.000 estudantes acabados de ingressar nas suas Instituições, resultado da primeira fase de colocações do Concurso Nacional de Acesso. Para lá do evidente decréscimo de candidatos e colocados e da milagrosa medida promotora de coesão territorial que contemplava a redução de 5% de vagas em Instituições de Ensino Superior (IES) dos grandes centros metropolitanos (Porto e Lisboa), e que faria a sua distribuição por IES do interior geográfico de Portugal (o que na realidade não aconteceu!), os estudantes enfrentam um problema que os afeta a todos e a cada um: não têm quartos para viver (quanto mais casas) ou, quando têm, são obrigados a pagar o preço por metro quadrado como se de um destino paradisíaco se tratasse, ou de uma grande capital europeia, quando o salário médio dos seus familiares está no fundo da média europeia.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Com o início de mais um ano letivo para os estudantes do Ensino Superior, é hora de dar as boas-vindas a cerca de 44.000 estudantes acabados de ingressar nas suas Instituições, resultado da primeira fase de colocações do Concurso Nacional de Acesso. Para lá do evidente decréscimo de candidatos e colocados e da milagrosa medida promotora de coesão territorial que contemplava a redução de 5% de vagas em Instituições de Ensino Superior (IES) dos grandes centros metropolitanos (Porto e Lisboa), e que faria a sua distribuição por IES do interior geográfico de Portugal (o que na realidade não aconteceu!), os estudantes enfrentam um problema que os afeta a todos e a cada um: não têm quartos para viver (quanto mais casas) ou, quando têm, são obrigados a pagar o preço por metro quadrado como se de um destino paradisíaco se tratasse, ou de uma grande capital europeia, quando o salário médio dos seus familiares está no fundo da média europeia.
O problema do alojamento estudantil no Porto, ao contrário do que se possa pensar, já está instalado na cidade de há uns anos a esta parte, tal como aliás temos vindo a alertar. O fenómeno acentuou-se em 2017, e agora em 2018 vemos o preço dos quartos a dobrar o valor, quando usamos o comparativo de 2015. Os preços podem oscilar ligeiramente, mas há mesmo quem pague 500 euros/mês por um quarto, e muitas vezes em condições absolutamente deficitárias. Aliando este valor, que hoje se traduz na maior fatia dos encargos de frequência no Ensino Superior, somando aos restantes encargos, podemos atingir valores em alguns casos a ultrapassar os 1000 euros mensais!
Este é hoje um dos principiais inibidores do elevador social a que um curso superior corresponde: o acesso à habitação!
Estando identificados os problemas já há bastante tempo, esperava-se uma resposta em tempo útil… Infelizmente, o presente Governo, no que ao Ensino Superior diz respeito, já nos habituou à máxima “palavra dada não é palavra honrada”. Veja-se, por exemplo, o contrato-programa assinado com as IES em 2016, onde está escrito que qualquer alteração à lei que provoque um aumento da despesa das instituições seria compensada com a devida dotação orçamental proveniente do Orçamento do Estado...
A oferta de camas é diminuta nas residências dos Serviços de Ação Social – no caso concreto do Porto existem apenas 1300 camas, sendo que apenas 1200 estão operacionais para 23.000 estudantes deslocados na Academia; um plano para o alojamento académico que até agora a única coisa que alojou foram andares de propostas, notícias e intenções mas que só irá alojar estudantes daqui a sensivelmente dois anos, e, para piorar a situação, em nada favorecem as Instituições de Ensino Superior dos grandes centros urbanos, porque são “obrigadas” a entregar o imóvel a custo zero a um Fundo, para reabilitação, sendo que passado dez anos tem hipótese de o reaver, comprando de volta as unidades de participação valorizadas ao preço atribuído à data. Até que soluções e medidas sejam implementadas para que os estudantes possam estudar, estamos reféns de um mercado que não tem qualquer preocupação social com os estudantes, sem qualquer mediador que defenda quem quer apenas alargar os horizontes do seu futuro com uma melhor educação.
Também as autarquias se têm colocado hipocritamente à margem deste debate, preferindo aplicar taxas e taxinhas aos munícipes, turistas e promotores imobiliários, esquecendo as Academias, em particular, a Academia do Porto, os seus estudantes e as suas famílias, uma vez que o sr. presidente da câmara, Dr. Rui Moreira, rapidamente se esquece do seu compromisso ético com os estudantes que vivem a cidade e que a caracterizam, que dela fazem parte e que lhe dão vida, para que outros a possam visitar e conhecer!
São várias as soluções já apresentadas pelos estudantes. Uma solução a curto prazo que passa pela atualização do complemento de alojamento atribuído a estudantes bolseiros que não tenham uma vaga nas residências dos Serviços de Ação Social. Hoje, o valor é de cerca de 130 euros mensais, manifestamente baixo face às rendas que se estão a praticar. Já é difícil encontrar-se quartos com condições de salubridade e cujos proprietários estejam disponíveis para emitir recibo de pagamento e celebrar contrato de arrendamento, quanto mais encontrar um quarto que estes estudantes carenciados possam pagar com 130 euros... Urge fazer a atualização deste valor!
A tempo do próximo ano letivo é fundamental cumprir a Lei do Orçamento do Estado para 2018, nomeadamente o seu artigo 181.º, onde refere que deverá ser criada uma linha de financiamento para as IES construírem/reabilitarem edificado com intuito de aumentar o número de camas disponíveis, ou ainda perceber que dotação será alocada à Lei n.º 36/2018, a qual prevê a requalificação e construção de residências de estudantes do Ensino Superior público, mas que até ao momento não tem qualquer debate de orçamento associado. Lamentavelmente, a tutela, tal como os municípios, até hoje, pouco ou nada têm feito para inverter a situação, e as Instituições de Ensino Superior continuam estranguladas financeiramente para poderem socorrer os estudantes e suas famílias.
Mas para além de todas estas propostas, a cidade do Porto poderia ser palco de um projeto inovador, onde se poderia erguer uma "cooperativa de habitação académica" – uma experiência que, mais do que habitação, poderá ser uma verdadeira experiência de inovação social, com um "bairro académico" onde os cooperantes (CMP, UPorto, PPorto e FAP) criariam uma cooperativa igualmente participada para a construção e gestão de um "Bairro Académico".
Desta feita, fica difícil os estudantes e as suas famílias reconhecerem indubitavelmente que estudar valha a pena, quando se trata de uma escolha entre a sobrevivência da família ou a permanência no Ensino Superior.
A conclusão que conseguimos retirar de tudo isto é muito simples: é que o Governo de António Costa e o ministro Manuel Heitor têm uma política para o alojamento no âmbito do Ensino Superior – a de transformar os estudantes deslocados em estudantes desalojados…
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico