Quercus volta a tentar proibir largadas de balões: “O que sobe também desce”
A Quercus voltou a pedir ao Ministério do Ambiente que proibisse a largadas em massa de balões, em especial dos que têm lâmpadas LED e pilhas associadas. Na Noruega, em alguns estados norte-americanos e regiões da Austrália e da Inglaterra, o lançamento já está banido.
São uma “moda” em casamentos onde se procura uma alternativa ao fogo-de-artifício. As largadas de balões são “baratas”, “fotogénicas” e, para quem fica a ver do chão, "produzem um efeito fantástico”. “O problema é o que acontece depois”, avisa Cármen Lima, técnica responsável pelos resíduos da Quercus. “Porque o que sobe também desce.”
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São uma “moda” em casamentos onde se procura uma alternativa ao fogo-de-artifício. As largadas de balões são “baratas”, “fotogénicas” e, para quem fica a ver do chão, "produzem um efeito fantástico”. “O problema é o que acontece depois”, avisa Cármen Lima, técnica responsável pelos resíduos da Quercus. “Porque o que sobe também desce.”
O processo é normalmente este: enche-se um balão com hélio — acrescenta-se ainda um LED com uma pilha associada, caso a largada seja feita à noite —, amarra-se uma fita (normalmente de plástico) e, entre o bolo e o champanhe, solta-se a amarra. Durante os cerca de 12 segundos seguintes são dezenas, normalmente entre 50 a 150, contabilizam alguns fornecedores, ao P3, de luzes coloridas a iluminar o céu. Até que os “balões de plástico”, as “pilhas compostas por metais pesados” e os LED descem até caírem em “matos” ou “ambientes marinhos”. A vários quilómetros de onde foram lançados, explica a técnica da associação nacional de conservação da natureza. “Com o sol perdem a cor, ficam esbranquiçados e são comidos por peixes, tartarugas e aves” que os confundem com alimento, descreve Cármen Lima.
O aviso não é novo, nem tão-pouco o pedido de proibição destes actos que a associação classifica como sendo "extremamente poluentes". Esta terça-feira, 11 de Setembro, a Quercus voltou a reiterar ao Ministério do Ambiente, com conhecimento a todos os grupos parlamentares e aos partidos com assento na Assembleia da República, o pedido que já havia expresso num comunicado emitido em Dezembro de 2016 (e que tem o apoio de várias associações ambientais).
Na altura, a direcção nacional da associação pedia ao ministro do Ambiente que proibisse o lançamento de balões, principalmente daqueles que têm uma lâmpada LED e uma pilha associada. “Em 2017, o Ministério do Ambiente deverá legislar e proibir a largada de balões, atendendo aos impactos ambientais, muitos deles irreversíveis, associados a este tipo de eventos”, lia-se, no documento.
Até agora, Setembro de 2018, ainda não obteve resposta do Governo, mas continua a querer as largadas proibidas “ainda nesta legislatura”, mesmo que sejam abertas “algumas excepções”, como no caso do São João, no Porto. “Associado a esta festividade está uma forte questão cultural”, explica Cármen Lima, por isso “teríamos de estudar o impacto que tem a largada”. “Caso se verifique que tem impacto no rio, então também deveria ser repensada”, remata.
Também Paula Sobral, da Associação Portuguesa de Lixo Marinho, diz que o “assunto [da proibição de largada de balões] tem de ser discutido por quem tem poder de legislação” e que “é impossível” ter dados concretos sobre o impacto específico desta prática.
Esta última opinião é reiterada pela Agência Portuguesa do Ambiente, instituto público sob a tutela do Ministério do Ambiente, que acrescenta que, neste tipo de resíduos, é “aplicável a legislação geral em matéria de resíduos”, bem como a “legislação específica de resíduos de equipamentos eléctricos e electrónicos”.
“Tenho noção que, no momento [da largada], as pessoas não imaginam o problema que estão a causar para o ambiente”, acredita a responsável da Quercus. Isto porque, diz, “mais do que não ter desaparecido”, a “moda tem vindo a aumentar”, análise que a associação consegue fazer também através da observação directa “de núcleos regionais com localizações próximas de quintas de casamentos”.
A proibição dos foguetes e do fogo-de-artíficio durante os dias mais quentes do Verão — uma medida de prevenção dos fogos florestais — afiguraram o lançamento de balões em massa como uma alternativa a considerar em festas populares, defende a Quercus.
Balões rotulados como biodegradáveis
“Quando me ligam a perguntar detalhes do nosso serviço, a primeira pergunta é quase sempre a mesma: mas qual é o preço?” Se Rui Coelho, um dos responsáveis por uma empresa de organização de eventos, a Limite do Sonho, responder que o valor varia conforme a qualidade do material, a pergunta que se segue é simplesmente “Qual é o mais barato?”. Das chamadas que recebe a encomendar este tipo de serviço, diz, apenas um “número residual” (cerca de 5%, estima) demonstram “alguma preocupação com a possibilidade de poluição”. “Querem o seu momento e acham que tudo vale no casamento”, diz. Nas largadas que organizam, a empresa "apenas vende balões de látex natural biodegradável", assegura.
Um balão, já equipado com LED e cheio de hélio, pode custar menos de um euro, dependendo da quantidade pedida. A Quercus afiança compreender as causas que estão normalmente na origem destas iniciativas, mas lembra que "qualquer que seja a causa não poderá prejudicar outra". "O combate à poluição marinha tem sido um objectivo europeu e há inclusive avanços na tentativa de reduzir a utilização de matérias em plástico com utilização única, por forma a contribuir para a minimização da poluição marinha", relembram, acrescentando que é "frequente encontrarem-se vestígios de balões" nas limpezas de praias e matas.
Os balões estão incluídos nos dez produtos de plástico descartável afectados pelas novas regras da União Europeia, anunciadas em Maio como parte da estratégia para diminuir o lixo marinho. Os produtores vão ter de "ajudar a cobrir os custos da gestão de resíduos e de limpeza", bem como contribuir "para medidas de consciencialização" que reduzam o seu uso pela população. Em conjunto com pensos higiénicos e toalhitas de limpeza, os balões vão passar a ter no rótulo "instruções claras e padronizadas que indiquem como é o que o produto deve ser deitado fora" e comuniquem o "impacto ambiental negativo" do seu uso e "a presença de plástico" na sua composição.
A Quercus “desaconselha” o lançamento de “qualquer tipo” de balão. Isto porque, mesmo os que são vendidos como biodegradáveis, constituídos por látex, demoram “no mínimo seis meses a decomporem-se”. É tempo suficiente para espécies de animais marinhos maiores — e, depois de os balões se fragmentarem em pedaços menores, espécies mais pequenas — os ingerirem. “Isto se forem mesmo biodegradáveis, porque muitas vezes são vendidos como tal, sem cumprirem as normas de regulamentação”, denuncia, referindo alguma confusão com a denominação “oxo-degradável”, que aumenta o tempo mínimo de degradação “para os cinco anos”.
Quanto às pilhas do LED, basta uma “para contaminar uma área equivalente à área de um campo de futebol, durante 50 anos”, lê-se no comunicado da associação referido anteriormente. “O LED tem tratamento, mas se for encaminhado para uma unidade de reciclagem” — o que “quase nunca” ocorre nestes casos, em que os balões, depois de largados, não são recolhidos.
“Isto traz consequências quase imediatas e outros efeitos que vamos sentir mais tarde, ao ingerirmos os nossos alimentos”, avisa. Cármen Lima diz que “há falta de sensibilização” e compara o tema dos balões ao do plástico. “Havia pessoas contra o pagamento de sacos de plástico nos supermercados e quando explicávamos que 30% dos sacos ia parar à natureza, muitas pessoas passavam a dar-nos a entender que também se preocupavam”, diz.
Na Noruega, os balões de hélio já não são permitidos. O mesmo em alguns estados norte-americanos e regiões da Austrália e da Inglaterra. "Encontram-se, frequentemente, crias de aves com falta de peso e famintas, com os estômagos cheios de lixo, incluindo balões e os seus adereços", disse, um dos impulsionadores da campanha norueguesa. No país nórdico, estão proibidos desde 17 de Maio — Dia da Constituição da Noruega. Afinal, há festa sem balões.
Notícia actualizada a 14 de Setembro para clarificar que a empresa citada apenas faz largadas com "balões de látex natural biodegradável"