"Negociar o quê, não há planeta B!" O grito de mil pessoas na Marcha do Clima
Portugueses e estrangeiros, homens, mulheres e famílias inteiras participaram na Marcha pelo Clima em Lisboa. Esta é uma iniciativa global que se realizou em 800 cidades de 80 países — como Paris, Lima ou Nova Iorque.
Se a conferência sobre alterações climáticas na Universidade do Porto, com oradores que negam a influência humana no aumento do CO2 na atmosfera, conseguiu reunir 100 pessoas no dia de arranque, a Marcha Mundial do Clima, que se realizou neste sábado, conseguiu mais de um milhar de pessoas só em Lisboa. Para além da capital, marchou-se em simultâneo no Porto, em Faro e em 800 cidades de 80 países — como Paris, Lima ou Nova Iorque.
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Se a conferência sobre alterações climáticas na Universidade do Porto, com oradores que negam a influência humana no aumento do CO2 na atmosfera, conseguiu reunir 100 pessoas no dia de arranque, a Marcha Mundial do Clima, que se realizou neste sábado, conseguiu mais de um milhar de pessoas só em Lisboa. Para além da capital, marchou-se em simultâneo no Porto, em Faro e em 800 cidades de 80 países — como Paris, Lima ou Nova Iorque.
Em Portugal, o pedido ouviu-se em uníssono: “Deixem o petróleo debaixo do solo”, exigiram os manifestantes a plenos pulmões. As prospecções de furos petrolíferos em Aljezur e em Aljubarrota marcaram a agenda do dia e puseram a tónica na forte dependência dos combustíveis fósseis da economia portuguesa.
Maria João Alves, parte da direcção da associação SOS Salvem o Surf, uma das 40 associações presentes nesta marcha, afirmou, em conversa com o PÚBLICO, que investir nas energias fósseis, tal como se prevê com a aposta nos furos ao largo da costa portuguesa, “não faz qualquer sentido” e é um “retrocesso”. “Não há nenhuma razão que justifique esta opção, que é claramente política e está sujeita aos interesses das grandes multinacionais”, conta. “O que nos interessa enquanto país é ser pioneiro do ponto de vista climático – ser um país que se auto-sustenta e auto-suporta em termos energéticos” através de energias limpas, conclui.
Falando ao PÚBLICO antes do início da marcha, Maria João Alves confessou ter dois grandes objectivos para esta intervenção. Um deles é “ver a sociedade portuguesa a sair da apatia diária e colectiva em que se mantém”. O outro é “dar mais um contributo para os inputs [contributos] da 350.org”, uma plataforma que fará chegar pedidos e exigências à Global Climate Action Summit, cimeira a decorrer em São Francisco, nos Estados Unidos, entre 12 e 14 de Setembro.
“Não ao furo”
Esta Marcha Mundial do Clima começou de forma tímida, com cerca de duas centenas de pessoas reunidas frente ao rio Tejo, no Cais do Sodré. Entre elas estava Terry, uma californiana reformada a viver em Cascais há cinco anos, acompanhada pelo seu grupo de amigos. Não é novata nas lides do activismo ambiental: “Há anos que lutamos contra isto e continuamos”. E foi a protecção do ambiente que pesou na decisão de não ter filhos, há já várias décadas: “Em 1976 decidi não ter filhos por causa da sobrepopulação.”
Não muito longe, também Louise, uma francesa de 27 anos, esperava o início da marcha com as amigas. Trabalha na área do ambiente e está de visita a Portugal. O envolvimento nesta marcha em Lisboa não foi planeado: “Estávamos a passar por aqui e juntámo-nos. Como não vamos poder fazer a marcha em França, vamos fazê-la aqui.”
O relógio aproximava-se das 18h quando a marcha saiu do Cais do Sodré. Por essa altura, já largas centenas de pessoas se tinham juntado ao protesto. Portugueses e estrangeiros, homens, mulheres e famílias inteiras. Erguiam-se bandeiras coloridas e cartazes onde se lia “Dá prioridade aos renováveis” ou “Não ao Furo”. Nas lapelas, luziam pins e nos cabelos, flores brancas.
Do Cais do Sodré, os ambientalistas rumaram até à rua do Ouro (que encheram parcialmente), entrada privilegiada para o destino final, nos Restauradores. “Negociar o quê, não há planeta B” e “Descarbonização sim é a solução” eram dois dos pedidos mais repetidos.
Mensagens para Trump... e Costa
Entre a massa de gente, estavam Pedro, engenheiro civil, e Gonçalo, programador, com as suas bicicletas. Marcharam por estarem “preocupados com o futuro do planeta”. “É uma situação absurda porque ainda hoje temos de pedir para não explorarem o petróleo”, continua Pedro.
E fazem o que podem para travar a dependência dos combustíveis fósseis no seu dia-a-dia, usando a bicicleta enquanto meio de transporte principal. “Quando não se tem carro em casa é fácil”, brinca Gonçalo.
Já passava das 19h quando a marcha chegou finalmente ao Rossio. Em cima da estátua de D. Pedro IV colocaram-se alguns cartazes: um deles com uma mensagem para António Costa, apontando inconsistências na descarbonização; outra endereçada a Donald Trump, um confesso negacionista das alterações climáticas, que decidiu retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris, um compromisso internacional sobre assinado em 2015 as emissões de dióxido de carbono para a atmosfera.
Em jeito de encerramento, repetiram-se os principais objectivos desta marcha — desta vez pela voz de Ana Matias, da Plataforma Algarve Livre de Petróleo: “Não vão furar, mas isto ainda não acabou. Não queremos furos nem em Aljezur, nem Aljubarrota, nem em lado nenhum”.