Relatório conclui que Governo não deve pôr fim à mudança da hora
Bruxelas pediu a opinião dos cidadãos através de um inquérito e mais de 4,6 milhões mostraram-se a favor do fim da mudança da hora. Também cerca de 85% dos portugueses escolheram essa alternativa. Relógios da Europa esperam agora proposta da Comissão Europeia.
É oficial: a maioria dos europeus que participaram numa consulta pública da Comissão Europeia (CE) quer acabar com a mudança da hora. Os resultados preliminares desse inquérito online foram revelados esta sexta-feira e mostram que 84% dos 4,6 milhões de inquiridos dos 28 Estados-membros da União Europeia (UE) votaram a favor do fim da mudança dos relógios duas vezes ao ano. Agora a CE irá fazer uma proposta ao Parlamento e Conselho Europeu com vista a essa alteração. Já em Portugal, o director do Observatório Astronómico de Lisboa, Rui Agostinho, entregou esta semana ao Governo português um estudo que conclui que Portugal não deve pôr fim à mudança da hora.
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É oficial: a maioria dos europeus que participaram numa consulta pública da Comissão Europeia (CE) quer acabar com a mudança da hora. Os resultados preliminares desse inquérito online foram revelados esta sexta-feira e mostram que 84% dos 4,6 milhões de inquiridos dos 28 Estados-membros da União Europeia (UE) votaram a favor do fim da mudança dos relógios duas vezes ao ano. Agora a CE irá fazer uma proposta ao Parlamento e Conselho Europeu com vista a essa alteração. Já em Portugal, o director do Observatório Astronómico de Lisboa, Rui Agostinho, entregou esta semana ao Governo português um estudo que conclui que Portugal não deve pôr fim à mudança da hora.
A consulta pública sobre a mudança da hora – entre 4 de Julho e 16 de Agosto, em forma de inquérito – teve o objectivo de recolher opiniões dos europeus sobre a sua experiência com a mudança da hora ou a sua preferência consoante as seguintes alternativas: manter a mudança horária ou acabar com ela. E porquê fazê-lo? Devido a uma série de pedidos de cidadãos (nomeadamente sobre os efeitos negativos da mudança da hora na saúde), do Parlamento Europeu e de Estados-membros. Recentemente, por exemplo, a Finlândia pediu o fim da mudança semestral da hora e a Lituânia fez um apelo à revisão do sistema actual e para que se considerassem as diferenças regionais e geográficas.
Por tudo isso, em Fevereiro deste ano o Parlamento Europeu adoptou uma resolução que convidava a CE a fazer uma avaliação “exaustiva” da directiva 2000/84/EC, e, caso fosse necessário, a apresentar uma proposta de revisão. Basicamente, com essa directiva – que entrou em vigor em 2001 – os Estados-membros ficaram obrigados a mudar a hora duas vezes por ano: uma no último domingo de Março e a outra no último domingo de Outubro. Além disso, na resolução considerou-se que vários estudos científicos sobre os efeitos da mudança da hora “não conseguiram obter resultados conclusivos [em geral] mas, em vez disso, indicaram a existência de efeitos negativos na saúde humana”. Indicou-se ainda que é “crucial manter um regime de hora uniforme da UE, mesmo após o fim da mudança de hora bianual”.
0,33% dos portugueses votaram
Há duas semanas, a CE anunciou que o inquérito teve mais de 4,6 milhões de respostas, uma participação considerada recorde para uma consulta pública a nível da União Europeia. Anteriormente, segundo a agência Lusa, as consultas públicas mais participadas foram sobre as directivas das “aves” e dos “habitats” (com 552 mil respostas), seguida de uma consulta sobre a modernização e simplificação da Política Agrícola Comum (322 mil). Mesmo assim, é de realçar que a população em toda a União Europeia é de cerca de 500 milhões de pessoas.
Além dos 84% que votaram a favor do fim da mudança da hora duas vezes por ano, 76% dos participantes consideram que essa experiência é “negativa” ou “muito negativa”. As principais razões apontadas foram o impacto negativo na saúde, o aumento de acidentes de viação ou a falta de poupanças de energia.
Em Portugal, 0,33% da população participou no inquérito e, desses, 85% respondeu que queria acabar com a mudança horária. A taxa de participação em percentagem da população nacional variou entre os 3,79% na Alemanha e os 0,02% no Reino Unido. Os únicos países onde os participantes votaram maioritariamente a favor de manter a mudança foram Chipre (53%) e a Grécia (56%).
Outras das opções era se se manteria o horário de Verão ou o de Inverno. E apenas a Finlândia, a Holanda, a Dinamarca e a República Checa foram favoráveis a manter o horário de Inverno de forma permanente, segundo o jornal espanhol El País. Os resultados finais deste inquérito serão divulgados nas próximas semanas.
“Milhões de europeus participaram nesta consulta pública para fazer ouvir a sua voz. A mensagem é muito clara: 84% dos participantes querem que se deixe de mudar a hora”, diz em comunicado Violeta Bulc, comissária europeia dos Transportes. “Vamos agora agir em conformidade com esta vontade.” Como esta é uma consulta pública – um dos instrumentos que a CE usa para apoiar a sua avaliação em diferentes políticas, usando também estudos científicos, por exemplo –, a Comissão irá agora fazer uma proposta legislativa ao Parlamento e Conselho Europeu com vista a alterar as actuais regras em relação à mudança da hora.
Qual o valor da consulta?
A intenção de se fazer proposta foi logo anunciada na manhã desta sexta-feira (antes dos resultados do inquérito terem sido divulgados) pelo presidente da CE, Jean-Claude Juncker. “As pessoas querem que se faça, assim nós faremos”, disse à televisão alemã ZDF, citado pelo El País. Jean-Claude Juncker ainda assinalou que irá propor o horário de Verão. Contudo, de acordo com o mesmo jornal, a sua equipa realçou que, seja qual for a proposta, a decisão final será de cada país.
Ainda não se conhece a proposta da CE, mas Paulo Almeida Sande, professor de estudos políticos na Universidade Católica Portuguesa, destaca: “O processo a seguir é um processo legislativo normal, que implica que o Parlamento e o Conselho adoptem uma decisão em processo de co-decisão.” Este poderá ser um processo que deverá demorar alguns meses para ser aprovado ou pode ser chumbado. E depois? “A partir do momento em que houver legislação europeia [caso seja aprovada e se for a favor do fim da mudança da hora], essa legislação será obrigatória, tal como é obrigatória agora em função da norma [directiva 2000/84/EC] que existe”, explica. Ou seja, ao aprovar-se a proposta (ainda desconhecida) da CE, todos os países europeus serão obrigados a não mudar a hora durante o ano, mas poderão ser livres de fixar o fuso horário que considerem oportuno.
Outra das questões que se colocam é: que valor tem esta consulta pública para servir de base para uma proposta legislativa? “É um procedimento quase normal recorrer a este tipo de mecanismos, o que permite sustentar uma decisão não meramente em decisores políticos, mas na opinião das pessoas. É uma forma de legitimar o processo em matérias que são importantes para as pessoas”, responde Paulo Almeida Sande, acrescentando que este inquérito teve uma participação “significativa”.
Margarida Marques, vice-presidente da Comissão de Assuntos Europeus do Parlamento português e deputada do Partido Socialista, também destaca: “Teve uma participação elevada relativamente ao habitual.” Além disso, refere que agora os Estados-membros e os deputados ainda vão pronunciar-se.
Espanha quer abolir mudança da hora
O Partido Comunista Português já disse o que pensa sobre esta proposta e acusou a CE de “cinismo” por tentar impor o fim da mudança da hora aos seus membros através de uma “suposta consulta pública”.
Também já houve reacções de governos a esta futura proposta. O Governo espanhol revelou estar de acordo com o fim da mudança da hora na União Europeia, de acordo com o El País. Durante a tarde desta sexta-feira, o Presidente espanhol, Pedro Sánchez, anunciou que este assunto vai ser estudado com muita cautela e criará um comité de especialistas para avaliar as vantagens e os inconvenientes de adoptar em Espanha a hora de Londres e de Portugal, mas não da Alemanha.
Em Portugal, o astrónomo Rui Agostinho elaborou um relatório sobre o impacto da hora de Verão a pedido do Governo português. No relatório de 44 páginas entregue no início desta semana – e baseado em diferentes artigos científicos –, concluiu-se que se deve manter a situação actual. “Termos um horário de Inverno e de Verão é benéfico para a maioria das pessoas”, diz o astrónomo. Porquê? Aproveitam-se mais as horas de sol (até em actividades de lazer e culturais ao ar livre), por exemplo. Já as perturbações de sono com a actual mudança da hora não serão significativas, segundo este relatório.
Quanto aos benefícios da poupança energética com o do fim da mudança da hora, também não seria significativa. “O actual regime da hora legal em Portugal com hora de Verão é o melhor quando comparado com as possíveis alternativas”, lê-se no resumo do relatório. Contudo, salienta-se, por exemplo, que a União Europeia e o Estado português deveriam apoiar e aprovar a melhoria do regime actual da hora de Verão, alterando para o último domingo de Setembro em vez de Outubro. Resta agora saber qual a proposta da CE e o que irá fazer Portugal.