SEF continua a deter crianças e grávidas requerentes de asilo no aeroporto

Uma criança e duas grávidas estavam nesta sexta-feira detidas no aeroporto de Lisboa. SEF diz que cumpre despacho do MAI que determinou que os menores podem lá ficar até sete dias, mas convenção internacional refere que “devem ser imediatamente libertados”.

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Os requerentes de asilo ficam numa ala do CIT do aeroporto, crianças e adultos Ricardo Mussa

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) continua a deter crianças requerentes de asilo no Centro de Instalação Temporária (CIT) do Aeroporto de Lisboa, contrariando a Convenção dos Direitos da Criança, ratificada por Portugal, que define que nenhum menor deve ser detido por causa do estatuto legal dos pais.

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O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) continua a deter crianças requerentes de asilo no Centro de Instalação Temporária (CIT) do Aeroporto de Lisboa, contrariando a Convenção dos Direitos da Criança, ratificada por Portugal, que define que nenhum menor deve ser detido por causa do estatuto legal dos pais.

Esta sexta-feira estava no CIT uma criança acompanhada da mãe, confirmou o SEF ao PÚBLICO, sem esclarecer a sua idade e desde quando lá está. Já outra criança que chegou ao CIT na quinta-feira tinha sido encaminhada com a mãe para o Centro de Acolhimento para Refugiados (CAR).

Esta não terá sido a única criança que ficou detida no centro desde que o PÚBLICO noticiou em Julho que uma menina de três anos estava há um mês e meio detida naquele centro onde adultos, sobretudo homens, partilhavam o pequeno espaço de lazer e a criança dormia com a mãe junto a outras mulheres desconhecidas. O caso levou partidos como o PSD e BE a pedir explicações ao Governo, que entretanto pediu um inquérito à Inspecção-Geral da Administração Interna por existirem dúvidas. A Unicef também veio exigir o fim da detenção de menores no CIT. A menina e a família foram depois transferidas para o CAR.

Além da criança há duas cidadãs grávidas requerentes de asilo no CIT, confirma o SEF – a lei determina que as pessoas especialmente vulneráveis como as grávidas e crianças devem ser excluídas dos procedimentos da fronteira e ter o seu processo de pedido de asilo acelerado, refere o relatório The Asylum Information Database (AIDA, coordenado pelo European Council on Refugees and Exiles). 

As convenções internacionais referem que as crianças nos postos de fronteira “devem ser imediatamente libertadas e encaminhadas para soluções de acolhimento idóneas”: é, de resto, isso que acontece quando o pedido de protecção internacional é feito noutros serviços que não os postos de fronteira dos aeroportos, por isso instituições como o Conselho Português para os Refugiados (CPR) consideram não existir motivo para ser diferente no aeroporto.

Segundo o SEF “o pedido de asilo em análise” está “dentro do prazo estipulado para o efeito”. Aquela entidade policial “rejeita a formulação de que o SEF continua a deter crianças contra as convenções internacionais que Portugal assinou”. E diz que está a seguir as orientações do ministro da Administração Interna, que em despacho de Julho, posterior à notícia do PÚBLICO, determinou que a permanência máxima no CIT para menores de 16 anos, quando acompanhados, seja de seja sete dias - como acontece com os não acompanhados. O ministério não comenta. 

"Procedimentos rigorosos"

O SEF diz que "adopta os mais rigorosos procedimentos para prevenir situações de tráfico de seres humanos, designadamente de menores". Recusa a ideia de que as crianças e grávidas estão detidas, diz que estão "retidas". Mónica Farinha, jurista do CPR explicou na altura ao PÚBLICO que estão, sim, detidas, pois "não estão apenas sujeitas à impossibilidade de abandonar aquelas instalações”, “estão também sujeitas a vigilância constante, não lhes é permitido acesso aos seus telefones, o acesso a bagagem requer pedido prévio à equipa do CIT”.

Até 2016, as crianças requerentes de asilo em Portugal “ficavam nas fronteiras por um curto espaço de tempo para clarificar questões ligadas à identificação ou à família”, refere-se no AIDA. A prática de deter crianças levou a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) a alertar a provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral. 

Os CIT, ou espaços equiparados, albergam as pessoas a quem foi recusada a entrada em território nacional, que apresentaram pedido de asilo nos aeroportos ou que se encontrem a aguardar afastamento de território nacional.

Detidas 17 crianças em 2017

Em 2017, cerca de 17 crianças não acompanhadas requerentes de asilo foram detidas no CIT de Lisboa por um período médio de 14 dias – o que equivale a uma variação entre quatro e 50 dias, segundo o CPR. Além disso, 40 famílias ficaram no CIT entre 3 a 60 dias, numa média de 28 dias. O SEF esclareceu mais tarde, num comunicado em reacção à notícia, que estas crianças eram maiores de 16 anos sem documentos — para a lei de asilo um menor é alguém com menos de 18 anos. 

Até 30 de Junho de 2018 houve três crianças que ficaram ali detidas entre dez a 18 dias – dos 17 pedidos de protecção internacional de menores desacompanhados deste ano, seis em postos de fronteira, só três é que conseguiram entrar em território nacional um ou dois dias depois (dados do CPR).

Também o Tribunal de Pequena Instância Criminal, segundo o CPR, tem dado indicação ao SEF para libertar as famílias monoparentais com crianças – um pedido que aquele órgão não tem seguido, refere.