Um enorme bocejo chamado Tutti Frutti
As medidas propostas recentemente pelas juventudes partidárias da direita são apenas fogo-de-vista.
1. A operação Tutti Frutti anda por aí. A tal que envolve coisas estranhas nos aparelhos do PSD e do PS. E toca algumas personagens mediáticas de ambos os partidos. Personagens da segunda linha dos partidos, é certo, mas não por isso politicamente irrelevantes. Deu algumas capas de jornal, uns tantos artigos de opinião, uns comentários nas redes sociais. Mas, genericamente, a operação Tutti Frutti mereceu um enorme bocejo. Não surpreendeu ninguém. Ninguém rompeu as vestes. Não houve demissões nenhumas. E, por exemplo, o próprio PSD já veio elogiar publicamente vários dos visados na dita investigação. Em resumo, a operação Tutti Frutti supostamente escrutina o mundo dos aparelhos partidários, mas o tema simplesmente já não comove a sociedade portuguesa. E os partidos já nem se dão ao trabalho de mostrar lágrimas de crocodilo. Por uma razão simples – a sociedade cansou-se do assunto, os partidos querem lá saber.
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1. A operação Tutti Frutti anda por aí. A tal que envolve coisas estranhas nos aparelhos do PSD e do PS. E toca algumas personagens mediáticas de ambos os partidos. Personagens da segunda linha dos partidos, é certo, mas não por isso politicamente irrelevantes. Deu algumas capas de jornal, uns tantos artigos de opinião, uns comentários nas redes sociais. Mas, genericamente, a operação Tutti Frutti mereceu um enorme bocejo. Não surpreendeu ninguém. Ninguém rompeu as vestes. Não houve demissões nenhumas. E, por exemplo, o próprio PSD já veio elogiar publicamente vários dos visados na dita investigação. Em resumo, a operação Tutti Frutti supostamente escrutina o mundo dos aparelhos partidários, mas o tema simplesmente já não comove a sociedade portuguesa. E os partidos já nem se dão ao trabalho de mostrar lágrimas de crocodilo. Por uma razão simples – a sociedade cansou-se do assunto, os partidos querem lá saber.
2. Outro exemplo recente – “Acordo secreto nas PPP. Governo [Sócrates] deu 705 milhões a privados” podia ler-se há umas semanas. O impacto na opinião pública e publicada foi nulo. O mal destas notícias é que chegámos ao ponto em que já não aquecem, nem arrefecem absolutamente ninguém. Nem os fãs, nem os detratores. Por três razões. Primeiro, porque todos percebemos que nada jamais será cabalmente esclarecido. Segundo, porque aquilo que possa vir a ser parcialmente esclarecido em julgamento levará tanto tempo que cansa e esmorece até os mais excitados. Por exemplo, Armando Vara, nesta altura, ainda é alegado corrupto e já saiu de circulação há quase dez anos. Terceiro, politicamente, quem vota sempre no mesmo partido (e são muitos) quer lá saber destas ou de outras histórias (porque o seu partido é apenas vítima de mais uma cabala, a milésima). E quem não vota sempre no mesmo partido (são cada vez menos) vai pouco a pouco deixando de votar.
3. Sobre os casos mediáticos também já pouco se pode acrescentar. Quatro anos depois, segundo notícias da semana passada, Ricardo Salgado enfrenta já nove processos. Mas dedução de acusação nem ver. E nem falemos em julgamento, muito menos em condenações transitadas em julgado. Vamos imaginar que, sendo condenado de alguma coisa, tem a sua condenação transitada em julgado lá para 2025 ou 2026. Alguém vive hoje a pensar a oito anos? Quem são os portugueses que em 2025 vão dar alguma importância a decisões judiciais referentes a coisas que aconteceram 15 ou 20 anos antes? E o caso Sócrates já é uma absoluta vergonha, acabe como acabar. Deixou de ser Primeiro-Ministro há sete anos. Se é culpado do que está acusado, é absurdo que nem o julgamento ainda tenha começado e continue por aí com intervenção pública como se nada fosse. Mas, se não é culpado, trata-se da mais indecente violação do direito à sua dignidade.
4. O cerne, contudo, deixou de ser a longa demora dos casos mediáticos. A questão é que já se instalou a ideia de que não há solução. Os casos que envolvem políticos ou banqueiros levam muitos anos, enchem-se de manobras processuais ridículas, produzem sentenças muito aquém das expectativas criadas na sociedade, estão completamente dominados pelos julgamentos públicos, porque o tempo da justiça excede o tempo da política ou da sociedade moderna de forma absurda (digamos que os dois/três anos que seria o prazo aceitável desde que alguém com responsabilidades políticas é constituído arguido até ao desenlace final transformam-se em dez ou quinze anos). E já ninguém sabe como resolver o assunto, porque a complexidade do emaranhado jurídico é tal que nem por onde começar é claro.
5. Nesse contexto, as medidas propostas recentemente pelas juventudes partidárias da direita são apenas fogo-de-vista. Não discordo delas no mérito substantivo. Mas a questão é que o problema já não é a severidade do castigo, mas a probabilidade. Sanções mais duras para os corruptos soa bem. Mas neste momento, nos termos da lei vigente, praticamente não há corruptos. Há algum militante do PSD, PS, CDS, BE ou CDU condenado por corrupção com sentença transitada em julgado? Enquanto a resposta rondar o zero, mais coisa, menos coisa, falar em sanções mais duras para os corruptos é puro entretenimento! Porque arguidos há muitos, processo de inquérito abundam, mas corruptos, corruptos não há!