A luz azul dos ecrãs pode potenciar a cegueira, alertam cientistas
Os aparelhos móveis emitem uma luz que pode causar degeneração macular relacionada com a idade, uma doença que afecta essencialmente pessoas com mais de 55 anos e que pode levar à cegueira.
Hoje em dia, a tecnologia faz parte da nossa vida e certo é que uma grande parte da população vive de olhos no ecrã sem se conseguir desligar deste mundo, o que faz com que surjam várias preocupações sobre o impacto dos dispositivos digitais na saúde física e mental.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Hoje em dia, a tecnologia faz parte da nossa vida e certo é que uma grande parte da população vive de olhos no ecrã sem se conseguir desligar deste mundo, o que faz com que surjam várias preocupações sobre o impacto dos dispositivos digitais na saúde física e mental.
Uma investigação recente, publicada na revista Scientific Reports, avaliou as consequências que a luz azul dos ecrãs de smartphones, computadores portáteis ou tablets pode ter na visão. E se é daquelas pessoas que passa tempos e tempos, antes de dormir, a navegar nos mais diversos sites ou redes sociais, deve ter mais cuidado com o uso destes aparelhos, dizem os autores. Isto porque uma exposição prolongada à luz azul emitida pelos ecrãs, além de interferir com o sono, pode causar danos irreversíveis nos olhos e acelerar a cegueira.
Não era novidade para os investigadores que a exposição à luz provoca danos na retina ocular, porém, “o mecanismo subjacente [a este fenómeno] não estava claro”, diz o artigo. Por isso, esta investigação feita em laboratório (em ratinhos) tinha como objectivo analisar a degeneração das células.
Actualmente, “estamos a ser expostos à luz azul continuamente e a córnea e a lente do olho não são capazes de bloqueá-la ou reflecti-la”, pelo que ela penetra na retina acabando por afectá-la, explica em comunicado Ajith Karunarathne, professor do departamento de química e bioquímica da Universidade de Toledo (Estados Unidos) e autor do estudo.
A luz azul causa, então, danos na retina – a camada do globo ocular onde se encontram os fotorreceptores, células nervosas do olho que captam a luz e a transformam em impulsos nervosos que são depois descodificados pelo cérebro. A luz provoca um conjunto de reacções que leva ao desenvolvimento de moléculas tóxicas que, por sua vez, causam a morte dos fotorreceptores, um fenómeno associado à degeneração macular relacionada com a idade (DMRI), uma doença que afecta a visão e causa uma grande parte dos casos de cegueira no mundo.
Por outras palavras, a luz azul emitida pelos aparelhos, que tem um menor comprimento de onda e uma maior energia face às outras cores, transforma as moléculas presentes na retina do olho em moléculas “assassinas” das células fotorreceptoras através da libertação de substâncias nocivas. O que pode ser preocupante, visto que estas células do olho não regeneram. “Quando elas estão mortas, estão mortas para sempre”, esclarece Kasun Ratnayake, estudante de doutoramento na Universidade de Toledo e co-autor do estudo.
Perda progressiva da visão
A degeneração macular relacionada com a idade é uma doença de retina que provoca uma perda progressiva da visão e que pode levar à cegueira. Em Portugal, estima-se que cerca de 12% da população com mais de 55 anos sofre desta doença, enquanto nos Estados Unidos é uma das principais causas de cegueira. Embora possa não causar cegueira total (visto que afecta apenas a parte central do olho e o transplante de alguns foto-receptores é suficiente para restabelecer a visão), leva a uma perda significativa da capacidade visual que afecta actividades do quotidiano como a leitura ou o reconhecimento de rostos, escreve o diário britânico Guardian.
“Não é segredo nenhum que a luz azul prejudica a nossa visão ao danificar a retina do olho. As nossas experiências explicam como isso acontece, e esperamos que isso leve a terapias que retardem a degeneração macular, como um novo tipo de colírio” (gotas para os olhos), acrescenta Karunarathne.
Os investigadores introduziram ainda moléculas da retina noutros tipos de células do corpo, como células cancerígenas, cardíacas ou neurónios que, quando expostas à luz azul, também morreram. “A toxicidade gerada na retina pela luz azul é universal. Pode matar qualquer tipo de célula”, conclui Karunarathne.
O objectivo: proteger a visão das crianças
Alguma esperança reside no facto de uma molécula chamada alfa-tocoferol (derivado da vitamina E) – um antioxidante natural que se encontra no olho e no corpo – impedir as células de morrerem. Porém, à medida que a pessoa envelhece ou o seu sistema imunológico começa a tornar-se débil, perde a capacidade de combater o impacto da luz azul na retina, sendo nesses casos, segundo Karunarathne, “quando ocorre o verdadeiro dano”.
De forma a proteger os seus olhos, a solução passa pelo uso de óculos de sol, no exterior, capazes de filtrar tanto os raios UV como a luz azul e evitar a utilização de telemóveis ou tablets no escuro. John Payton, co-autor do estudo, urge ainda as empresas de telemóveis a adicionarem filtros de luz azul aos ecrãs dos aparelhos, hipótese que diz estar já a ser testada por algumas empresas.
No futuro, Karunarathne garante que a equipa continuará a investigar a forma como a luz proveniente de dispositivos digitais condiciona a visão com um objectivo: "Ao aprender mais sobre os mecanismos da cegueira em busca de um método para interceptar reacções tóxicas causadas pela combinação da luz azul e da retina, esperamos encontrar uma maneira de proteger a visão das crianças que crescem num mundo de alta tecnologia".
Texto editado por Nicolau Ferreira