Eu sou a mãe de Bin Laden: "Era uma criança muito boa"
Alia Ghanem e dois dos irmãos do antigo líder da Al-Qaeda falam à imprensa pela primeira vez. “[Osama] era uma criança muito boa e amava-me muito”, diz a mãe de Bin Laden, que ainda se recusa a aceitar que o filho seja o principal responsável pelos ataques de 11 de Setembro de 2001 nos EUA.
Alia Ghanem é a mãe de Osama bin Laden, o antigo líder da Al-Qaeda, e aceitou falar pela primeira vez. O diário britânico The Guardian conversou com esta mulher na sala da sua casa em Jidá, na Arábia Saudita, onde não faltam fotografias emolduradas do primogénito, morto em 2011 por militares americanos na residência dele em Abbottabad, 50 quilómetros a norte da capital do Paquistão, Islamabad, quase dez anos sobre o ataque às torres gémeas de Nova Iorque.
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Alia Ghanem é a mãe de Osama bin Laden, o antigo líder da Al-Qaeda, e aceitou falar pela primeira vez. O diário britânico The Guardian conversou com esta mulher na sala da sua casa em Jidá, na Arábia Saudita, onde não faltam fotografias emolduradas do primogénito, morto em 2011 por militares americanos na residência dele em Abbottabad, 50 quilómetros a norte da capital do Paquistão, Islamabad, quase dez anos sobre o ataque às torres gémeas de Nova Iorque.
Alia, que já tem mais de 80 anos, recebe Martin Chulov, repórter do Guardian no Médio Oriente desde 2005, na companhia de Ahmad e Hassan, os dois filhos que lhe restam, e do segundo marido, Mohammed al-Attas, que criou Osama desde que este que é um dos principais rostos da ascensão do terrorismo internacional tinha três anos. Foi um bom pai, diz ela. “[Osama] era uma criança muito boa e amava-me muito.”
Há gerações que Jidá, cidade comercial na costa do Mar Vermelho e uma das mais ricas do Médio Oriente, serve de casa ao clã dos Bin Laden. A família do pai, cuja fortuna está alicerçada num império da construção civil, continua a ser uma das mais poderosas e influentes do país.
Foi por intermédio do Governo saudita que o repórter do Guardian chegou à mãe de Osama e aos seus meios-irmãos, que se têm mantido em silêncio todos estes anos. Foi por pressão da nova liderança, encabeçada por Mohammed bin Salman, um príncipe jovem com um gosto invulgar pelo confronto e pela mudança, que mãe e irmãos aceitaram falar. Riad, escreve Martin Chulov, está apostada em demonstrar que, ao contrário do que alguns defendem há muito, aquele que é dado como o principal responsável pelo 11 de Setembro não era um agente a soldo desta potência sunita do Golfo Pérsico, mas um proscrito.
A radicalização
A radicalização de Osama bin Laden (1957-2011), um rapaz tímido e aplicado, começou logo nos primeiros tempos da faculdade, conta a mãe. Foi na Universidade Rei Abulaziz, onde estudou Economia, que conheceu Abdullah Azzam, da Irmandade Muçulmana, o palestiniano que deu um suporte teológico à jihad afegã e que viria a ser o seu conselheiro espiritual. Na leitura que faz do que aconteceu na vida do filho mais velho, tudo corria bem até que ele conheceu “umas pessoas que basicamente lhe fizeram uma lavagem ao cérebro quando tinha pouco mais de 20 anos.” Alia Ghanem chama-lhe “um culto” que procurava reunir dinheiro para a causa: “Sempre lhe disse que se mantivesse afastado deles e ele nunca me contou o que estava a fazer porque me amava muito.”
É Hassan, um dos meios-irmãos, quem durante a conversa tenta explicar como passou Osama de respeitado combatente contra a ocupação russa do Afeganistão – para onde foi no começo da década de 80 – a líder incontestado da Al-Qaeda durante quase duas décadas marcadas pelos atentados nos EUA, momentos que puseram o mundo a encarar o fenómeno do terrorismo à escala global.
“Tenho muito orgulho nele porque era o meu irmão mais velho. Ensinou-me muitas coisas”, diz, “mas não me orgulho dele como homem. Ele atingiu o estrelato no palco mundial mas foi tudo para nada”.
Pela cabeça de Alia Ghanem nunca passou a possibilidade de o filho mais velho, um rapaz muito inteligente e empenhado, se vir a tornar um jihadista. “Por que é que ele haveria de desperdiçar tudo daquela maneira?”, questiona-se, admitindo a tristeza que sentiu quando lhe começaram a dizer que Osama bin Laden se transformara num radical responsável pela morte de milhares de pessoas e era o homem mais procurado do mundo.
A família garante que o viu pela última vez em 1999, ano em que o visitou duas vezes na sua base nos arredores de Kandahar, no Afeganistão. Estavam felizes. Osama matou um animal e fizeram uma festa para a qual todos foram convidados.
Quando Alia deixa a sala, o outro meio-irmão do antigo líder da Al-Qaeda, Ahmad, admite que a mãe continua a não aceitar o que aconteceu: “Passaram 17 anos [desde o 11 de Setembro] e ela continua em negação em relação a Osama. Ela amava-o tanto que se recusa a culpá-lo. Em vez disso culpa os que estavam à volta dele. Ela só conhece o lado do bom rapaz, o lado que todos nós vimos. Ela nunca chegou a conhecer o lado do jihadista.”
Ao contrário da mãe, os meios-irmãos de Bin Laden souberam praticamente desde o início que era ele o responsável. “Fiquei chocado”, admite Ahmad. “Foi um sentimento muito estranho. Soubemos nas primeiras 48 horas [que tinha sido Osama]. Do mais novo ao mais velho, todos sentimos vergonha. Sabíamos que todos nós teríamos de enfrentar terríveis consequências [depois do que que acabava de acontecer]. Toda a nossa família que estava no estrangeiro voltou para a Arábia Saudita.”
A família foi, então, impedida de viajar para o exterior e, mesmo dentro do reino, todos os movimentos eram monitorizados. Foram tempos difíceis, admite. Só agora, passados quase 20 anos, começa a ganhar mais liberdade.
Escreve o Guardian que o que resta da família imediata de Osama bin Laden foi autorizada a regressar ao reino e que, pelo menos duas das mulheres (uma delas estava com ele no complexo em Abbottabad quando foi abatido pelas forças especiais norte-americanas) vivem com os filhos de ambos em Jidá. Alia fala com elas quase todas as semanas, diz. Podem andar pela cidade sem restrições mas não têm autorização para sair do reino.
Hamza, 29 anos, o 15.º filho de Osama (em 2001, o jihadista tinha 44 anos, Hamza 12), viveu no Irão e na Síria e é o que agora levanta preocupações — está apostado em vingar a morte do pai e seguir-lhe as pisadas, aparentemente sob protecção do novo líder da Al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri. Segundo as últimas informações conhecidas vive agora no Afeganistão
"Pensávamos que já tínhamos ultrapassado isto", diz um dos tios, Hassan. "Não quero voltar ao mesmo. Se Hamza estivesse à minha frente agora eu dizia-lhe: 'Que deus te guie. Pensa duas vezes no que estás a fazer. Não leves o mesmo caminho que o teu pai. Estás a entrar em partes terríveis da tua alma.'"
De acordo com serviços secretos de diferentes países, Hamza bin Laden quer oferecer aos jihadistas uma nova alternativa ao Estado Islâmico, escrevia em Junho de 2017 o jornal norte-americano The Washington Post. Em gravações áudio desse ano, o jovem Bin Laden apelava a ataques contra interesses judeus, americanos e europeus. Visto por muitos peritos em terrorismo como o príncipe herdeiro da Al-Qaeda, tem até um timbre de voz que, de vez em quando, faz lembrar o do pai.
“Preparem-se com diligência para infligir perdas devastadores aos que não crêem”, diz Hamza bin Laden numa mensagem gravada e transmitida pela primeira vez dois dias antes do atentado terrorista em Manchester (Reino Unido), em Maio de 2017, e em que faz um apelo preciso a ataques a cidades europeias e norte-americanas para vingar as crianças sírias mortas em ataques aéreos. “Sigam as pisadas dos mártires que vieram antes de vós.”
Notícia alterada para corrigir a idade de Alia Ghanem e a de Osama bin Laden à data do 11 de Setembro de 2001