Sem lista de material recuperado, CDS pede demissão de Rovisco Duarte
Chefe do Estado-Maior do Exército diz que nunca deu garantias de que todo o material fora recuperado, porque não sabe. Secretárias-gerais da segurança interna e das secretas garantem que não há qualquer perigo para a segurança do país.
Um dia inteiro de audições, poucas conclusões novas, uma recusa e um pedido de demissão. A terceira passagem pelo Parlamento do chefe do Estado-Maior do Exército (CEME) por causa do roubo de Tancos veio trazer, na perspectiva do PSD e do CDS, mais confusão ao assunto e mais perguntas. De tal forma que, em vez de assumirem que querem uma comissão de inquérito já, os centristas pediram a demissão do general e a presença do ministro da Defesa no Parlamento, novamente, para esclarecer por que garantiu ao país que todo o material fora recuperado, quando ainda não há certezas disso.
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Um dia inteiro de audições, poucas conclusões novas, uma recusa e um pedido de demissão. A terceira passagem pelo Parlamento do chefe do Estado-Maior do Exército (CEME) por causa do roubo de Tancos veio trazer, na perspectiva do PSD e do CDS, mais confusão ao assunto e mais perguntas. De tal forma que, em vez de assumirem que querem uma comissão de inquérito já, os centristas pediram a demissão do general e a presença do ministro da Defesa no Parlamento, novamente, para esclarecer por que garantiu ao país que todo o material fora recuperado, quando ainda não há certezas disso.
Apesar de, no final, o general Rovisco Duarte ter suspirado que não sabia o que estava ali a fazer - "com frontalidade, não sei o que estou aqui a fazer; não aconteceu nada que justificasse a minha vinda aqui" -, concordando com o socialista Ascenso Simões que não fora dito nada de novo, a verdade é que pelo menos foi directo em duas questões: recusou aos deputados a divulgação da lista do material recuperado, alegando que esta se encontra em segredo de justiça; e disse que "nunca o Exército deu garantias de que o material encontrado correspondia exactamente ao furtado". Nem o Exército nem ele próprio, fez questão de realçar.
E não o fez, justificou, porque seria uma "violação do segredo de justiça", e porque, "eventualmente, punha em causa a obtenção de provas" pela investigação. Mais: o Exército nem saberá que material tem à sua guarda, desde Outubro, no Campo Militar de Santa Margarida. E porquê? O general Rovisco Duarte explicou que o Exército “não tem legitimidade para fazer qualquer tipo de peritagem ao material, essencial para identificar rigorosamente eventuais discrepâncias” e confirmar se há material a mais ou a menos em relação à lista de itens desaparecidos. Porque a “ordem concreta” que o Exército recebeu foi de “não mexer”, garantiu, sem dizer de quem ou de quando é essa ordem. E a única data que se conhece de algo do género é a de 18 de Junho deste ano, do auto de apreensão do material elaborado pela Polícia Judiciária e que está classificado como “confidencial”. O que tinha sido feito antes era uma listagem, pela Polícia Judiciária Militar, quando recuperou o material na Chamusca.
Sobre esse episódio, Rovisco Duarte também disse, a dada altura, que o Exército disponibilizou dois sargentos para fazerem a “identificação primária” do material, perceber se estava “armadilhado” ou podia ser manuseado e levado para Santa Margarida. Mas depois retirou a expressão sobre a identificação, reiterando que o Exército não fez qualquer “peritagem”.
O CEME e as secretárias-gerais da segurança interna e das secretas foram chamadas à Comissão de Defesa para explicarem se há de facto material desaparecido que ainda não foi encontrado, como noticiou o Expresso há semanas, citando um relatório do Ministério Público que falava em explosivos, granadas, granadas de lacrimogéneo e um disparador de descompressão ainda por encontrar –, que poderia pôr em causa a segurança do país.
Rovisco Duarte vincou que o Exército "é o principal interessado na conclusão da investigação", falou sobre punições nos processos internos de investigação, dos investimentos de 4,3 milhões de euros em sistemas de segurança e vigilância, e da operação Plano Tróia 17, que esvaziou os paióis de Tancos no mês de Outubro e distribuiu mais de 1170 toneladas de material por vários espaços das Forças Armadas. Foi, aliás, nessa altura que se soube da recuperação de uma caixa de 1450 munições de 9mm que não estava na lista de material desaparecido e que lançou dúvidas sobre que outro armamento poderia estar em parte incerta. O último inventário dos paióis de Tancos fora feito em Janeiro de 2017, seis meses antes do roubo.
"Tancos foi uma tragédia para o Exército; Tancos não pode existir nunca mais", desabafou a dada altura o general, admitindo os danos colaterais que o episódio teve na credibilidade da instituição e que foram referidos pela maioria dos partidos. PSD e CDS criticaram o passa-culpas dos protagonistas: o ministro da Defesa justificou as suas garantias de que tudo fora encontrado com as declarações do CEME, que por sua vez disse ter-se baseado numa listagem da Polícia Judiciária. O PSD quer que se apurem as “responsabilidades políticas e operacionais”, o CDS diz que o CEME “não tem condições” para se manter no cargo, mas ambos, no final da audição, remeteram a questão da comissão de inquérito para mais tarde. Até porque é uma decisão política da “maior relevância” que nenhum dos deputados da comissão tem poder para decidir – leia-se, a decisão é de Rui Rio e Assunção Cristas.
O bloquista João Vasconcelos quis saber se Rovisco Duarte admite demitir-se no final do caso, mas a resposta foi um redondo “não” – porque o Exército tem feito “tudo o que está ao seu alcance” e as demissões “não resolvem tudo”.
Se a investigação judicial, e o consequente segredo de justiça, foi evocada pelo CEME, para não falar sobre o material recuperado, o mesmo tinha já acontecido de manhã, nas audições das dirigentes do Sistema de Segurança Interna (SSI) e do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP). Ambas recusaram responder a uma série de perguntas directas sobre o caso, como o relacionamento entre as polícias, a existência de listas e o seu conteúdo. Mas alinharam pela mesma bitola na avaliação: a Unidade de Coordenação Antiterrorismo (Ucat) não tem, neste momento nem desde o roubo de Tancos, qualquer “dado” nem “indícios objectivos” que ponham em causa a segurança do país. Recusaram a tese de um eventual “alarme social” ou de “perigo” e, por isso, Portugal mantém um “nível de ameaça moderado”.