Presidente veta lei do direito de preferência dos inquilinos
Marcelo pede ao Parlamento que "clarifique" dois aspectos: a ausência de critérios de avaliação para o exercício daquele direito e o facto de a redacção actual permitir que a preferência seja utilizada para "fins empresariais".
O Presidente da República vetou esta quarta-feira a lei que permitia o exercício do direito de preferência pelos arrendatários quando estão em causa imóveis sem propriedade horizontal e grandes negócios imobiliários, como o da Fidelidade. A decisão foi tomada no mesmo dia em que chegou a Belém o pacote de diplomas aprovado na maratona de votações de 18 de Julho.
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O Presidente da República vetou esta quarta-feira a lei que permitia o exercício do direito de preferência pelos arrendatários quando estão em causa imóveis sem propriedade horizontal e grandes negócios imobiliários, como o da Fidelidade. A decisão foi tomada no mesmo dia em que chegou a Belém o pacote de diplomas aprovado na maratona de votações de 18 de Julho.
Na nota publicada ao início da noite no site da Presidência, o veto e consequente devolução do diploma à Assembleia da República é justificado com "a falta de indicação de critérios de avaliação para o exercício do direito de preferência, que existia em versão anterior do diploma".
Marcelo Rebelo de Sousa refere-se à alteração que o diploma sofreu na negociação do texto final, em que o inquilino passa a poder exercer o seu direito mesmo antes de estar constituída a propriedade horizontal. Na versão anterior, quem queria exercer direito de preferência primeiro pedia a divisão do bem, constituía a propriedade horizontal e aí via-se qual era o valor do imóvel para poder exercer o direito.
O Presidente invoca ainda uma outra razão: "O facto de, tal como se encontra redigida, a preferência poder ser invocada não apenas pelos inquilinos para defenderem o seu direito à habitação, mas também por inquilinos com actividades de outra natureza, nomeadamente empresarial". Ou seja, a lei abria portas ao direito de preferência aos arrendatários de estabelecimentos comerciais ou industriais, quando a grande argumentação na aprovação da lei era o direito à habitação.
O chefe de Estado pede agora ao Parlamento que faça "a competente clarificação" destes dois aspectos jurídicos. Em nenhum momento Marcelo Rebelo de Sousa invoca as questões do ataque ao direito constitucional de propriedade, um argumento que tem sido invocado pelos proprietários e que levantou dúvidas aos serviços jurídicos da Presidência, mas que por si só conduziriam a um pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade ao Tribunal Constitucional.
Mais uma vez, Marcelo opta pelo veto político e por indicar ao Parlamento claramente quais são as suas objecções, dando uma segunda oportunidade para corrigir a lei ou mesmo confirmá-la na íntegra, por maioria qualificada. Não seria o caso desta, que foi aprovada com os votos contra do PSD e do CDS.
Da igualdade de salários aos investimentos da Santa Casa
Por outro lado, o Presidente da República decidiu dar luz verde a outros sete diplomas vindos do Parlamento. Mas ainda não à descentralização. Marcelo Rebelo de Sousa promulgou apenas o decreto que cria a Comissão Independente para a Descentralização, uma proposta original de PSD e PS, que vai fazer um estudo sobre as funções do Estado aos níveis regional, metropolitano e intermunicipal e determinar os “níveis de descentralização”, os recursos e os meios.
Com origem no Governo, o Presidente promulgou também a nova lei que estabelece medidas de promoção da igualdade remuneratória entre mulheres e homens no caso de trabalho igual ou de igual valor. No entanto, Marcelo adverte que poderão existir “problemas de aplicação” decorrentes da “complexidade administrativa” que será emitir um parecer sobre a existência de discriminação remuneratória em razão do sexo. Apesar antever dificuldades na aplicação da lei, “atendendo à essencial razão de ser do diploma, merecedora de louvável consagração política e legal”, o Presidente assinou-o.
Na sequência das polémicas sobre a entrada ou não da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa no capital do Montepio, o CDS conseguiu fazer aprovar no Parlamento um projecto de lei que consagra que a Mesa da Santa Casa só pode realizar “investimentos estratégicos e estruturantes” mediante autorização da tutela, ou seja, do Estado – e que o Presidente também promulga agora.
Também com origem numa proposta do CDS, é agora promulgado por Marcelo Rebelo de Sousa o novo regime excepcional de indexação das prestações sociais dos deficientes das Forças Armadas, em que o indexante dos apoios sociais (IAS) é majorado em 35% para servir de referencial para a fixação, cálculo e actualização do abono suplementar de invalidez e da prestação suplementar de invalidez.
A lei que reconhece a possibilidade de os cônjuges renunciarem reciprocamente à condição de herdeiro um do outro através de uma convenção pré-casamento, proposta pelo PS no Parlamento, foi igualmente promulgada pelo Presidente, e o mesmo aconteceu com o regime jurídico do ciberespaço, que transpõe para a lei nacional medidas de uma directiva europeia destinadas a garantir um elevado nível comum de segurança das redes e da informação em toda a União Europeia.
Outro diploma mais técnico, decorrente de uma proposta do PCP que chamou ao Parlamento um decreto do Governo de António Costa sobre o regime das instalações eléctricas particulares, recebeu igualmente o acordo do Presidente.