Ministério da Saúde procura anestesistas a todo o custo, para suprir carências no Algarve

A região dispõe de duas dezenas de médicos desta especialidade e necessita de outros tantos. Os poucos que existem são disputados pelos privados, com a oferta de 20 mil euros/mês.

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Virgilio Rodrigues

A falta generalizada de anestesistas em Portugal coloca particularmente em risco a assistência à saúde no Algarve. Os profissionais desta área são poucos, fazem-se pagar bem e o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não consegue concorrer com o sector privado, em termos de vencimentos. O presidente da Administração Regional de Saúde (ARS), Paulo Morgado, exemplifica: “Um médico do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHU) teve uma oferta de 20 mil euros por mês de um hospital privado - deixou o sector público”. A lista de espera das intervenções cirúrgicas chega a ser de anos. Quem tem recursos financeiros procura alternativas fora do SNS e assim vai crescendo o número de clínicas e hospitais privados na região. Nos últimos anos nasceram mais de uma dezena.

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A falta generalizada de anestesistas em Portugal coloca particularmente em risco a assistência à saúde no Algarve. Os profissionais desta área são poucos, fazem-se pagar bem e o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não consegue concorrer com o sector privado, em termos de vencimentos. O presidente da Administração Regional de Saúde (ARS), Paulo Morgado, exemplifica: “Um médico do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHU) teve uma oferta de 20 mil euros por mês de um hospital privado - deixou o sector público”. A lista de espera das intervenções cirúrgicas chega a ser de anos. Quem tem recursos financeiros procura alternativas fora do SNS e assim vai crescendo o número de clínicas e hospitais privados na região. Nos últimos anos nasceram mais de uma dezena.

Para servir a região existem 20 anestesistas, que se dividem em trabalho entre o sector público e o privado. “Fazia falta outros tantos”, defende Paulo Morgado, lembrando que está aberto um concurso com duas vagas por preencher nesta área. “Estamos a fazer um grande esforço para contratar médicos, em Portugal ou no estrangeiro, para suprir esta lacuna”, adiantou. A administração do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA) gasta cerca de seis milhões de euros por ano na compra de serviços aos hospitais privados. Porém, a taxa de ocupação das camas do serviço de cirurgia está longe de esgotar a capacidade de internamento. Segundo o relatório de actividades do Centro Hospitalar (unidades de Faro e Portimão), a ocupação em 2016 foi de 15%, no ano anterior 79%. “Falta de anestesias”, justifica o presidente da ARS, realçando que estes profissionais estão com um pé no serviço público e o outro no privado, por isso rejeitam a dedicação exclusiva. “Temos de encontrar uma saída para resolver este problema - carência de profissionais”, enfatiza, desafiando o Colégio da Especialidade a assumir uma posição sobre esta matéria.

O presidente distrital da Ordem dos Médicos (OM), Ulisses Brito, em defesa do SNS, afirma: “Temos de mudar de paradigma: no Algarve, o sector privado já tem uma oferta superior ao público, nalgumas áreas”, enfatiza. Paulo Morgado discorda e pede exemplo, que o dirigente da OM tem. “A ginecologia/obstetrícia é um dos casos”. O representante regional do Ministério da Saúde avança com outro dado, acaba por anuir, mas chama a atenção para uma outra realidade, que é o controlo da qualidade dos serviços que são prestados nalgumas clínicas e hospitais privados: “81% dos partos são feitos por cesariana (mais bem pagos pelas convenções), isto é má medicina”, sublinha. A média no SNS, adianta, é de 25 por cento. “Os senhores bastonários das ordens dos Médicos e dos Enfermeiros deviam fazer umas visitas aos hospitais privados”, desafia.

Sobre o adiamento em cima da hora de operações programadas, destaca-se o caso de uma jovem de Quarteira, de 32 anos, a quem foi detectado um cancro no útero. Segundo o diagnóstico, o problema exige uma intervenção urgente. No último mês, esteve três vezes para ser operada. Quando se preparava para entrar no bloco, recebeu ordens para regressar a casa. A justificação para o adiamento foi o facto da equipa, contratada no exterior, ter atingido o limite de horas de trabalho com casos “muito urgentes” que foram chegando durante o fim-de-semana. Ao nível das urgências dos hospitais de Faro e Portimão ainda não se notam os habituais congestionamentos de Agosto, altura em que os turistas fazem triplicar a população residente.

O Ministério da Saúde, entretanto, fez um despacho a nomear um novo director para o Serviço de Urgência do CHUA. Desde há cerca de uma semana, o cirurgião José Manuel Ferreira, anteriormente vinculado ao Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, passou a dirigir esta área problemática, em dedicação exclusiva. “As mudanças já se notam”, diz Paulo Morgado, destacando a experiência deste profissional na organização do Sistema Integrado de Emergência Médica (SIEM). “Estamos todos na expectativa”, observa Ulisses Brito, lembrando a questão de fundo, na qual se cruzam os problemas da saúde na região. “O Algarve tem uma necessidade premente da construção de um novo hospital central, com tecnologia de ponta, que possa responder aos desafios de uma medicina moderna”. O actual edifício do hospital de Faro, defende, “pode, e deve, desempenhar o papel de unidade de saúde de rectaguarda”.