Verão quente na Escandinávia e chuva em Portugal. A causa são os anticiclones
Na Suécia, as autoridades pediram ajuda internacional para combater os incêndios florestais. No Japão, depois de um período de chuvas intensas, o calor já provocou 44 mortos. Os especialistas acreditam que este padrão vai continuar durante os próximos meses.
Desde o início de Junho que as temperaturas típicas em vários países têm registado alterações significativas, com países como o Reino Unido, Noruega e Suécia a registarem temperaturas recordes. Em Portugal e Espanha, por outro lado, a chuva parece não nos deixar e, para quem tem na memória o Verão quente de 2017, o deste ano parece mais frio.
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Desde o início de Junho que as temperaturas típicas em vários países têm registado alterações significativas, com países como o Reino Unido, Noruega e Suécia a registarem temperaturas recordes. Em Portugal e Espanha, por outro lado, a chuva parece não nos deixar e, para quem tem na memória o Verão quente de 2017, o deste ano parece mais frio.
O hemisfério Norte está a ter um Verão muito quente e a causa é uma: os anticiclones. Na Suécia, os incêndios florestais levaram as autoridades a pedir ajuda internacional para combater os 60 fogos que se espalharam por todo o país nos últimos dias. Mas outros países conhecidos pelo frio e neve têm-se visto incapazes de lidar com estas ondas de calor intensas e prolongadas.
No Reino Unido (onde a temperatura normal em Junho não excede os 20 graus Celsius), o calor fez derreter o telhado do Centro de Ciências de Glasgow, avança o diário britânico The Guardian, e as temperaturas levaram os relvados a secarem – o que permitiu a descoberta de vestígios de locais históricos nas Ilhas Britânicas, de acordo com o diário The Telegraph. No Canadá, as temperaturas ultrapassaram os 30 graus em Toronto e, em Montreal, registou-se a temperatura mais alta em 147 anos em Julho, que provocou dezenas de mortos.
Na cidade de Uargla, na Argélia, os termómetros chegaram aos 51,3 graus, talvez a temperatura mais elevada alguma vez registada em África. Já no Japão, depois das chuvas intensas que já provocaram mais de 200 mortos, as temperaturas ultrapassaram os 40 graus e já causaram cerca de 44 mortos nos últimos dias, de acordo com a estação CNN, uma vez que o calor aliado a uma humidade relativa elevada acabou por ter um efeito potenciador.
Certo é que tanto as ondas de calor como o clima mais frio em Portugal estão a ser causados por anticiclones que acabam por ter efeitos contrários na Europa, o que não é normal principalmente na Escandinávia. “A atmosfera não gosta muito de desequilíbrios e tenta ajustá-los. De facto, existe é um padrão muito antagónico", começa por explicar ao PÚBLICO Mário Luís Marques, climatólogo e director-executivo da empresa IClimateAdviser. "Isto é, aquilo que agora estamos a ter em Portugal em termos de comportamentos atmosféricos é aquilo que normalmente o Reino Unido e a Escandinávia recebem durante o Verão: temperaturas entre os 20 e 25 graus, humidade, muita nebulosidade, trovoadas, precipitação um pouco fora da época", acrescenta. Na Escandinávia e no Reino Unido, um anticiclone, que não é o dos Açores, está a enviar ar quente do Mediterrâneo. "Portanto, estão a ter temperaturas no início de Junho muito acima da média, na ordem dos 28 ou 31 graus no caso de Estocolmo e Oslo, e 29 a 30 graus no Reino Unido”, explica Mário Marques.
“Essa onda de calor no Norte da Europa tem a ver com os centros de acção (anticiclones ou depressões) e com a sua localização. O Norte da Europa está com uma situação de anticiclone a que chamamos 'bloqueio' (que lá está há bastante tempo, há mais de um mês) e está a favorecer uma adjecção de ar quente para esses países”, explica Sandra Correia, meteorologista do Instituto Português do Mar e da Atmosfera. Este fenómeno está também relacionado com a corrente de jacto, um núcleo de ventos fortes que têm condicionado o clima. “A corrente de jacto neste momento está muito fraca e está-se a desviar muito para norte, para o Árctico ou para sul, inclusivamente até Marrocos”, acrescenta Mário Marques. Enquanto o anticiclone dos Açores é dinâmico ao nível da localização espacial, o anticiclone do Norte da Europa é estático - “isto é, pode aumentar ou diminuir de intensidade mas a sua presença não varia a nível espacial”, o que está a provocar a situação na Escandinávia, explica o climatólogo.
Anticiclone dos Açores
Em Portugal e Espanha, verifica-se um Verão de temperaturas relativamente baixas para os padrões dos últimos anos, com chuvas e ventos, que chegaram a provocar inundações em Barcelona, segundo o jornal espanhol La Vanguardia. Isto está relacionado com o anticiclone dos Açores, que está mais deslocado para oeste em relação ao normal para esta época do ano, o que levou ao Julho mais fresco dos últimos 30 anos. “Digamos que o padrão de tempo que nos está a afectar a nós poderá, de certo modo, também influenciar o tempo em Espanha”, refere ao Sandra Correia. A Península Ibérica está a ser afectada pela formação de uma depressão térmica que, numa acção conjunta com o anticiclone dos Açores, provoca o actual fenómeno. “Estando o anticiclone dos Açores um pouco mais longe das nossas latitudes do que é normal, ele permite que outras depressões se aproximem e que, associado a isso, tenhamos alguma precipitação e que haja uma persistência de mais dias com nebulosidade baixa e chuviscos. Portanto, o que tem sido atípico é a persistência desses dias”, explica a meteorologista.
No território português, as previsões apontam para uma “continuação deste tempo mais fresco e destas temperaturas abaixo da média para o mês de Julho” pelo menos até Agosto, diz Sandra Correia. Mário Marques concorda que, tanto para Portugal como para a Escandinávia, “o padrão climático vai manter-se, tendo em conta que este padrão está a ter um comportamento muito assertivo”. Em Portugal, a segunda metade de Agosto poderá ter temperaturas amenas e este “será um Verão sem ondas de calor”, assegura Mário Marques. Já Setembro terá um clima mais tropical com um comportamento mais instável.
As opiniões dividem-se entre os especialistas quanto ao impacto das alterações climáticas nestes fenómenos. Para dizermos que é uma consequência das alterações climáticas, precisamos de ter dados dos últimos 30 anos, pelo que o que se observa faz parte, para já, da variabilidade climática de Portugal. “O que não quer dizer que as alterações climáticas não existam”, afirma Sandra Correia, pois a temperatura média do planeta está a aumentar. Mas Mário Marques já atribui o que se passa às alterações climáticas, dizendo que a variável de distinção aqui é a duração das temperaturas elevadas registadas. Os países do Norte “sofrem muito mais porque não estão preparados para isso ao nível de condições", diz Mário Marques. "Penso que as alterações climáticas vão estar mais presentes daqui para a frente, é quase uma realidade adquirida.”
Texto editado por Teresa Firmino