Craveiral, uma aldeia de 38 casas para “criar vida rural”

Na costa alentejana, num terreno onde no passado se plantaram cravos, acaba de nascer um projecto de turismo ligado à preservação da natureza.

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No passado, houve aqui uma plantação de cravos, da qual só restou o nome, Craveiral. Mas quando Pedro Franca Pinto chegou não havia nada, era apenas um terreno à espera de uma boa ideia. “Quando o comprámos, era mato, não existia nada”, conta, enquanto passeamos pelo espaço (que, na altura da visita da Fugas, ainda estava na fase de finalização das obras).

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No passado, houve aqui uma plantação de cravos, da qual só restou o nome, Craveiral. Mas quando Pedro Franca Pinto chegou não havia nada, era apenas um terreno à espera de uma boa ideia. “Quando o comprámos, era mato, não existia nada”, conta, enquanto passeamos pelo espaço (que, na altura da visita da Fugas, ainda estava na fase de finalização das obras).

Ontem, passados quase oito anos desse primeiro momento, e com um investimento de 5,5 milhões de euros, o Craveiral abriu oficialmente ao público, depois de um período de soft opening — e já só é possível fazer reservas para Agosto.

A Pedro, juntaram-se depois João de Azevedo Canilho e Luís Miguel Capinha, e os três sócios apresentam agora o projecto Craveiral Farmhouse, nove hectares na costa alentejana, em São Teotónio, perto da Zambujeira do Mar. A receber-nos, nesses dias de final de obras e muita ansiedade à espera da abertura, estavam ainda os dois primeiros animais do Craveiral: os burros Cravo e Ferradura.

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Os três sócios do Craveiral: João (à esquerda) Pedro e Luís Nuno Santos Ferrreira

As casas — 38, todas independentes, com terraço e cozinha — surgiram no meio de uma zona que pertence à Rede Natura 2000 da qual fazem parte vários habitats prioritários que é preciso proteger. Pedro explica que, embora fazendo parte do sítio de Monchique, o Craveiral “não tinha nenhum desses habitats, pelo que foi necessário recriá-los e trazer espécies protegidas que têm potencial de crescimento aqui”.

Uma das formas de o fazer é, por exemplo, criando o charco temporário mediterrânico, aproveitando uma ligeira depressão no terreno. “Já criámos as condições para ele começar a desenvolver-se. Sendo temporário, recupera as águas naturais, da chuva, mas no Verão seca. Vai permitir o desenvolvimento da flora do sítio de Monchique e, com a colocação dos ninhos nas árvores, vai atrair as aves típicas desta zona, que procuram o charco para nidificarem.”

Como o Craveiral é um projecto de conservação da natureza, a ideia é que quem aqui se instale possa mergulhar num mundo que tem cheiros, sabores e cores próprias. “Vamos ter um centro de interpretação da natureza e um circuito com plantas autóctones e explicar as características gastronómicas, medicinais, e o potencial para a cosmética da flora desta região.” Inicialmente serão sobretudo os aromas e os sabores, mas, revela Pedro, a médio prazo o objectivo é vir a fazer sabonetes e cremes com as diversas plantas.

Mas, porque num passeio, mesmo com explicações, ninguém consegue apreender tudo o que há para saber sobre a flora local, haverá também workshops que ajudarão os hóspedes interessados a aprender as várias utilizações de cada planta. O mesmo acontecerá com os produtos da horta (que não faz parte do projecto de conservação da natureza), usados no restaurante, que tem um projecto de arquitectura assinado por Tiago Silva Dias.

Sem nome, pelo menos para já, o restaurante, com 70 lugares no interior e 70 na esplanada (por enquanto apenas para hóspedes), segue o princípio farm to table, ou seja, vai privilegiar os produtos da horta local e do pomar, quando estes começarem a produzir em maiores quantidades.

Na lógica de envolvimento com a sociedade, foi estabelecida uma parceria com a Associação VilacomVida, para, no restaurante, haver um espaço de pizzas feitas em forno de lenha no qual trabalharão pessoas com Asperger ou Síndrome de Down.

Percorremos o caminho entre as casas, a zona do restaurante, as piscinas (uma interior, com sauna, jacuzzi e ginásio) e duas exteriores, sendo uma maior e mais apropriada para famílias com crianças e a outra mais reservada, esta situada no núcleo de casas que ainda não estão completamente finalizadas. Pedro, João e Luís vão mostrando os detalhes que fazem a diferença neste projecto: a água é toda reutilizada, sendo a que cai dos telhados canalizada para um depósito de rega, todas as zonas construídas são ligadas por passadiços para não tocar a terra, há um picadeiro (podem-se fazer passeios a cavalo) e canis para quem quiser trazer os cães.

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Os burros do Craveiral, Cravo e Ferradura Nuno Ferreira Santos

Apostar na produção nacional

É também altura para conhecermos melhor os três amigos. Pedro é advogado e, até se lançar nesta aventura, a sua relação com a área do turismo era sobretudo através da assessoria jurídica, voltada também para o imobiliário e a reestruturação de empresas. Mas o gosto pela agricultura esteve sempre lá, diz, e por isso, em 2013, criou a Belong, um projecto de agricultura biológica, cujos produtos são distribuídos em cabazes.

João, que durante muitos anos trabalhou numa multinacional de telecomunicações, e Luís, que é designer gráfico, já tinham experiência com turismo, entendido sobretudo como a arte de receber bem e fazer com que os hóspedes se sintam como se estivessem em casa. É o que fazem com a Casa Amora, junto do Jardim das Amoreiras, em Lisboa.

Foi com o mesmo cuidado que escolheram todos os materiais e objectos para as casas do Craveiral. “Apostámos nas empresas portuguesas”, explicam os três. “Portugal tem um potencial incrível e usarmos produtos nacionais é uma forma de diferenciarmos o projecto. Conseguimos ter produtos ao nível do melhor que há no mundo e que são feitos cá. Desde o início que quisemos associar o Craveiral ao desenvolvimento de marcas nacionais.”

As casas são de um conforto feito de madeiras claras, paredes brancas aqui e ali cobertas de cortiça escura, tapetes alentejanos, um chapéu de palha pendurado no bengaleiro, como se ali vivesse alguém. “Para o mobiliário, escolhemos peças da DAM, de São João da Madeira, da Wewood, empresa do Porto, os sofás são da Larforma, as cadeiras de Vila Nova de Gaia, os electrodomésticos são Meireles. No projecto de execução, as madeiras são de pinho nacional. Tudo o que é possível obter cá, estamos a conseguir.”

O sonho é que esta aldeia que agora nasce na costa alentejana seja também um motor de desenvolvimento da região. “Podemos usar os meios que existem para o Craveiral e potenciar os terrenos à volta, eventualmente usar os nossos recursos agrícolas para prestar serviços a outras pessoas que tenham casas na zona mas que só venham aos fins-de-semana.” Tal como os arquitectos falam em “criar cidade”, a ideia aqui, resume Pedro, é “criar vida rural”.