Bob Geldof, um músico de causas, tocou por Mandela, o homem que fez do mundo “um sítio melhor”
O Nelson Mandela Music Tribute arrancou na quarta-feira em Leça da Palmeira para durante três dias celebrar o centenário de Madiba, que faleceu há cinco anos. Além do irlandês fundador da Band Aid, tocaram no primeiro dia deste evento de beneficência os Kayser Chiefs. Nesta sexta-feira, passam pelo recinto Steven Tyler e Rui Veloso.
“Ninguém nasce a odiar o outro pela cor da pele, pela origem ou pela religião. As pessoas aprendem a odiar e, se podem aprender a odiar, também podem aprender a amar”. Esta é uma das frases de Nelson Mandela e foi em torno desta ideia que duas dezenas de bandas de vários pontos do globo se juntaram para celebrar o centésimo aniversário de um homem que passou quase trinta anos da sua vida encarcerado apenas por acreditar que no mundo há espaço suficiente para todos se poderem encontrar na diferença.
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“Ninguém nasce a odiar o outro pela cor da pele, pela origem ou pela religião. As pessoas aprendem a odiar e, se podem aprender a odiar, também podem aprender a amar”. Esta é uma das frases de Nelson Mandela e foi em torno desta ideia que duas dezenas de bandas de vários pontos do globo se juntaram para celebrar o centésimo aniversário de um homem que passou quase trinta anos da sua vida encarcerado apenas por acreditar que no mundo há espaço suficiente para todos se poderem encontrar na diferença.
Foi exactamente na data em que nasceu, a 18 de Julho, que, organizado pela Fundação Nelson Mandela, com o apoio da Câmara de Matosinhos e da Embaixada da África do Sul, arrancou o primeiro de três dias de Nelson Mandela Music Tribute, evento solidário cujas receitas revertem na totalidade para a fundação (75%) e para a Associação Portuguesa de Esclerose Lateral Amiotrófica (25%). Antes do evento orçado em 2 milhões de euros começar, a organização esperava aproximadamente 40 mil pessoas. Na abertura terão participado 12 mil. Os bilhetes diários custam 40 euros e o passe geral 100 euros.
Habituado às causas, o activista Bob Geldof, amigo do Nobel da Paz, foi um dos nomes que marcou presença na iniciativa que até sexta-feira decorre na praia do Aterro, em Leça da Palmeira. No primeiro dia também tocaram Cecilia Krull, Calema, Pablo Alborán e Kaiser Chiefs.
São nomes de nacionalidades e géneros musicais diferentes. Todos couberam no mesmo recinto e serviram os gostos distintos do público diverso que por lá passou.
A madrilena Cecilia Krull, que recentemente ficou conhecida por assinar o tema de abertura da série Casa de Papel abriu o palco ao final da tarde. Soul a piscar o olho a um R&B com base electrónica. My life is going on valeu-lhe para conseguir a atenção ainda do pouco público que àquela hora estava frente ao palco. Tiveram de ouvir o tema em dose dupla, à segunda remixado.
Além do sucesso catapultado pela série espanhola, ainda não tem material suficiente para segurar um set. Preencheu-o com mais meia dúzia de originais e recorrendo a versões. Tocou Wicked game, de Chris Isaak, e This is what it feels like, de Banks, antes de os Calema entrarem em palco para representarem a kizomba feita em São Tomé e Príncipe, numa versão mais épica e rock suportada em teclados e guitarras distorcidas.
São dois irmãos as figuras de proa que conduzem as vocalizações. Durante a actuação referem Mandela como o símbolo que lhes terá proporcionado, a partir do país de origem, onde teriam “90 % de hipóteses de falhar”, conseguir ter vingado numa carreira dentro da área que escolheram.
A noite caía na paisagem marcada igualmente por contrastes. Do lado esquerdo do palco vê-se o areal extenso cortado por um passadiço que segue pela marginal paralelamente ao mar. Do outro lado vêem-se os pontos luminosos e a chamas que saem das torres da refinaria da Petrogal. Temos natureza e temos paisagem industrial.
Temos também o pop latino do espanhol Pablo Alborán a servir de pretexto para o público dançar, num recinto já mais composto.
Geldof, um rockeiro de causas
Homem de causas é também o activista e humanista Bob Geldof. Desde 1984, quando o irlandês fundou a Band Aid, antes do concerto de beneficência Live Aid, no ano seguinte, e de Live 8, em 2005, que abraçou causas maiores do que o universo musical, do qual se serviu para levar avante o seu plano.
Entra com Redemption song, de Bob Marley, antes de revelar quais as preferências musicais de Madiba, que diz ter conhecido na Cidade do Cabo pouco depois de ter saído do cárcere. Mandela ter-lhe-á dito que no topo das suas escolhas estavam os Abba. “Como era uma pessoa muito bem-educada disse que também gostava de música irlandesa”, conta Geldof antes de soltar o folk-rock de The great song of indifference, a remeter para o seu país de origem.
O activista, ocasionalmente actor — interpreta Pink no filme The Wall dos Pink Floyd —, revela sentir alguma estranheza por apenas ao fim de 40 anos de carreira, desde que fundou os Boomtown Rats, estar a tocar no Porto. “São 30 anos de solidariedade, mas são mais os de rock’n’roll”, esclarece. Naquela noite diz que se vai ouvir folk, rock e reaggae. Ouve-se um teclado Hammond e solta Systematic 6-pack seguida de Dazzled by you. Por essa altura já se percebia que não foi ali apenas marcar presença.
Antes de ir embora fala da experiência que foi conhecer Mandela, de quem se tornou amigo: “Sinto-me um afortunado por ao longo da minha vida ter conhecido ídolos musicais, príncipes e papas. Mas a personalidade que mais me impressionou foi Madiba. Era um homem comum que gostava de mulheres, música, futebol e crianças, mas também era um homem que abraçava causas políticas e que agraciava tudo o que fazia. Na presença de opressores aprendia a falar a língua deles. No cativeiro adaptava-se. Era um grande homem e fez do mundo um sítio melhor. Particularmente na arquitectura do mundo actual, com Putin, Kim Jong-un, Erdogan e Trump no poder faz ainda mais sentido lembrar Mandela”. Depois destas palavras lança-se para o reggae Scream in vain. Voltou ao passado para revisitar I don’t like Mondays e Rat trap, dois clássicos dos seus Boomtown Rats. Pega no casaco, faz uma vénia e despede-se.
O rock solidário sem discursos dos Kaiser Chiefs
Sem tempo para discursos foi feita a actuação dos Kaiser Chiefs, que regressam à sua “segunda casa”, como disse o vocalista Ricky Wilson. Contribuíram com o seu indie rock frenético que a plateia recebeu de bom grado. Dificilmente algo poderá correr mal quando já se tem o aval de quem pagou para os ver. Provando mais uma vez que o palco é onde os britânicos conseguem escavar o melhor das suas composições, usaram-no como montra para os vários singles coleccionados ao longo de 13 anos, desde que lançaram Employment. Arrancaram com Everyday I love you less and less e passaram por Everything is average nowadays, Modern way, Na na na na naa, Never miss a beat, The angry mob, Oh my God, I predict a riot e, claro, Ruby.
O evento termina nesta sexta-feira, dia em que tocam Steven Tyler, Nuno Bettencourt ou Rui Veloso. Nesta quinta-feira estava agendada a presença de Gabriel, o Pensador que passou a cabeça de cartaz após o cancelamento de Wicleaf Jean.
Continuar e expandir
Termina esta edição, mas é objectivo da organização dar continuidade ao evento. O responsável pelo Nelson Mandela Music Tribute, Telmo Fernandes, diz que a ideia é expandir para São Paulo, mantendo a linha de “não sectarismo” e dividindo a receita por outras entidades. Espera que esta seja também “a primeira de muitas” edições em Matosinhos e afirma que o objectivo é repetir já no próximo ano. A presidente da autarquia, Luísa Salgueiro, que simbolicamente ofereceu a Bob Geldof, a Cecilia Krull e a Mmamokwena Gaoretelelwe, embaixadora da África do Sul, uma garrafa de um vinho do Porto com 100 anos diz que ainda é cedo para poder garantir que se repetirá.