Fóssil de cobra bebé com 99 milhões de anos encontrado na Birmânia
A descoberta de um fóssil "incrivelmente raro" revela que a coluna vertebral destes animais não evoluiu significativamente até aos dias de hoje.
O fóssil de uma cobra bebé, com cerca de 99 milhões de anos, foi encontrado na Birmânia dentro de um pedaço de âmbar. Além de revelar que as serpentes já viviam nas florestas daquela região durante o período Cretácico – entre 145 e 66 milhões de anos atrás – junto de dinossauros, lagartos e insectos voadores, mostra que anatomicamente as cobras não evoluíram muito significativamente até aos dias de hoje.
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O fóssil de uma cobra bebé, com cerca de 99 milhões de anos, foi encontrado na Birmânia dentro de um pedaço de âmbar. Além de revelar que as serpentes já viviam nas florestas daquela região durante o período Cretácico – entre 145 e 66 milhões de anos atrás – junto de dinossauros, lagartos e insectos voadores, mostra que anatomicamente as cobras não evoluíram muito significativamente até aos dias de hoje.
À espécie foi dado o nome Xiaophis myanmarensis, que significa “cobra do amanhecer de Myanmar" (o nome oficial da Birmânia é Myanmar) e é também uma homenagem a Xiao Jia, especialista em âmbar que doou o fóssil ao Instituto Dexu de Paleontologia em Chaozhou, na China. A descoberta foi revelada num artigo científico publicado, nesta quarta-feira, na revista Science Advances e a investigação foi liderada por Lida Xing, principal autor do artigo e paleontólogo da Universidade Chinesa de Geociências, em Pequim. Este é um fóssil “incrivelmente raro”, pois é “o primeiro fóssil de uma cobra bebé alguma vez encontrado”, explicou à BBC News Michael Caldwell, professor de biologia na Universidade de Alberta (Canadá) e co-autor do estudo.
A pequena cobra tem menos de cinco centímetros de comprimento - o que poderá ter levado a que no início os cientistas pensassem que poderia ser o fóssil de uma centopeia - mas poderia ter crescido até um metro de comprimento. O esqueleto é composto por 97 vértebras, mais costelas. Porém, falta o crânio do animal que não ficou preservado naquele pedaço de âmbar, explica em comunicado a Academia Chinesa de Ciências que também colaborou no estudo. Apesar de terem a certeza que corresponde a um fóssil de uma cobra em fase de vida inicial, os investigadores não conseguiram perceber se corresponde a um embrião ou a um recém-nascido.
O réptil terá ficado preso na resina de uma árvore – “a super-cola do registo fóssil”, diz Caldwell – que secou e se transformou em âmbar. “O âmbar é totalmente único – o que quer que toque nele fica congelado no tempo”, incluindo fragmentos de plantas e insectos que permitiram confirmar que aquela espécie vivia, de facto, num ambiente florestal, explica o especialista à BBC. Este é um detalhe importante, uma vez que “quase todas as outras cobras conhecidas que viveram no Cretácico Superior tinham adaptações aquáticas ou foram encontradas em sedimentos depositados perto de áreas fluviais e costeiras, e não podem ser conclusivamente ligadas a hábitos terrestres”, explicam os investigadores no artigo. Por isso, a nova espécie revela uma “maior diversidade ecológica entre as primeiras cobras do que se pensava anteriormente”, acrescentam.
Os restos ósseos desta serpente foram analisados através de tomografias computorizadas e, posteriormente, comparados com as características anatómicas de cobras actuais com algumas semelhanças (como a serpente asiática da espécie Cylindrophis ruffus). Esta pesquisa mostrou que, em quase cem milhões de anos, a coluna vertebral das cobras praticamente não se desenvolveu, o que leva os cientistas a acreditar que as serpentes sobreviveram durante dezenas de milhões de anos num estado de evolução primitivo.
Um segundo pedaço de âmbar foi também descoberto, contendo pedaços de pele fossilizados de uma outra cobra que os cientistas afirmam que seria muito maior. As escamas preservam ainda alguns dos padrões originais, no entanto, não foi possível averiguar se este seria um membro da mesma espécie da cobra bebé.
Os fósseis de cobra mais antigos do mundo (que incluem uma cobra portuguesa) datam entre 140 e 167 milhões de anos atrás. A espécie mais antiga de que há conhecimento é a Eophis underwoodi, uma pequena serpente de 25 centímetros (que habitava pântanos) proveniente do Reino Unido.
O estudo, levado a cabo por uma equipa internacional (além do Canadá e China, incluiu cientistas dos Estados Unidos e Austrália), revelou a existência de “uma inesperada diversidade de serpentes tanto nos reinos terrestres quanto nos aquáticos” durante o período Cretácico, conclui o artigo. A nova espécie providencia uma “oportunidade sem precedentes para observar aspectos da ontogenia do esqueleto das cobras, fornecendo conhecimentos excepcionais e inesperados sobre a evolução de um dos grupos de animais mais bem-sucedidos e icónicos da natureza”.
Texto editado por Nicolau Ferreira