Novas da bossa, da América para o mundo
A um olhar americano sobre a bossa nova, numa selecção de 20 álbuns notáveis em 9 CD, junta-se uma reedição também made in USA de duas pérolas de Ary Barroso e Dorival Caymmi. Uma festa sonora.
Quem passar pelas lojas e vir uma caixa onde sobressaem, a amarelo e rosa, as palavras Bossa Nova, não siga adiante; pare. E veja com atenção o que tem pela frente. Porque não é mais uma colectânea das várias que têm surgido no mercado desde que a bossa nova completou meio século (algumas bem criteriosas, outras bem dispensáveis), é uma reunião de 20 álbuns, em versão integral, no espaço comprimido de 9 CD. Com selo americano (dos EUA, bem entendido), a reunião espelha também um olhar americano sobre este género musical brasileiro que agitou o mundo, e em particular a América. Por isso, a caixa é mais comedida nos protagonistas brasileiros dessa vaga, embora destes inclua títulos essenciais, e mais generosa nos seus ecos norte-americanos, em particular no mundo do jazz. Daí que sejam aqui incluídos álbuns marcantes dessa contaminação, como os de Coleman Hawkins (Desafinado), Quincy Jones (Big Band Bossa Nova), Stan Getz (Jazz Samba, com Charlie Byrd; e, com Gary McFarland, Big Band Bossa Nova, título igual ao do disco de Quincy, porém gravados no mesmo ano de 1962), Dizzy Gillespie (Dizzy on the French Riviera), Zoot Sims (New Beat Bossa Nova, vols. 1 e 2) e Bud Shank (com o guitarrista Laurindo Almeida, Brazilliance, Vols. 1 e 2; e com o pianista Clare Fischer, Bossa Nova Jazz Samba). Onze títulos em 20!? Podemos, então, olhar para este conjunto de discos como uma mostra de jazz? Há duas respostas para tal afirmação.
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Quem passar pelas lojas e vir uma caixa onde sobressaem, a amarelo e rosa, as palavras Bossa Nova, não siga adiante; pare. E veja com atenção o que tem pela frente. Porque não é mais uma colectânea das várias que têm surgido no mercado desde que a bossa nova completou meio século (algumas bem criteriosas, outras bem dispensáveis), é uma reunião de 20 álbuns, em versão integral, no espaço comprimido de 9 CD. Com selo americano (dos EUA, bem entendido), a reunião espelha também um olhar americano sobre este género musical brasileiro que agitou o mundo, e em particular a América. Por isso, a caixa é mais comedida nos protagonistas brasileiros dessa vaga, embora destes inclua títulos essenciais, e mais generosa nos seus ecos norte-americanos, em particular no mundo do jazz. Daí que sejam aqui incluídos álbuns marcantes dessa contaminação, como os de Coleman Hawkins (Desafinado), Quincy Jones (Big Band Bossa Nova), Stan Getz (Jazz Samba, com Charlie Byrd; e, com Gary McFarland, Big Band Bossa Nova, título igual ao do disco de Quincy, porém gravados no mesmo ano de 1962), Dizzy Gillespie (Dizzy on the French Riviera), Zoot Sims (New Beat Bossa Nova, vols. 1 e 2) e Bud Shank (com o guitarrista Laurindo Almeida, Brazilliance, Vols. 1 e 2; e com o pianista Clare Fischer, Bossa Nova Jazz Samba). Onze títulos em 20!? Podemos, então, olhar para este conjunto de discos como uma mostra de jazz? Há duas respostas para tal afirmação.
Sim, é uma mostra de jazz mas subordinado aos ditames rítmicos e harmónicos da bossa nova, que por sua vez já nascera de um cruzamento entre a música norte-americana (do jazz aos crooners) e o samba-canção, que no Brasil historicamente a antecedeu (e um livro recente, Copacabana, de Zuza Homem de Mello, dá disso prova numas 500 saborosas e admiráveis páginas). Mas não, não é uma mostra de jazz, porque ao lado dos muitos músicos, na maioria saxofonistas, que da bossa fizeram bandeira e objecto de criação e improviso (nos combos há nomes como Clark Terry, Phil Woods, Jim Hall, Paul Gonsalves ou Rahsaan Roland Kirk) há aqui um conjunto de discos brasileiros que estiveram e estão na génese do género. A começar pelo histórico pré-bossa-novista Canção do Amor Demais, de Elizete Cardoso, totalmente preenchido com temas de Vinicius de Moraes e Tom Jobim e com João Gilberto no violão; e a terminar no trio de álbuns que foram a glória do próprio João Gilberto, também aqui incluídos na íntegra, mas com os títulos e as capas da sua edição americana: Chega de Saudade, o primeiro, é The Warm World of João Gilberto; O Amor, o Sorriso e a Flor, o segundo, é Brazil’s Brilliant João Gilberto; e João Gilberto, o terceiro, é The Boss of The Bossa Nova. Desde que não nos percamos na tradução, o resto é ouro. O CD que contém estes três LP inclui ainda, tal como uma edição americana anterior, o EP com as músicas do filme Orfeu do Carnaval cantadas por João. Daqui, ponte para dois LP de Elizete com o saxofonista Moacyr Silva (que integrava a orquestra do Copacabana Palace nos seus tempos de glória), Sax Voz, vols. 1 e 2 (integrados na caixa mas também num CD editado em paralelo, com a reprodução integral das respectivas capas e contracapas). E também para os pais da composição bossa-novista, Tom e Vinicius, este com The Poet of Bossa Nova e o primeiro com The Greatest Bossa Nova Composer, em dois volumes. A par do prazer de reouvir, remasterizados, tais clássicos, esta caixa tem ainda como aliciante permitir escutar diversas interpretações de um mesmo tema-chave da bossa, com tantas cores e variações quanto as que lhe são dadas por cada grupo ou intérprete.
Distribuída na mesma altura, há ainda uma dupla pérola num CD único, com as capas e contracapas originais da edição americana reproduzidas em miniatura: Ary Barroso, Meu Brasil Brasileiro (instrumental, com Ary ao piano mais a sua orquestra) e Ary Barroso & Dorival Caymmi, Um Interpreta o Outro, com Ary ao piano a tocar as canções de Dorival e este a cantar (e a tocar, no violão) as canções de Ary Barroso. Ouça-se a sequência Marina-Maria (Dorival por Ary e vice-versa) e rejubile-se. Na arte destes dois gigantes estavam já as sementes desse futuro que foi e é a bossa nova.