As reuniões de avaliação eram um momento “sacralizado”. Agora são “apenas burocracia”
Ainda houve escolas em que os conselhos de turma dos anos de exame não foram realizados porque foram convocados sem respeitar os termos dos serviços mínimos, mas a generalidade das reuniões marcadas foram realizadas. Sindicatos enviam carta ao Governo pedindo que reabra negociações sobre a contagem do tempo de serviço.
Nazaré Morais é professora do ensino secundário há 26 anos e “nunca” teve “um conselho de turma assim”. Se nesta segunda-feira tivesse sido um dia como os outros, a falta de uma das suas colegas à reunião de avaliação teria sido o suficiente para que esta fosse adiada. Mas foi o primeiro dia de serviços mínimos decretados por um colégio arbitral em resposta à greve dos professores às reuniões de avaliação. Mesmo com greve as classificações tinham de ser dadas. E as notas dos alunos da sua turma do 12.º ano da Escola Secundária Clara de Resende, no Porto, foram mesmo lançadas.
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Nazaré Morais é professora do ensino secundário há 26 anos e “nunca” teve “um conselho de turma assim”. Se nesta segunda-feira tivesse sido um dia como os outros, a falta de uma das suas colegas à reunião de avaliação teria sido o suficiente para que esta fosse adiada. Mas foi o primeiro dia de serviços mínimos decretados por um colégio arbitral em resposta à greve dos professores às reuniões de avaliação. Mesmo com greve as classificações tinham de ser dadas. E as notas dos alunos da sua turma do 12.º ano da Escola Secundária Clara de Resende, no Porto, foram mesmo lançadas.
“A colega [que fez greve] deixou os elementos de avaliação. Disseram-nos, as notas são estas. E pronto”, contou ao PÚBLICO esta professora de Aplicações Informáticas à saída da reunião de avaliação.
“Limitamo-nos a ratificar as notas, seguindo as indicações do acórdão [do colégio arbitral]”, confirmou Ana Sousa, directora daquela turma. “Há muitas reflexões que são feitas, habitualmente, no conselho de turma que não foram feitas. Mesmo que houvesse dúvidas, não tínhamos ali a professora a quem recorrer", acrescenta.
O conselho de turma que Ana Sousa dirigiu na manhã desta segunda-feira já tinha sido adiado por cinco vezes devido à greve dos professores. A reunião, que costuma demorar mais de duas horas, não teve nesta segunda-feira mais do que hora e meia. “Foi apenas burocracia”, considera Nazaré Morais: “Demoramos mais tempo foi a preencher papeladas."
As reuniões de conselho de turma são “um momento sacralizado” do ano lectivo, ilustra Fernando Pinho, que é professor de Matemática – mas não naquela turma. Aos amigos que não são professores, até costuma contar uma anedota para lhes explicar a importância das reuniões de avaliação. “Pergunto-lhes: o que é que fazes se, num dia de manhã, a caminho do emprego, tiveres um acidente de carro?” Tal como qualquer outra pessoa, um professor também “chama o reboque, trata de resolver o problema”, mas, no final “tem que ir ao médico pedir um atestado”. “As declarações da Polícia ou de qualquer outra entidade não servem para justificar uma falta destas. Só se pode faltar a uma reunião de avaliação com um atestado médico”, sublinha Fernando Pinho, para reforçar a importância do momento.
Este ano, por decisão de um colégio arbitral, composto por três juízes, as escolas têm que garantir a realização das reuniões nas turmas do 9.º, 11.º e 12.º anos, que são aqueles em que se realizam provas nacionais, mesmo que nem todos os docentes estejam presentes. Esta foi a solução encontrada para garantir o lançamento das notas finais dos alunos depois de uma paralisação que dura há um mês. Para cumprir a decisão, as direcções têm que garantir serviços mínimos e assegurar a presença de uma maioria absoluta (50% mais 1) dos professores de cada turma.
A escola Clara de Resende tem 54 turmas – do 5.º ao 12.º ano – e até ao final da semana passada, apenas um conselho de turma tinha sido realizado. Nesta segunda-feira realizaram-se todos. No resto do país, a generalidade das reuniões de conselho de turma dos três anos com exames foram realizadas neste primeiro dia de serviços mínimos. “As reuniões que foram convocadas nos termos da decisão do tribunal arbitral estão a acontecer”, afirma o presidente da Associação Nacional dos Directores de Escola, Manuel Pereira.
Mal convocados
Houve, no entanto, algumas escolas em que mesmo os conselhos de turma dos três anos para os quais estão decretados serviços mínimos, não se realizaram. Isso aconteceu nos casos em que as direcções dos estabelecimentos de ensino não fizeram as convocatórias nos termos exigidos pela decisão do colégio arbitral – que implicava que fossem indicados expressamente quais os professores que tinham que estar obrigatoriamente presentes nos conselhos de turma.
A Federação Nacional de Professores (Fenprof) estima que os serviços mínimos tenham tido um impacto limitado nos efeitos da greve – que, convocada por este sindicado, começou apenas há duas semanas (outro nos mesmo termos vigorava desde 4 de Junho, por iniciativa do novo sindicato Stop).
De acordo com a Fenprof, até à passada sexta-feira 96% dos conselhos de turma não se tinham realizado. Nesta segunda-feira, essa contabilidade desceu: 92% das reuniões foram adiadas. A diferença de cerca de quatro pontos percentuais assinalada pela Fenprof diz respeito às reuniões dos três anos de escolaridade para os quais há serviços mínimos. O Ministério da Educação não divulgou dados sobre o impacto da decisão do colégio arbitral nos conselhos de turma convocados para este início de semana.
Carta aberta ao ministro
Esta segunda-feira, a plataforma sindical de que fazem parte, além da Fenprof, a Federação Nacional de Educação (FNE) e outras oito estruturas sindicais, foi ao Ministério da Educação entregar uma carta aberta em que pede ao ministro que seja “urgentemente retomada” a negociação por causa da recuperação do tempo de serviço – o motivo da divergência entre docentes e tutela que levou à greve. Os sindicatos querem que os nove anos, quatro meses e dois dias que estiveram congelados até 2017 seja contabilizado para efeitos de progressão na carreira; o Governo propôs dois anos, nove meses e 18 dias. Os sindicatos não aceitaram, as negociações foram interrompidas.
“Decidimos ir lá e dizer que, se pudéssemos, estaríamos nós a convocar o senhor ministro para negociar. Não podendo, pedimos que seja ele a convocar a reunião”, explica ao PÚBLICO o secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, que é o porta-voz da plataforma sindical.