Empresas querem queimar 35% dos resíduos para produzir energia

Associação que representa os sistemas de gestão de resíduos que detêm unidades de incineração recusa críticas dos ambientalistas da Zero a esta opção.

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A Valorsul é uma das empresas que exploram uma unidade de incineração de resíduos João Henriques

As quatro sociedades gestoras de resíduos portuguesas que exploram unidades de valorização energética, por incineração de uma parte do lixo indiferenciado, acusam a associação ambientalista Zero de tentar baralhar a opinião pública com as críticas que vem fazendo a esta opção. Estas empresas não só rejeitam que o recurso à queima, que lhes garante receitas importantes, desincentive os seus esforços para aumentar a reciclagem, como assumem que pretendem vir a direccionar para queima 35% do lixo que produzimos, para acabar de vez com a deposição em aterro.

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As quatro sociedades gestoras de resíduos portuguesas que exploram unidades de valorização energética, por incineração de uma parte do lixo indiferenciado, acusam a associação ambientalista Zero de tentar baralhar a opinião pública com as críticas que vem fazendo a esta opção. Estas empresas não só rejeitam que o recurso à queima, que lhes garante receitas importantes, desincentive os seus esforços para aumentar a reciclagem, como assumem que pretendem vir a direccionar para queima 35% do lixo que produzimos, para acabar de vez com a deposição em aterro.

Na semana passada, a Zero alertou para os baixos resultados expectáveis – um aumento de 6% na reciclagem - do investimento de 206 milhões de euros aprovados até ao final do ano passado pelo Programa Operacional Sustentabilidade e Uso Eficiente dos Recursos (POSEUR). Em Portugal, e na média de todos os sistemas, a reciclagem "estagnou" nos 30% do total de resíduos produzidos, o país corre contra o tempo para atingir uma taxa de reciclagem de 50% em 2020 e de 65% em 2035 e os ambientalistas consideram que isso só se conseguirá com um reforço da recolha porta-a-porta e com o fim dos incentivos tarifários à energia produzida pela queima de lixo.

Sem nunca pôr em causa as contas da Zero sobre o impacto dos investimentos aprovados pelo POSEUR, a Avaler, que reúne a Lipor (Grande Porto), a ValorSu (Grande Lisboa e Oeste), a Teramb (Açores) e a ARM (Madeira), sociedades que exploram, nos seus sistemas de gestão de resíduos, unidades de valorização energética, atiram-se ao combate que esta associação vem fazendo à opção pela queima. Acusando-a de "incorrecções grosseiras" , notam que ela é apenas uma entre várias formas de produção de electricidade subsidiada com tarifas mais generosas.

“Em Portugal todas as formas de produção de electricidade a partir de resíduos têm apoio na tarifa de venda dessa electricidade à rede eléctrica. Tal inclui a eletricidade produzida a partir de biogás de aterro, a partir do biogás de digestão anaeróbia de resíduos (que são tarifas mais elevadas) e a electricidade produzida a partir de valorização energética, que é a tarifa mais baixa de toda a produção em regime especial. A totalidade deste apoio representa 2 a 3% do apoio à produção em regime especial (onde se incluem pequenas centrais hídricas, eólicas, fotovoltaicas, etc.), argumenta a Avaler.

As quatro sociedades defendem que “o apoio à tarifa de electricidade aproveita a praticamente todos os portugueses, na criação de Sistemas avançados de Gestão de Resíduos. Consideram por isso “surpreendente ver uma associação de defesa do ambiente defender a eliminação deste apoio, que tem sido fundamental para Portugal tratar de modo mais sustentável os seus resíduos urbanos”. E recusam que os dois sistemas que mais ganham com esta opção, a Lipor e a Valorsul, que servem áreas com mais população e mais produção de resíduos, estejam a empenhar-se menos na reciclagem.

A Avaler nota que a Lipor com 44 kg/habitante, em 2016, e a Valorsul com 42 kg/habitante para o mesmo ano [2016], foram o 4.º e o 6.º dos 23 Sistemas de Gestão de Resíduos urbanos de Portugal continental que mais recolheram selectivamente materiais para reciclagem. E acrescenta que ambas têm desenvolvido projectos “únicos no país, como os Sistemas de compostagem da Lipor e de digestão anaeróbio da Valorsul, com base em bioresíduos recolhidos selectivamente". Isto, insistem, “demonstra, com clareza, que a valorização energética é um complemento fundamental da reciclagem e não seu opositor”.

Aliás, reagindo às críticas da Zero à alocação de 60 milhões de euros para uma nova central de incineração em São Miguel, a Avaler contrapõe que em 2016 “esse Sistema recolheu selectivamente para reciclagem multimaterial 98.196 toneladas de material o que, para uma população servida de cerca de 133 mil habitantes, dá uma recolha per capita anual de 73,8 kg, muito acima, portanto, da média nacional”. Por isso, insiste, “a unidade de valorização energética em desenvolvimento, servirá para dar destino ao resíduos urbanos que não possam ser alvo de valorização material e a outras tipologias de resíduos existentes na Ilha, que presentemente não têm valorização”.

Nesta perspectiva, estas empresas criticam a Zero por advogar que o país, para além de reciclar  65% dos resíduos em 2035, possa, nessa altura, fazer uso do limite previsto para deposição em aterro, que será de 10%. Estas sociedades, que transformam em energia, actualmente, cerca de 23% do lixo indiferenciado produzido em Portugal - mas que representa a maior percentagem do que chega às suas instalações -, defendem que nessa altura a queima deverá chegar aos 35%, eliminando praticamente, desta forma, o recurso aos aterros, onde devem ser depositados “apenas os resíduos que não possam ter nenhuma forma de valorização”. À imagem, notam, “do que fazem já hoje os países mais desenvolvidos do Mundo em termos de gestão de resíduos (Dinamarca, Holanda, Bélgica, por exemplo)”.

A Avaler considera que só assim se pode garantir verdadeira circularidade na gestão de resíduos. Mas esta é uma ideia criticada não só pelos ambientalistas, como até pela própria Comissão Europeia. No último relatório sobre o cumprimento da legislação ambiental europeia em Portugal, divulgado pelo PÚBLICO no início do mês, esta entidade escrevia que “percentagem ainda elevada de resíduos urbanos incinerados e depositados em aterros está a impedir a passagem para uma economia circular” do país e, tal como a Zero e outras organizações, defendia uma aposta na recolha porta-a-porta, em vez de mais investimento em ecopontos.