As alterações contraditórias da legislação laboral
Impõe-se que as anunciadas alterações legislativas contribuam para a crescente humanização do trabalho.
As recentes alterações da legislação laboral acordadas no âmbito da Comissão Permanente da Concertação Social têm sido objecto de argumentos contraditórios.
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As recentes alterações da legislação laboral acordadas no âmbito da Comissão Permanente da Concertação Social têm sido objecto de argumentos contraditórios.
Assim, tem sido consensual a redução da duração máxima dos contratos de trabalho a termo de três para dois anos, bem como do tempo das renovações, que não poderá exceder o período inicial do contrato.
Igualmente, não tem sido questionada a diminuição da duração do contrato de trabalho a termo incerto de seis para quatro anos, tal como a admissibilidade da contratação de trabalhadores à procura de primeiro emprego ou na situação de desemprego de longa duração, apenas, com fundamento na necessidade temporária da empresa, de acordo com a regra geral prevista no artigo 140.º do Código do Trabalho (CT).
Do mesmo modo, com a única excepção da Associação Portuguesa das Empresas do Sector Privado de Emprego, tem sido aceite a fixação de um limite de seis renovações para os contratos de trabalho temporário durante o período máximo de dois anos, tal como a taxa sobre a sua excessiva rotatividade.
Seguramente, estes limites podem contribuir para a diminuição dos abusos do recurso aos contratos de trabalho a termo e temporário, desde que seja assegurado o cumprimento destas novas regras.
Diferentemente, tem sido justamente criticado o alargamento do actual período experimental de 90 para 180 dias, nos contratos de trabalho sem termo dos trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração, quando não estejam em causa “cargos de complexidade técnica ou elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação, bem como as que desempenhem funções de confiança” (artigo 112.º, alínea b) do CT).
Tal alteração, além de aumentar a insegurança laboral, viola o princípio da igualdade no trabalho e da proibição de discriminação, consagrado no artigo 13.º da Constituição e nos artigos 24.º e 25.º do CT.
Por outro lado, a generalização dos contratos de trabalho de muito curta duração, actualmente limitado pelo artigo 142.º do CT à actividade sazonal agrícola ou a eventos turísticos, tal como o aumento para 35 dias, também, contrariam o propósito de reduzir a segmentação laboral, sobretudo, nas micro e pequenas empresas. De resto, a duração inicial de uma semana já tinha sido aumentada para 15 dias, tal como o limite anual de 60 para 70 dias, pela Lei 23/2012, de 25 de Junho. Acresce o facto de, actualmente, ser possível a celebração do contrato de trabalho a termo certo por prazo inferior a seis meses nas situações temporárias, como é o caso de substituição de trabalhadores, acréscimo excepcional de actividade, tarefa ocasional ou serviço de curta duração. Por isso, o trabalho não declarado, que afecta muitos milhares de trabalhadores, pela gravidade dos seus danos, deve ser combatido através do aumento das sanções e do reforço da fiscalização e não através de mais contratos de muito curta duração.
Também se afigura desadequada a proposta de manutenção do banco de horas grupal, agravada pela redução da percentagem de 70% para 60% dos trabalhadores para o aprovar. Os limites máximos da duração de trabalho diário e semanal, respectivamente, de oito e quarenta horas, fixados no artigo 203.º do CT, não podem ser aumentados para dez e cinquenta horas, apenas, por grupos de trabalhadores, de cada empresa, muitas vezes precários, ademais, sem a justa retribuição do trabalho suplementar.
A todas as luzes, impõe-se que esta matéria seja negociada no âmbito da contratação colectiva com a participação das associações sindicais.
Estão em causa limites que vigoram em Portugal desde 10 de Maio de 1919 (Decreto n.º 5616) e que foram aprovados pela Convenção n.º 1 da Organização Internacional de Trabalho, de 29/10/1919. O direito do trabalho nasceu no final do século XIX para mitigar a desigualdade entre empregadores e trabalhadores, protegendo estes, em especial, os jovens e as mulheres. Em Portugal, a Constituição da República Portuguesa garante, nos artigos 53.º e 59.º, a segurança no emprego e o direito dos trabalhadores à organização do trabalho em condições dignificantes. Assim sendo, impõe-se que as anunciadas alterações legislativas respeitem estes princípios fundamentais, contribuindo para a crescente humanização do trabalho.