Toupeira-de-água está a desaparecer do Nordeste de Portugal
Espécie já estava em perigo de extinção, mas um novo estudo feito por cientistas do Porto mostra que o estado de conservação deste mamífero é ainda mais preocupante.
A toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus) desapareceu de 63,5% dos locais onde existia no Nordeste de Portugal, de acordo com uma investigação feita por uma equipa da Universidade do Porto, publicada nesta quarta-feira na revista Animal Conservation.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus) desapareceu de 63,5% dos locais onde existia no Nordeste de Portugal, de acordo com uma investigação feita por uma equipa da Universidade do Porto, publicada nesta quarta-feira na revista Animal Conservation.
Nos últimos 20 anos, o efectivo populacional desta espécie sofreu um acentuado declínio nas bacias do Tua e do Sabor, afluentes do rio Douro, de acordo com o estudo de investigadores do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (Cibio-InBio) da Universidade do Porto. Além do Norte de Portugal, este mamífero insectívoro vive em regiões do Centro e Norte de Espanha e nos Pirenéus (Andorra e França) e tem o estatuto de conservação "vulnerável" na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), o que corresponde a um risco alto de extinção.
Como o próprio nome indica, a toupeira-de-água habita em ambientes aquáticos, especialmente nas zonas conhecidas como cabeceiras (áreas de nascentes em zonas montanhosas) que parecem servir de abrigo natural. Por serem locais onde as águas têm baixa temperatura e fluxo rápido, reúnem as condições favoráveis à fixação destes animais, pelo que a sua preservação, assim como dos riachos e ribeiros no geral, é essencial para a sobrevivência de toda a biodiversidade dos ecossistemas de água doce, ameaçados por múltiplos factores de pressão antropogénicos como a desflorestação de encostas e margens dos rios, a poluição e a construção de barragens (que têm levado a uma extinção das espécies a taxas sem precedentes).
"Estas zonas [cabeceiras] podem actuar como refúgios naturais, perante alguns dos factores que levam ao declínio da toupeira-de-água, como a acção humana, as alterações climáticas ou as espécies invasoras. Para além disso, estes cursos de água têm, geralmente, maior estabilidade na disponibilidade de macroinvertebrados, dos quais a toupeira-de-água se alimenta", esclarece em comunicado Lorenzo Quaglietta, um dos autores do estudo.
Os investigadores do Cibio-InBio usaram dados de distribuição geográfica e modelos estatísticos para mapear as probabilidades de ocorrência da toupeira-de-água e relaciona-las com variáveis ambientais. Os dados recolhidos em 74 locais das bacias hidrográficas do Tua e do Sabor, entre 2014 e 2015, foram comparados com registos obtidos num estudo anterior entre 1993 e 1996, altura em que esta espécie tinha sido encontrada em 85,1% dos locais analisados. Porém, no período 2014-15 a sua existência foi apenas registada em 31,1% dos locais, o que se traduz numa taxa de extinção de 63,5%.
Perante esta diminuição populacional, os especialistas sugerem uma reavaliação do estatuto de conservação desta espécie, definido como "vulnerável" em 2008, que "seria importante para atrair os recursos necessários para promover a conservação da toupeira-de-água, tentando deter a tendência actual de declínio", explica Quaglietta. O próximo passo é também reunir "esforços na manutenção da elevada qualidade da água, da densidade da vegetação nas margens dos ribeiros, e do livre fluxo dos cursos de água", de forma a preservar as condições naturais das zonas ribeirinhas, acrescenta o investigador.
Estes resultados fazem parte de uma pesquisa mais abrangente sobre a ecologia da toupeira-de-água. Em Abril, a equipa do Cibio-InBio realizou uma expedição na região do Douro, durante a qual foi acompanhada pelo fotógrafo da National Geographic Joel Sartore, autor do projecto Photo Ark. Foi então que este mamífero se tornou o 8000.º animal a integrar "a maior arca fotográfica do mundo", uma arca de Noé do século XXI que retrata todas as espécies em cativeiro e chama a atenção para aquelas em perigo de extinção. Estas fotografias fazem parte de uma exposição que pode ser visitada na Galeria da Biodiversidade - Centro Ciência Viva do Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto até 29 de Julho.