Vícios públicos, privadas virtudes

Um filme menor de um cineasta contudo interessante, Eva vive de um curioso jogo de espelhos e palcos – e de uma Isabelle Huppert espantosa mesmo que sem surpresas.

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Caso curioso, este de Benoît Jacquot, cineasta de enorme inteligência que, ao longo dos últimos filmes, parece estar a carburar “abaixo das suas possibilidades” mas nunca nos leva a dar o tempo por mal empregue. Acontece de novo com este Eva, adaptação de um romance policial de James Hadley Chase onde o cineasta prolonga a exploração dos jogos de poder e sedução do dito “sexo fraco” que víramos, por exemplo, em Adeus, Minha Rainha (2012) ou Diário de uma Criada de Quarto (2015). Eva, a personagem que dá título ao filme, é uma call girl de luxo em Annecy que mantém as suas “virtudes privadas” absolutamente separados dos seus “vícios públicos” — uma mulher de duas caras que embate de frente com um homem também ele de duas caras, um antigo call-boy parisiense que se torna num dramaturgo de sucesso à conta de uma peça que roubou e apresentou como se fosse sua. Um encontro de máscaras, de imposturas ­— mas se ela sabe quem é e o que quer, ele é um homem que não sabe quem é e que canibaliza os outros para se inventar.

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Caso curioso, este de Benoît Jacquot, cineasta de enorme inteligência que, ao longo dos últimos filmes, parece estar a carburar “abaixo das suas possibilidades” mas nunca nos leva a dar o tempo por mal empregue. Acontece de novo com este Eva, adaptação de um romance policial de James Hadley Chase onde o cineasta prolonga a exploração dos jogos de poder e sedução do dito “sexo fraco” que víramos, por exemplo, em Adeus, Minha Rainha (2012) ou Diário de uma Criada de Quarto (2015). Eva, a personagem que dá título ao filme, é uma call girl de luxo em Annecy que mantém as suas “virtudes privadas” absolutamente separados dos seus “vícios públicos” — uma mulher de duas caras que embate de frente com um homem também ele de duas caras, um antigo call-boy parisiense que se torna num dramaturgo de sucesso à conta de uma peça que roubou e apresentou como se fosse sua. Um encontro de máscaras, de imposturas ­— mas se ela sabe quem é e o que quer, ele é um homem que não sabe quem é e que canibaliza os outros para se inventar.

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Em grande parte devido à presença de Isabelle Huppert no papel principal, capaz de “transformar” a atmosfera com um olhar, um movimento, um tom de voz, Eva gere-se sempre numa corda-bamba algo insolente entre a comédia screwball e o thriller psicológico, mais interessante quando Jacquot joga com o subtexto teatral da história.

As suas personagens estão permanentemente “em cena”, todo o filme se ancora no modo como os limites do “palco” (que, aqui, é também a vida) são respeitados ou transgredidos. Mas se Huppert é perfeita no papel (mesmo que seja o tipo de mulher que ela já faz com as duas pernas atrás das costas), também é verdade que a sua presença e o próprio tom de Eva convocam uma injusta comparação com o Ela de Paul Verhoeven que o filme de Jacquot não pode sequer aguentar. E, perante o instrumento afinado que é a actriz, Gaspard Ulliel é surpreendentemente anémico, carinha laroca incapaz de aceder à turbulência interior que supostamente move a sua personagem. Ficamos com uma senhora actriz e uma série de boas ideias de cinema. E com mais um filme menor de um cineasta que já fez melhor.