Foi preciso esperar mais de meio século por este Coltrane
Se já esperámos 55 anos, podemos esperar mais 20 dias. O quarteto do saxofonista John Coltrane, que morreu há 40 anos, gravou em 1963 uma sessão de estúdio que permaneceu até aqui desconhecida. Foi convertida agora em álbum e tem lançamento marcado para 29 de Junho.
Both Directions at Once: The Lost Album era mesmo um álbum perdido, mas acabou por ser encontrado. É o registo de uma sessão de estúdio do quarteto clássico do saxofonista e compositor John Coltrane, nome maior da música e uma das lendas do jazz norte-americano. Do álbum que tem lançamento marcado para 29 de Junho, apesar de ter sido gravado 55 anos antes, fazem parte cinco versões de temas conhecidos e dois inéditos: Untitled Original 11383 e Untitled Original 11386.
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Both Directions at Once: The Lost Album era mesmo um álbum perdido, mas acabou por ser encontrado. É o registo de uma sessão de estúdio do quarteto clássico do saxofonista e compositor John Coltrane, nome maior da música e uma das lendas do jazz norte-americano. Do álbum que tem lançamento marcado para 29 de Junho, apesar de ter sido gravado 55 anos antes, fazem parte cinco versões de temas conhecidos e dois inéditos: Untitled Original 11383 e Untitled Original 11386.
“Isto é comparável a encontrar-se uma sala nova na Grande Pirâmide”, diz Sonny Rollins, da mesma geração de John Coltrane (1926-1967) e saxofonista como ele, citado pelo diário britânico The Guardian.
Neste novo álbum cujo lançamento foi noticiado – e celebrado – em todo o mundo, o músico lendário tem a seu lado McCoy Tyner (piano), Jimmy Garrison (baixo) e Elvin Jones (bateria). Estávamos em Março de 1963 e o quarteto estava a meio de uma estadia de duas semanas no clube nova-iorquino Birdland. No dia seguinte, lembra o jornalista Iker Seisdedos no espanhol El País, a mítica formação gravaria um dos seus maiores sucessos comerciais com o cantor Johnny Hartman, (John Coltrane and Johnny Hartman, 1963, Impulse! Records).
Talvez tenha sido a antecipação do sucesso do disco com Hartman que levou a que a sessão do dia anterior ficasse por divulgar, defende Jamie Krents, o homem que levou a bom porto a presente edição enquanto executivo da Impulse!, hoje parte da Universal, um dos gigantes da indústria discográfica.
Os dois inéditos, a que Coltrane não chegou a dar nome, juntam-se nesta sessão de estúdio em Englewood agora passada a ábum a versões de temas já registados: Slow blues, One up, one down, Impressions, Nature boy (de Nat King Cole) e Vilja (esta última da opereta A Viúva Alegre, do compositor austríaco Frazn Léhar).
“Isto é o quarteto do Coltrane a começar a dirigir-se para a sua última fase, estável e sem surpresas, quando eles tocavam com frequência o mesmo punhado de canções”, disse ao Guardian Ben Ratliff, autor de Coltrane: The Story of a Sound. “Não há aqui um grande conceito, um grande design. Mas ele experimenta algumas melodias novas, toca um blues estranho, e faz uns pequenos ajustes em Impressions – e isso já é muito.”
A gravação feita naquele 6 de Março de 1963 ficou perdida durante anos porque, ao que parece, não havia rasto de qualquer master no arquivo do talentoso e histórico engenheiro de som que a registou, Rudy van Gelder. Foi Coltrane quem, no fim desse dia, levou uma cópia para casa. Vivia na altura com Juanita Naima Grubbs, a sua primeira mulher (a mulher para quem escreveu o clássico Naima). Depois do divórcio, a ex-mulher do músico ficou com essa cópia e com outros materiais que sobraram desse álbum mítico chamado A Love Supreme. Quando morreu, em 1996, este espólio foi confiado à filha de um casamento anterior, Antonia, que o músico adoptara quando tinha apenas cinco anos.
Depois de chegar a acordo com Antonia, a discográfica reuniu-se com Ravi Coltrane, filho de John, que morreu aos 40 anos com um cancro no fígado, e da pianista Alice McCleod, sua segunda mulher. Jamie Krents jamais consideraria editar algo que Ravi, saxofonista como o pai e responsável pela gestão do seu legado, considerasse não ter qualidade suficiente. Ravi Coltrane ficou surpreendido com o achado e com a coerência do registo e concordou com a sua edição.
Afinal, dizem os críticos, aquele quarteto com que Coltrane gravou o álbum homónimo, assim como A Love Supreme ou Ballads e que viria a dispersar em 1965, foi um dos mais memoráveis da história do jazz. Ben Ratliff não tem dúvidas de que Both Directions at Once mostra a força desta formação, mostra “quão poderosas eram a sua vontade e a sua capacidade de concentração”.