Oh, Lorde! Vai ser difícil escolher no Nos Primavera Sound
Algumas das aventuras mais estimulantes da música actual, entre consagrados e emergentes, vão passar até sábado pelo Porto. Lorde e Father John Misty destacam-se esta quinta-feira na abertura, se a chuva não se evidenciar também.
Os passes gerais para os três dias já esgotaram. E o bilhete para o dia de sábado, o de Nick Cave, também. Restam bilhetes diários, a 60 euros, para quinta e sexta-feira. O público não vai faltar, apesar das previsões de chuva. Resta saber como irá responder a logística do recinto, de forma a minorar os previsíveis efeitos do tempo instável ou do também provável aumento de público, com a lotação máxima diária a apontar para 30 mil espectadores.
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Os passes gerais para os três dias já esgotaram. E o bilhete para o dia de sábado, o de Nick Cave, também. Restam bilhetes diários, a 60 euros, para quinta e sexta-feira. O público não vai faltar, apesar das previsões de chuva. Resta saber como irá responder a logística do recinto, de forma a minorar os previsíveis efeitos do tempo instável ou do também provável aumento de público, com a lotação máxima diária a apontar para 30 mil espectadores.
O que também não vai faltar no Parque da Cidade, no Porto, para mais uma edição do Nos Primavera Sound são motivos de interesse. Aquilo que já era um sintoma dos últimos anos, uma programação que foi alargando o seu raio de acção para além da matriz do rock independente, sente-se talvez de forma ainda mais pronunciada nesta edição, através de um cartaz que será, em termos globais, aquele que melhor parece traduzir o palpitar da música actual, seja a que está ancorada no rock, a que se funda nas electrónicas ou a de filiação hip-hop.
O grande destaque vai evidentemente para Nick Cave & The Bad Seeds (sábado, 22h05), que regressam a um recinto onde já deu um memorável concerto, em 2013. E é bem plausível que este venha a ser ainda mais notável. É que Nick Cave vem de uma digressão triunfal, em torno do magnífico álbum Skeleton Tree (2016), em que mostrou ser um dos mais carismáticos performers da música actual, ao mesmo tempo que foi capaz de intensificar a sua relação de proximidade com o público, especulando-se que provavelmente essa renovada atitude ficará a dever-se a um acontecimento funesto da sua vida particular, a morte de um filho. Qualquer que seja a razão, a verdade é que ver Nick Cave hoje em dia é imperdível.
A neozelandesa Lorde (quinta-feira, 22h) ainda não tem essa aura, e está longe de conquistar um público transversal, mas também mostrou com dois álbuns (Pure Heroine, de 2013; Melodrama, de 2017) que não é uma mera cantora adolescente, tendo sido capaz de suplantar as fórmulas mais expectáveis, tanto nas temáticas que aborda como na produção musical, quando se lança à interpretação de baladas intimistas ou a temas de dança mais hedonistas. Quem a viu em Lisboa, no Rock In Rio de 2014, percebeu que não era de forma nenhuma um engodo descartável. Mas agora vem com a sua reputação reforçada.
Previsivelmente, a cantora irá dividir o protagonismo, na primeira noite, com o rapper americano Tyler, The Creator (quinta-feira, 23h20), exemplo de um hip-hop de ritmos nada evidentes, contorcendo-se e amalgamando-se por entre climas de paranóia sublinhados por metáforas inquietantes, furiosas e indignadas. Com álbum acabado de lançar (Testing), um outro rapper americano, A$ap Rocky (sexta-feira, 0h45), promete ser um dos nomes mais enunciados na noite de sexta-feira, ou não fosse ele um ícone da moda, expondo ritmos lentos e pesados com algo de psicadélico, entrecortados por motivos melódicos reconhecíveis, enquanto discorre sobre os efeitos da fama em rimas codificadas. Uma estratégia não muito diferente daquela que é adoptada pelo também rapper Vince Staples (sexta-feira, 22h15), apesar de este ser mais diversificado em termos estilísticos.
Novidades e nem por isso
A cultura hip-hop transformou-se na última década e meia na maior força da indústria da música. Há uns anos, era-o pela criatividade. Agora, é-o essencialmente pelos números. A verdadeira criatividade está naquilo para o qual não existe nome, e no Primavera vai ser possível ouvir alguns das suas mais singulares manifestações. É o caso do venezuelano Arca (sábado, 2h30), colaborador de Björk nos últimos anos, mas autor de três inclassificáveis álbuns a solo que se repercutem em espectáculos em que uns vêem bizarria e outros uma admirável fragilidade. É um pouco por aí que se move também o universo da sueca Fever Ray (sexta-feira, 0h), que lançou no ano passado o seu segundo álbum de electrónica oblíqua, depois do fim dos The Knife, umas das aventuras mais imprescindíveis para perceber a pop contemporânea.
Em terrenos também indefiníveis se move o alemão Nils Frahm (sábado, 23h40), capaz de com o seu piano aludir simultaneamente à música clássica e ao pulsar entorpecido dos clubes nocturnos, como se pode ouvir no seu excelente e último álbum, All Melody (2018), o mesmo sucedendo com a americana Kelsey Lu (sábado, 20h45), que com guitarra, violoncelo e voz promete fazer sonhar quem se mostrar disponível para a sua música encantatória.
Quem quiser testemunhar como é possível arquitectar um som digital alienígena com uma voz a pairar que consegue ser clara, envolvente e frágil, emanando harmonia, não pode perder a cantora americana Kelela (sábado, 18h50) ou a sua compatriota Abra (sábado, 23h30) que, apesar de menos conhecida, tem argumentos para a renovação do R&B, ou ainda as irmãs Ibeyi (sexta-feira, 20h45), que se movem pelos terrenos movediços de um neo-pop-jazz. O mesmo desejo de reinvenção, neste caso do jazz-funk, se sente no imprevisível Thundercat (sexta-feira, 23h30), ou no caso da pop, nos multinacionais Superorganism (sexta, 22h), exemplo de sentido lúdico.
Para uma mistura de seriedade e reinação haverá que contar com um dos maiores trovadores do nosso tempo, Father John Misty (quinta-feira, 20h25), que acaba de lançar o novo God’s Favorite Customer. Para doses de seriedade rock, com profundidade e evocação de uma América perdida, todas as atenções viradas para os excelentes War On Drugs (sábado, 23h40), para os também americanos Grizzly Bear (sexta-feira, 20h50), ou ainda para Amen Dunes (sexta-feira, 18h), que vem apresentar um admirável álbum novo, Freedom.
Carreiras consolidadas pelas diversas colorações do rock também serão postas à prova nos concertos das veteranas The Breeders (sexta-feira, 19h50), dos canadianos Wolf Parade (sábado, 21h45) ou dos escoceses Mogwai (sábado, 0h45). Formações veneradas na actualidade e conotadas com o rock alternativo também não faltarão, como os escoceses The Twilight Sad (sexta-feira, 19h15), os ingleses Idles (sexta-feira, 17h45) e Public Service Broadcasting (sábado, 20h30), o americano Ezra Furman (sexta-feira, 20h55) ou à frente deles todos os psicadélicos Unknown Mortal Orchestra (sexta-feira, 1h). Para aproximações mais extremas ao rock valerá a pena estar atento às incursões pelas margens do metal dos nova-iorquinos Zeal & Ardor (sexta-feira, 18h50), ao punk dos californianos Flat Worms (sábado, 19h15) ou à energia incontida dos Starcrawler (quinta-feira, 19h15).
Os corpos em busca de sonoridades dançantes poderão abandonar-se ao som dos ingleses Jamie xx (quinta-feira, 0h25) ou Four Tet (sexta-feira, 23h40). A representar a diversidade do panorama actual em Portugal estarão o psicadelismo dos Black Bombaim, as canções românticas de Luís Severo ou a música de dança de Lycox, Moullinex ou Kitten. A abrir o festival, esta quinta-feira às 17h30, o funaná dos Fogo Fogo e as canções emocionantes dos Foreign Poetry, londrinos de coração português, com álbum de estreia a editar para depois do Verão na lisboeta Pataca Discos.
E apesar da profusão de nomes e de grupos aqui mencionados que ao longo dos três dias evoluirão por quatro palcos diferenciados, é bem possível que os concertos para mais tarde recordar possam provir de outras figuras como Vagabon, Rhye, Metá Metá, Mavi Phoenix, Jay Som ou Floating Points. É isso. No Nos Primavera Sound deste ano, o difícil vai ser mesmo escolher, desde que a meteorologia ajude.