Facebook partilhou dados de utilizadores com marcas de telemóveis
Aparelhos de fabricantes como a Apple, a Samsung e a Microsoft recolhiam informação ao abrigo de um programa de parcerias. Rede social garante que impôs regras apertadas.
É mais um caso a lançar suspeitas sobre a forma como o Facebook lida com a informação das pessoas. Uma investigação do jornal The New York Times revelou que a rede social permitiu que fabricantes de telemóveis, entre os quais a Apple e a Samsung, acedessem a dados dos utilizadores e dos amigos, por vezes contrariando as respectivas definições de privacidade. O Facebook reconheceu ter feito parcerias com aquelas empresas, mas disse discordar das conclusões tiradas pelo jornal e defendeu ter imposto regras apertadas.
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É mais um caso a lançar suspeitas sobre a forma como o Facebook lida com a informação das pessoas. Uma investigação do jornal The New York Times revelou que a rede social permitiu que fabricantes de telemóveis, entre os quais a Apple e a Samsung, acedessem a dados dos utilizadores e dos amigos, por vezes contrariando as respectivas definições de privacidade. O Facebook reconheceu ter feito parcerias com aquelas empresas, mas disse discordar das conclusões tiradas pelo jornal e defendeu ter imposto regras apertadas.
Ao longo da última década, o Facebook permitiu que pelo menos de 60 marcas de telemóveis e tablets acedessem a informação dos utilizadores, que servia para integrar alguns aspectos da rede social nos respectivos aparelhos. Isto era útil sobretudo numa altura em que o uso das lojas de aplicações ainda não se tinha massificado e muitas pessoas não tinham instalada a aplicação do Facebook. Em vez disso, os fabricantes procuravam dar aos utilizadores as funcionalidades da rede social – como botões de “gosto”, respostas a pedidos de amizade ou as últimas publicações feitas pelos amigos – através de aplicações próprias que vinham pré-instaladas nos aparelhos e através de funcionalidades do sistema operativo, como as notificações.
Segundo o New York Times, estes fabricantes conseguiam aceder a informação dos amigos do utilizador e dos amigos destes, o que significa que o telemóvel de uma pessoa que tivesse algumas centenas de amigos no Facebook poderia chegar aos dados de muitos milhares de pessoas. Entre esta informação estavam o estado civil, religião e os eventos em que tencionavam participar. Os dados eram obtidos mesmo quando os utilizadores tinham configurado o Facebook para que a informação não fosse partilhada com aplicações de terceiros – é o tipo de configuração que evita que os dados sejam acessíveis por aplicações como os jogos ou os muitos questionários que pululam pela rede social. A questão é que o Facebook considerava aquelas empresas como parceiros – e não como aplicações de terceiros – o que significa que tinham um acesso privilegiado aos dados. Porém, podiam apenas replicar funcionalidades do Facebook, em vez de poderem criar aplicações completamente diferentes.
Entre as empresas que tinham (ou que ainda têm) este tipo de acesso estão algumas das maiores multinacionais tecnológicas do mundo: a Samsung e a Apple, que são as duas maiores fabricantes de smartphones; a Amazon, que produz tablets de marca própria e também já teve um telemóvel no mercado; a Microsoft, que desenvolveu o sistema operativo para telemóveis Windows Phone e que comercializou vários modelos de smartphones (alguns sob a marca Nokia); e a BlackBerry, a empresa que foi outrora um peso-pesado no sector e que era conhecida tanto pelos teclados físicos, como pelas funcionalidades de segurança e privacidade. Tanto o Windows Phone como os BlackBerry, por exemplo, tinham uma funcionalidade que permitia ver a informação, as fotografias e as publicações dos amigos sem ter de instalar a aplicação do Facebook. O acesso era feito através daquilo a que se chama uma API, que é uma forma habitual de uma plataforma informática dar a terceiros acesso aos dados que armazena. Algumas das empresas dizem que não armazenaram a informação e que esta ficou apenas nos telemóveis dos utilizadores.
A notícia voltou a trazer à tona os problemas da rede social com questões de privacidade, numa altura em que ainda não arrefeceu o escândalo do uso indevido de dados pela consultora política Cambridge Analytica e quando estão recentes na memória do público as muitas desculpas dadas por Mark Zuckerberg no Congresso americano e no Parlamento Europeu.
A publicação do artigo suscitou também uma resposta do Facebook, com o título “Por que discordamos do New York Times”. A empresa lembrou que, com a popularidade das aplicações para iPhone e telemóveis Android, o acesso através de API perdeu interesse e que 22 das parcerias foram canceladas. “Os parceiros assinaram acordos que preveniam que a informação do Facebook das pessoas fosse usada para outros propósitos para além de recriar experiências semelhantes ao Facebook”, disse a empresa. "Não estamos a par de nenhum abuso por parte destas empresas.”
O Facebook também se esforçou para distanciar este caso do da Cambridge Analytica, um escândalo de privacidade que surgiu depois de um ano e meio em que o Facebook esteve sob múltiplas críticas pela forma como lidou com anúncios políticos durante as eleições presidenciais dos EUA, e com o discurso de ódio e extremista que é publicado na plataforma. Em Março, uma outra investigação jornalística (publicada pelo New York Times e pelo britânico The Observer) divulgou que a empresa de consultoria política, que trabalhou com a campanha de Donald Trump, teve acesso indevido a dados de 87 milhões de utilizadores. A informação foi depois usada para criar perfis de eleitores e poderá ter servido para acções de propaganda direccionada (a empresa, que entretanto abriu falência, nega ter agido ilegalmente).
O acesso àqueles dados foi feito através de uma aplicação para o Facebook criada por um académico. A revelação acabou por levar Mark Zuckerberg a responder a questões perante os congressistas americanos. Aí, entre vários pedidos de desculpa, afirmou ter sido um erro o Facebook ter acreditado na informação da Cambridge Analytica de que os dados tinham sido apagados. “Não devíamos ter confiado na palavra deles”, reconheceu.