A alma vã de Welket Bungué

O actor nascido na Guiné lançou uma websérie chamada Vã Alma, centrada num bairro fictício e em cinco personagens afro-descendentes.

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O Bairro da Nossa Senhora, que fica algures entre Camarate e Sacavém, não existe na realidade. É lá que se passa Vã Alma, uma nova websérie criada e realizada por Welket Bungué que se centra em cinco personagens do bairro e acompanha os preparativos de um assalto. Os quatro episódios, todos com menos de dez minutos, foram disponibilizados no YouTube em Maio.

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O Bairro da Nossa Senhora, que fica algures entre Camarate e Sacavém, não existe na realidade. É lá que se passa Vã Alma, uma nova websérie criada e realizada por Welket Bungué que se centra em cinco personagens do bairro e acompanha os preparativos de um assalto. Os quatro episódios, todos com menos de dez minutos, foram disponibilizados no YouTube em Maio.

O autor é um actor que apareceu em filmes como Cartas da Guerra, de Ivo M. Ferreira, bem como a peça Moçambique, da mala voadora. Bungué nasceu na Guiné, cresceu na zona de Lisboa e no Alentejo e tem vivido no Rio de Janeiro. Agora está em Berlim, a protagonizar uma nova adaptação, realizada por Burhan Qurbani, de Berlin Alexanderplatz, o romance de Alfred Döblin que Rainer Werner Fassbinder transformou em série de televisão em 1980.

Foi a partir dessa cidade alemã que falou ao telefone com o P2. Bungué descreve a obra desta forma: “É uma série de realidade social, com histórias de cinco personagens afro-descendentes que já são de terceira ou quarta geração”, que atravessam “situações que são resultado da estrutura social em que vivemos”, sem grandes perspectivas de emprego ou de ganhar dinheiro.

O realizador quer mostrar "como morar fora do epicentro de uma capital tem implicações claras”. Por outro lado, pretende “humanizar estas personagens, mostrar que as decisões que tomam derivam do estrangulamento social”. As influências para a parte estética incluem filmes e séries brasileiros como Cidade de Deus, Cidade dos Homens, Era uma vez… ou Suburbia, mas também o português Zona J.

A realidade retratada não foi vivida na pele por Bungué, que cresceu perto da zona onde o bairro fictício se situa: “Deriva de situações que aconteceram ao meu lado, eu não estava directamente implicado nelas, mas observei-as ou tive conhecimento delas através de terceiros. Outras vêm da memória passada pelos meus pais quando chegámos a Portugal. Há muitos problemas que eles tiveram de encarar e resolver: questões de empregabilidade e organização para conseguir adquirir a nacionalidade, para ser justamente remunerado, não haver um planeamento de acordo com as necessidades que o país exige”, resume.

São quatro os protagonistas: Kanja Fria, interpretado por Bruno Mateus, que apareceu em Vai e Vem, de João César Monteiro, e tem trabalhado em televisão; Bonerouge, que é Mauro Hermínio, do Comicalate, que co-produziu, com a KUSSA de Bungué, a série; Chade, a mulher de Bonerouge, é Cleo Tavares, que foi a Cannes com Diamantino, de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt; Arriaga, que é Gio Lourenço, do Teatro GRIOT. Os actores reflectem “o caldo cultural e multiétnico que Portugal tem ao seu dispor” e não está “representado na ficção nacional” – e muito menos costuma ser escrito e realizado por afro-descendentes. Além destes, também há Bastien, que é o próprio Bungué.

Isto é todo um mundo: a história não começa e acaba em Vã Alma. Bastien, curta de Bungué centrada na personagem homónima, foi lançada antes, mas passa-se cronologicamente depois neste universo. E ainda não acabou. Outra curta, Arriaga, agora em pós-produção, contará o desfecho do assalto.