O passe mágico do PSOE
O PSOE propõe-se governar sozinho, dispondo de 84 deputados (em 350). O seu primeiro problema será “pagar a dívida” aos nacionalismos e ao Podemos.
Pedro Sánchez conseguiu um acto de magia: tirar o PSOE da quase irrelevância para retomar a iniciativa e colocar-se no centro do tabuleiro político. Por quanto tempo? Não se sabe. É uma inegável vitória pessoal. Escreve no El País Rubén Amón: “Obstinado, temerário, possibilista, o líder socialista regressou ao Parlamento para afastar Rajoy.”
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Pedro Sánchez conseguiu um acto de magia: tirar o PSOE da quase irrelevância para retomar a iniciativa e colocar-se no centro do tabuleiro político. Por quanto tempo? Não se sabe. É uma inegável vitória pessoal. Escreve no El País Rubén Amón: “Obstinado, temerário, possibilista, o líder socialista regressou ao Parlamento para afastar Rajoy.”
Que motivo levou a quase totalidade dos partidos a apoiar a moção de Sánchez, que lhe entregará o governo? Apenas a vontade de expulsar do poder o Partido Popular (PP). Na manobra, foram decisivos os votos dos nacionalismos periféricos. É um facto que no futuro será relevante.
Mariano Rajoy estava ferido de morte desde a sentença do caso Gürtel, que condenou o Partido Popular como agente da corrupção. Mas contava sobreviver algum tempo. Não lhe passava pela cabeça a “ingratidão” do Partido Nacionalista Basco. A iniciativa de Sánchez, que hoje parece óbvia, apanhou de surpresa os restantes partidos, que tinham outro calendário.
Há três semanas, uma sondagem da Metroscopia colocava o PSOE em quarto lugar, atrás do Cidadãos, do PP e do Podemos. Os socialistas pareciam “fora de jogo”, enquanto o Cidadãos, de Albert Rivera, emergia como alternativa ao PP. Com uma simples jogada, Sánchez capitaliza a vaga anti-PP e afirma-se como líder da oposição. Sustém a pressão do Podemos, que continua a querer hegemonizar a esquerda, e responde à ameaça do Cidadãos, tentando apresentá-lo como derradeiro apoiante de Rajoy. O Cidadãos quer eleições o mais depressa possível, enquanto o PSOE e o PP querem atrasar o voto. Nestes termos, Sánchez não podia negociar a moção com Rivera.
A manobra de Sánchez é muito mais ambiciosa: a moção coloca-o automaticamente no governo. Nos próximos meses, poderá tomar “medidas populares” que abririam o caminho para uma vitória nas próximas legislativas. O PSOE propõe-se governar sozinho, dispondo de 84 deputados (em 350). O seu primeiro problema será “pagar a dívida” aos nacionalismos e ao Podemos.
Uma longa agonia
Se pela Europa fora quase todos os partidos socialistas estão em crise ou declínio, o PSOE não escapa à regra. Mas em Espanha (tal como na Itália) as coisas são algo diferentes. O modelo bipartidário começou a desfazer-se com a emergência do Podemos e, logo a seguir, do Cidadãos. Nas eleições de 2011, o PP e o PSOE acumulavam 84% dos votos e 92% dos mandatos parlamentares. Hoje, há um parlamento “tetrapartidário”, sem alianças naturais e estáveis, o que concede aos pequenos partidos nacionalistas um poder de arbitragem na resolução das crises políticas.
“O PSOE é pilar do regime inaugurado em 1978”, gostavam de dizer os socialistas. Entretanto, perdeu 4,3 milhões de votos entre as eleições de 2008 e as de 2011 (vitória de Rajoy) e mais 1,5 milhões nas eleições de 2015 e 2016, em que registou o pior resultado da sua história.
O dado mais patente era o vazio de programa e a incapacidade de definir uma política de alianças para a era do pós-bipartidismo.
Em 2014, Sánchez foi eleito secretário-geral do partido como candidato do aparelho, apadrinhado pelos “barões” e, em particular, por Susana Díaz, a “baronesa da Andaluzia”. Tratou-se de afastar a candidatura de Eduardo Madina, que defendia um programa mais à esquerda. A maior qualidade de Sánchez era “a imagem de juventude”.
Perante o assédio do Podemos, faz sucessivas reviravoltas e perde o controlo dos acontecimentos. Em 2016, é destituído por uma manobra dos mesmos barões que o tinham cooptado. Recupera o partido nas primárias de 2017, exactamente contra Susana Díaz e o aparelho. Mas, desde então, foi incapaz de recuperar a iniciativa e chefiar a oposição.
Disse em 2017 Patxi López, também concorrente às primárias: “Não há risco de cisão mas de se cair na irrelevância.” Assim aconteceu. Chega agora o momento da inovação ou da magia. Ganhar as próximas eleições, não a partir da oposição mas do governo, por obra e graça dos malefícios do PP.
Uma sondagem de ontem (Yougov, para La Vanguardia) indiciava complicações. A grande maioria dos cidadãos quer o afastamento de Rajoy, mas 47% exigem eleições. Apenas 11% concordam que Sánchez governe com o programa que apresentou ontem no Parlamento.