Os grandes desafios da gestão desportiva nos dias de hoje
É necessário que um gestor desportivo saiba claramente quais são as características que se exige que reúna para que possa assumir essas funções. E que saiba ainda que pode ser pessoalmente responsabilizado, pela sociedade desportiva que administra.
As notícias que têm recentemente vindo a público relativamente ao futebol profissional colocam-nos, inevitavelmente, perante a seguinte questão: quais os grandes desafios que se colocam, actualmente, a um gestor desportivo? Esta questão encerra, como não pode deixar de ser, a seguinte: o que pode e, sobretudo, o que deve esperar-se de um gestor desportivo nos dias de hoje?
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As notícias que têm recentemente vindo a público relativamente ao futebol profissional colocam-nos, inevitavelmente, perante a seguinte questão: quais os grandes desafios que se colocam, actualmente, a um gestor desportivo? Esta questão encerra, como não pode deixar de ser, a seguinte: o que pode e, sobretudo, o que deve esperar-se de um gestor desportivo nos dias de hoje?
Com efeito, sobretudo no âmbito do futebol profissional, a realidade exige agora uma mudança de paradigma: se tradicionalmente se entendia, expressa ou tacitamente, que a aplicação das regras legais e dos princípios éticos aos clubes e sociedades desportivas deveria ser sempre orientada por um princípio de “tolerância” colectiva relativamente às situações de incumprimento (incluindo, inexplicavelmente, a das entidades e credores públicos), é hoje claro que essa era chegou ao fim – e, sobretudo, que a própria sobrevivência do futebol profissional passa pelo desenvolvimento da sua capacidade de adaptação às regras. Na gestão desportiva moderna é fundamental a adopção, por parte de todos os agentes envolvidos, de princípios que assegurem que, pelo menos em termos societários, financeiros e éticos, são respeitadas as regras de bom governo a que estão agora sujeitas todas as instituições que têm um papel mais ou menos relevante na economia.
Uma vez que na lei desportiva se determina, actualmente, que apenas as sociedades desportivas podem participar em competições profissionais (deixando de ser possível a participação directa dos clubes desportivos), o ponto de partida consistirá, desde logo, em assegurar a adequação do perfil do gestor desportivo às exigências legais relativas aos gerentes e administradores de qualquer sociedade: eles devem imperativamente ter a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções, as quais devem exercer obedecendo a um elevado padrão de diligência. Estas exigências, que mais não visam do que assegurar uma boa administração da empresa, dão-nos conta de que a gestão das sociedades desportivas tem de passar a ser norteada pelos princípios e pelos deveres, de cuidado e de lealdade, que são observados na gestão de qualquer outra empresa, o que passa necessariamente pela profissionalização dos seus gestores – o que tradicionalmente não acontece no âmbito dos clubes (convindo aqui salientar que o facto, frequente, de o presidente da direção de um clube desportivo acumular essa função com a de gestor executivo da sociedade por aquele constituída não constituirá então, em regra, solução adequada à boa governação da sociedade desportiva).
Neste âmbito (como, de resto, em tantos os outros), a formação de todos aqueles a quem é confiada, de alguma forma, a gestão desportiva, assume um papel muito relevante (o que é actualmente reconhecido pelas instituições que promovem e organizam o futebol profissional, cada vez mais activamente envolvidas nesse tipo de iniciativas). É necessário que um gestor desportivo saiba claramente quais são as características que se exige que reúna para que possa assumir essas funções. E que saiba ainda que pode ser pessoalmente responsabilizado, pela sociedade desportiva que administra e, eventualmente, por qualquer credor da sociedade, se não exercer essas funções nos termos que lhe são impostos pela lei e, com isso, causar danos à sociedade ou a terceiros.
Finalmente, mas não menos importante: caberá ao bom gestor desportivo, devidamente (in)formado, a hábil tarefa de exercer uma gestão empresarial necessariamente profissional e eficiente, no estrito respeito pelas regras da boa governação, sem deixar morrer, em si e em todos os que se ligam ao fenómeno desportivo, a chama que o alimenta.
Coordenadora executiva da Summer School on Sports Governance 2018 – Universidade Católica Portuguesa (UCP)/ Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP); coordenadora científica da Pós-Graduação em Organização e Gestão no Futebol Profissional – UCP/LPFP; autora da obra Sociedades Desportivas