Costa nega incompatibilidades ou interferências de Siza Vieira na energia
Primeiro-ministro teve que defender o seu ministro-adjunto do PSD e do Bloco por causa da empresa familiar que manteve quando assumiu o cargo, da sua relação com a China Three Gorges e com as renováveis.
António Costa não encontra “incompatibilidades” nem conflitos de interesses na atitude de Pedro Siza Vieira, por ter criado uma empresa imobiliária familiar antes de entrar para o Governo e de se ter mantido como gerente já quando já estava em funções no executivo. Nem por ter assessorado a China Three Gorges antes de ser ministro e depois ter trabalhado sobre a regulação do sector energético. O primeiro-ministro também garantiu ontem ao Parlamento que o seu ministro Adjunto “não teve qualquer interferência” na mudança do sentido de voto do PS, que primeiro aprovou e depois acabou por chumbar a proposta do BE no Orçamento do Estado de 2018, para a criação de uma contribuição sobre os lucros das renováveis.
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António Costa não encontra “incompatibilidades” nem conflitos de interesses na atitude de Pedro Siza Vieira, por ter criado uma empresa imobiliária familiar antes de entrar para o Governo e de se ter mantido como gerente já quando já estava em funções no executivo. Nem por ter assessorado a China Three Gorges antes de ser ministro e depois ter trabalhado sobre a regulação do sector energético. O primeiro-ministro também garantiu ontem ao Parlamento que o seu ministro Adjunto “não teve qualquer interferência” na mudança do sentido de voto do PS, que primeiro aprovou e depois acabou por chumbar a proposta do BE no Orçamento do Estado de 2018, para a criação de uma contribuição sobre os lucros das renováveis.
Costa teve de vestir o papel de defensor de Siza Vieira no debate quinzenal perante o PSD e o Bloco de Esquerda. Catarina Martins questionou-o directamente sobre se Siza “teve interferência” no caso da taxa, que é um “assunto ainda pouco explicado”. Costa garantiu: “Não, não teve qualquer interferência.” Porém, a verdade é que o gabinete do ministro admitiu ao Expresso, em Janeiro, que Siza Vieira recebeu, em Novembro, uma mensagem de preocupação do presidente da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN), António Sá da Costa, sobre o corte nas receitas das empresas do sector então proposto pelo BE.
Um caso em que a EDP também seria prejudicada, tal como as sociedades Iberwind e Finerge, que foram vendidas a investidores estrangeiros nos últimos anos em processos assessorados pela sociedade de advogados Linklaters — da qual Pedro Siza Vieira foi sócio durante 16 anos. Na altura, o gabinete de Siza Vieira afirmava ao semanário que o ministro não teve envolvimento nos negócios da Iberwind e da Finerge e que a Linklaters “prestou pontualmente serviços à Iberwind após a venda desta”. Mas o gabinete do ministro fazia a revelação que agora ganha grande relevância sobre a preocupação da APREN. Já antes, a 1 de Dezembro de 2017, Siza Vieira, que tinha tomado posse como ministro em Outubro, deu uma entrevista à SIC Notícias em que defendeu a posição do Governo contra a taxa proposta pelo BE.
O PÚBLICO questionou o gabinete de Siza Vieira sobre esta questão e obteve esta resposta: “O sr. primeiro-ministro falou hoje [ontem] sobre o assunto e disse o que tinha a dizer. Não há mais comentários da nossa parte.”
O caso Siza Vieira foi levantado pelo PSD no debate: Fernando Negrão levou uma longa lista de constatações e de perguntas sobre as atitudes e decisões do ministro Adjunto e levou a discussão para o plano ético.
Sobre a acumulação do cargo de ministro e de gerente de empresa, que Siza Vieira — jurista de profissão — disse não saber que era ilegal, Costa alegou que “foi um lapso”, que acontece a todos — até a si aconteceu recentemente, com a actualização da declaração de património no Tribunal Constitucional (TC), por causa da venda de uma casa em Lisboa —, e vincou que, assim que o ministro “detectou que havia incompatibilidade, renunciou ao cargo de gerente”. “O ministro respondeu com a franqueza de que quem não deve não teme.”
Negrão criticou o “facilitismo” de Costa e desejou que o TC tire as “devidas consequências” do “lapso” do ministro. O social-democrata não desistiu de questionar a ética do governante e quis saber se o pedido de escusa de intervir em temas da energia no dia da OPA do consórcio chinês sobre a EDP não chegou com sete meses de atraso e se não devia ter sido outro governante a tratar de questões da energia nos últimos meses. Também lembrou que Siza integrou a estrutura de missão que sugeriu alterações ao Código de Valores Mobiliários que facilitaram esta OPA.
Costa chamou a si as duas responsabilidades: a da alteração a esse código para promover o investimento estrangeiro, e a da escolha de Siza para coordenar uma discussão interministerial do “quadro regulatório do sector energético. E elogiou o ministro por ter “amortizado” a quota na Linklaters ao entrar no Governo, algo a que a lei nem o obrigava.
Para além de querer saber qual o papel de Siza Vieira na questão da taxa das renováveis, Catarina Martins insistiu no tema da energia pela vertente dos preços para os consumidores. Tendo em conta que a Procuradoria-Geral da República disse que o despacho de Manuel Pinho [sobre a forma de cálculo dos contratos das rendas da energia] é nulo, a bloquista quis saber se o Governo o vai anular e fazer repercutir isso no preço da electricidade, adiantando que permitiria baixá-lo em 7%. “O que é mais importante: é a palavra de Manuel Pinho ou a palavra deste Governo em baixar a conta da electricidade?", desafiou.
A questão “não é quem assinou o despacho” mas sim a consequência legal, replicou Costa furtando-se a responsabilidades: “Se a PGR considerou que é nulo, tem bom remédio, que é promover a declaração de nulidade por parte do tribunal.” Ao Governo, vincou, “compete obedecer à lei”.