Irão põe o destino do acordo nuclear nas mãos da União Europeia
No final de reuniões com comissário europeu da Energia, os responsáveis iranianos foram claros: ou Bruxelas encontra uma forma de contornar as sanções americanas, ou o Irão "terá luz verde para fazer o que quiser".
A três meses do regresso em força das sanções norte-americanas contra o Irão, o Governo do país deixa um aviso à União Europeia: se o bloco não encontrar uma forma de ajudar as empresas ocidentais a contornarem essas sanções, o Irão "terá luz verde para fazer o que quiser".
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A três meses do regresso em força das sanções norte-americanas contra o Irão, o Governo do país deixa um aviso à União Europeia: se o bloco não encontrar uma forma de ajudar as empresas ocidentais a contornarem essas sanções, o Irão "terá luz verde para fazer o que quiser".
A mensagem, dita desta ou de outras formas, foi transmitida ao comissário europeu da Energia, o espanhol Miguel Arias Cañete, pelo ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Mohammad Javad Zarif, e pelo vice-presidente do país, Ali Akbar Salehi, responsável pelo programa nuclear.
Cañete esteve este fim-de-semana no Irão para garantir ao Governo do país que a União Europeia cumprirá a sua parte do acordo sobre o programa nuclear iraniano assinado em 2015, mesmo depois de os EUA se terem retirado, no dia 8 de Maio.
"Dissemos aos nossos amigos iranianos que, enquanto eles cumprirem o acordo, os europeus também respeitarão o seu compromisso. E eles disseram a mesma coisa", disse Arias Cañete no final do encontro com Ali Akbar Salehi.
Do lado iraniano, a mensagem não poderia ser mais clara: "Se o outro lado continuar a cumprir as suas promessas, nós também as cumpriremos. Esperamos não chegar a um ponto em que teremos de regressar à pior opção", disse o vice-presidente iraniano, sugerindo a possível retoma do programa com vista à produção de armas nucleares.
O ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Mohammad Javad Zarif, foi mais concreto na sua mensagem, amarrando o cumprimento do acordo pelo seu país à necessidade de a União Europeia se esforçar mais para o manter vivo: "Com a retirada da América, as expectativas do Irão em relação à UE aumentaram no sentido de se manterem os ganhos proporcionados pelo acordo, e na actual situação o apoio político europeu não é suficiente", disse Zarif, citado pela agência iraniana IRNA.
Em causa está a possibilidade de a Administração Trump punir as empresas ocidentais que insistirem em fazer negócios com o Irão após o regresso das sanções, marcado para o dia 8 de Agosto. Algumas das maiores empresas, como a gigante francesa da energia Total SA, anunciaram que vão desistir de negócios no valor de milhares de milhões de euros se não tiverem garantias de que não serão prejudicadas num mercado financeiro global dominado pelos EUA.
São essas declarações de interesses por parte de algumas multinacionais que levaram o ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão a dizer que a União Europeia tem de fazer mais: "O anúncio da possível saída do Irão de grandes empresas europeias não é consistente com o compromisso da União Europeia de se manter no acordo", sublinhou Zarif.
A União Europeia encontra-se numa situação muito delicada. Por um lado, tem de encontrar uma solução para que o Irão não seja prejudicado em termos financeiros pelo abandono do acordo pelos EUA; por outro lado, essa solução deverá ter de passar por compensar as grandes empresas europeias por eventuais punições norte-americanas, o que agravaria ainda mais a já difícil situação comercial entre os dois lados do Atlântico.
A UE pode estimular pequenas e médias empresas sem grande presença no mercado norte-americano a apostarem no mercado iraniano, mas essa estratégia, juntamente com os negócios milionários entre o Irão e grandes empresas chinesas e russas, poderá não ser suficiente para compensar a saída dos EUA.
E, se isso não acontecer, a pressão interna sobre o Governo iraniano para denunciar o acordo crescerá ainda mais, como lembrou o vice-presidente do Irão: "Infelizmente, por causa das interferências negativas dos EUA, ainda não conseguimos colher os frutos do acordo. A opinião pública já não apoia tanto o acordo como apoiou no passado, e se o outro lado não cumprir, continuaremos a perder o apoio do povo."
Do lado do representante europeu ficou a promessa de que Bruxelas fará tudo para manter o acordo vivo, ainda que "haja dificuldades óbvias por causa das sanções". Mas Miguel Arias Cañete deu a entender que a União Europeia ainda deposita esperanças no diálogo com os EUA, "um parceiro-chave da União Europeia e um aliado".