Reduzir vagas no superior só em Lisboa e Porto pode não chegar

Corte de 5% nas vagas das universidades e politécnicos de Lisboa e Porto não é a medida ideal, mas tem virtudes, defende o novo líder dos politécnicos. Prestes a poderem ministrar doutoramentos, as instituições temem agora a “inconstância” das avaliações da FCT, que vão passar a ser determinantes para a aprovação dos cursos.

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Pedro Dominguinhos é o novo presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos Rui gaudêncio

Pedro Dominguinhos, 47 anos, foi o vice-presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) no último ano e meio e homem-forte do sector nas negociações orçamentais com o Governo. Também representou os politécnicos junto dos peritos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que estiveram a avaliar o sistema de ensino superior e ciência nacional e, por isso, foi sem surpresa que o presidente do Instituto Politécnico de Setúbal acabou por ser escolhido para liderar o CCISP. Tomou posse na quarta-feira.

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Pedro Dominguinhos, 47 anos, foi o vice-presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) no último ano e meio e homem-forte do sector nas negociações orçamentais com o Governo. Também representou os politécnicos junto dos peritos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que estiveram a avaliar o sistema de ensino superior e ciência nacional e, por isso, foi sem surpresa que o presidente do Instituto Politécnico de Setúbal acabou por ser escolhido para liderar o CCISP. Tomou posse na quarta-feira.

O CCISP foi o único organismo do sector a apoiar formalmente a redução de 5% das vagas nas instituições de ensino superior de Lisboa e do Porto anunciada pelo Governo, como forma de levar mais alunos para o interior do país. Por que razão é uma boa medida?
Temos um problema sério em Portugal de falta de coesão territorial e há uma grande concentração de estudantes em determinadas instituições. É preciso responder a isso. Em Economia, há políticas de first best e políticas de second best. Esta é uma política de second best. A medida mais adequada seria fazer com que as pessoas não deixassem as regiões do interior, mas isso é difícil no curto prazo. No CCISP, tivemos três reuniões sobre o tema, porque é necessário maturar as posições e criar consensos. O nosso parecer foi aprovado por unanimidade.

Era benéfico que essa medida pudesse ter um apoio mais claro por parte das universidades?
Não me pronunciarei sobre o funcionamento das universidades. O que eu digo é que existe um conjunto de assuntos em que a conjugação de posições de todo o ensino superior tem sido benéfica. Sabemos, naturalmente, que este não é um assunto pacífico. Esta é uma medida concreta. Concordamos todos com a coesão territorial desde que as medidas não nos batam à porta. Nós dissemos que, genericamente, concordávamos com a ideia, mas fizemos uma proposta ao ministro para a criação de três tipologias de regiões: reduzia-se [o numerus clausus] em Lisboa e Porto, aumentava-se no interior e mantinha-se nas outras instituições do litoral.

Essa solução não está no despacho, mas consta do preâmbulo como uma possibilidade para futuro...
A medida [reduzir vagas só em Lisboa e Porto] pode não ter o alcance desejado. Existem outras instituições no litoral, quer universidades quer politécnicos, que ao aumentarem as vagas 5% [como pode acontecer com o despacho publicado há dias pelo Governo] podem atrair esses estudantes.

Não será só o ensino superior a resolver o problema do interior do país. Os problemas complexos têm de ser abordados com medidas da mais variada índole. As universidades e os politécnicos são as únicas instituições que atraem jovens para essas regiões. E, a par das instituições de saúde, são as instituições mais qualificadas em termos de recursos humanos. Claro que há outras medidas, como a atracção de investimento. Neste momento, há um conjunto de empresas tecnológicas que se estão a instalar no interior porque há ali instituições de ensino superior.

O Governo vai autorizar os politécnicos a ministrar doutoramentos, mas também haverá regras mais apertadas para a sua aprovação, como a necessidade de as instituições terem centros de investigação classificados como “muito bons” ou “excelentes”. Foi uma solução equilibrada?
Conseguimos demonstrar aos peritos da OCDE que existem condições para que os politécnicos possam outorgar o grau de doutor. O caminho ainda tem de ser trilhado e vai ser necessário alterar a Lei de Bases do Sistema Educativo e o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior. É importante que os partidos possam colocar essa questão nas suas propostas para as próximas eleições.

A mudança não acontece antes?
Não nos parece exequível que, até ao final da legislatura, exista qualquer alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo. Nós sempre dissemos que este projecto de doutoramentos é para dez anos, o que nos permite uma preparação acrescida.

Voltando à exigência da avaliação dos centros de investigação...
Compreendemos essa exigência. Mas também sabemos que a avaliação das unidades de investigação não tem sido regular. Tivemos recentemente um processo que a comunidade científica foi unânime em considerar mau. O nosso receio é mais da inconstância do processo de avaliação pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.

Já recebeu uma resposta do Governo relativamente à forma como devem processar-se as progressões salariais dos professores?
Ainda não. A Inspecção-Geral de Finanças está a enviar a cada instituição um pedido para identificar as necessidades de financiamento até sexta-feira [hoje]. Continua sem haver uma clarificação [sobre quem são os professores a quem se aplicam as progressões, agora que o tempo de serviço foi descongelado] e, por aquilo que nos é dado a entender, o Governo não vai clarificar.

Que impacto financeiro é que pode ter nos politécnicos?
Os dados apurados rondam os 6 milhões de euros, em velocidade de cruzeiro. Não é pago tudo em 2018. Genericamente, estamos a falar de cerca de um terço em 2018 [dois milhões de euros]. O remanescente será em 2019.

No final do ano passado houve um braço-de-ferro entre as instituições de ensino superior e o Ministério das Finanças a propósito dos reforços orçamentais. Este ano, este braço-de-ferro vai repetir-se?
Eu espero que não chegue ao final do ano. No ano passado, as Finanças pagaram apenas 69% dos reforços orçamentais porque é essa a proporção da comparticipação do Orçamento do Estado nos orçamentos das instituições. Nós aceitamos essa situação numa tentativa de desbloquear a situação, mas não pode ser este o princípio. Imaginemos que o Governo decide aumentar os salários dos funcionários públicos em 3%. Isto significa que as instituições têm de encontrar sempre receitas próprias de 30% para fazer face a medidas políticas. Não é possível continuarmos com esta metodologia.

Qual é o reforço necessário nos politécnicos até ao final do ano?
Para além dessas questões, há a eventual necessidade de reforço do Programa de Regularização dos Precários da Administra Pública e o ingresso na carreira decorrente do regime transitório [do estatuto da carreira dos docentes politécnicos]. Serão necessários, ao todo, entre três e quatro milhões de euros.
Continua a achar que foi uma boa ideia assinar os contratos de confiança para esta legislatura?
A assinatura de um contrato pressupõe a confiança em ambas as partes. Nós não assinámos o contrato com o Ministério da Ciência, assinámos com o Governo. Não é desejável que gastemos energias a discutir quando é que vem o dinheiro, se é 1,8 milhões ou 1,7 milhões.

Mas essa tem sido uma batalha anual.
Tem sido. Estava na expectativa que neste momento aquilo que já é claro, fosse já transferido.