Revitalizar o interior passa pelos Serviços Florestais
Enquanto não for reposta uma Autoridade Florestal Nacional a política florestal não passa de retórica.
Começa a esboçar-se um amplo movimento no sentido de se olhar para o interior do país como um território imprescindível ao equilíbrio económico, social, ecológico e cultural do todo do território nacional. Veremos no que vai dar.
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Começa a esboçar-se um amplo movimento no sentido de se olhar para o interior do país como um território imprescindível ao equilíbrio económico, social, ecológico e cultural do todo do território nacional. Veremos no que vai dar.
Do interior têm sido banidas juntas de freguesia, centros de saúde, postos dos CTT, escolas, isto é tudo quanto podia representar o Estado nas áreas de baixa densidade (nome rebuscado para indicar o interior...).
Há uma medida que pode ter impacto não indirecto mas directo na revitalização do interior do nosso país: a reconstituição duma Autoridade Florestal Nacional, vulgo Serviços Florestais, que a falta de clarividência, de sentido de Estado e de noção exacta das necessidades do território dos nossos políticos das duas últimas décadas fez extinguir.
A reinstalação de uma rede de casas florestais habitadas por guardas florestais, cuidadosamente distribuídas pelas zonas do interior mais susceptíveis a incêndios florestais, contribuirá decisivamente para trazer gente às zonas mais desertificadas em termos de ocupação humana, mas onde continuam a existir pequenos casais e aldeias.
Hoje em dia a quadrícula de casas florestais já não precisava de ser tão densa quanto era há 50 anos; com a videovigilância uma casa de guarda florestal pode supervisionar áreas muito maiores, detectando com antecedência qualquer sinal de fumo que surja no oriente. Essa é a grande contribuição dos guardas florestais para o tempo dos fogos, mas a sua função não se limitava a essa época do ano – eles vigiavam as matas todo o ano, interpelavam os proprietários para fazerem as limpezas, controlavam os cortes de arvoredo e obrigavam quem os realiza a extrair todo o material (cascas, ramos, folhagem) para fora da mata.
Claro que a prevenção atempada e o combate imediato aos primeiros sinais de fogo prejudicam os grandes meios privados de combate aos incêndios, e há por aí mal-intencionados que dizem ser essa uma das razões para se ter acabado com os Serviços Florestais... Nem quero acreditar, mas lá que o combate aos incêndios florestais é um grande negócio público-privado, lá isso é.
A reposição das casas de guardas deverá hoje em dia privilegiar a proximidade com povoações existentes, casais isolados e áreas de habitação dispersa, pois isso não só dará mais segurança às populações desses locais, como para os próprios guardas e famílias será vantajoso terem a proximidade de mais população.
Mas a orgânica local e regional dos Serviços Florestais também ajudará a revitalizar o interior; são as Administrações e as Circunscrições Florestais, que supervisionam as primeiras, que originam serviços públicos em pequenas terras do interior e suscitam a criação de empregos.
Como já foi dito noutras ocasiões – mas nunca cansa repetir –, Portugal deve ser o único país do mundo com área florestal significativa que deixou de ter um organismo dedicado à gestão da área e um Corpo de Guardas especializados nessa gestão, idiossincrasia dos nossos abalizados políticos em matéria florestal!
Percebe-se que este Governo resista a dar a mão à palmatória, pois o PS tem responsabilidades na extinção dos guardas florestais e no seu envio para a GNR; e quando o anterior governo PSD/CDS por sua vez extinguiu os Serviços Florestais e criou ”o aborto” chamado ICNF, houve sectores do PS que devem ter exultado e batido palmas; tantas reversões que um Governo que se diz de esquerda tem feito das políticas da direita, só nesta matéria que afecta as florestas e o Ambiente estão todos de acordo. Estranho, não? Como estranho é que a esquerda se esqueça, como dizia há dias Rui Tavares, das suas raízes libertárias, ecológicas e cosmopolitas, e apenas tenha andado preocupada a exigir reversões das pensões e dos salários (uma coisa não devia fazer esquecer a outra).
É preciso criar cursos para a formação de guardas florestais, com um ensino não só teórico mas também prático e ainda há antigos Administradores Florestais em serviço que podem colaborar e até alguns, já reformados, pelo que eu conheço do “amor à camisola” não desdenhariam voltar a dar o seu contributo.
Podem os governos, este ou o que vier a seguir, continuar a proclamar reformas e leis inovadoras, mas havemos todos de chegar à conclusão, à custa de sacrifícios do país, que enquanto não for reposta uma Autoridade Florestal Nacional a política florestal não passa de retórica. Já repararam que agora, quanto a incêndios e a floresta, praticamente só se fala da Administração Interna, deixou de se falar nos agentes que deviam ser os primeiros a ver com a matéria, que são os técnicos florestais e a sua organização?...