Vital Moreira responde a Pedro Nuno Santos, que respondia a Augusto Santos Silva

O constitucionalista considera que a "geringonça" teve um “preço político” para o PS e que a retoma económica se deve sobretudo ao governo anterior e à conjuntura. A discussão ideológica continua a aquecer os motores do congresso da Batalha.

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Vital Moreira diz que o que "salvou" o PS foi não ter governado durante a troika Sérgio Azenha

A discussão sobre o posicionamento estratégico e ideológico do PS continua a aquecer os motores do congresso da Batalha, ainda que não tanto como a questão socrática que se instalou nos últimos dias. Este domingo, foi Vital Moreira que veio fazer o seu statement político, respondendo a Pedro Nuno Santos, cujo artigo vinha, por seu lado, responder à terceira via defendida por Augusto Santos Silva.

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A discussão sobre o posicionamento estratégico e ideológico do PS continua a aquecer os motores do congresso da Batalha, ainda que não tanto como a questão socrática que se instalou nos últimos dias. Este domingo, foi Vital Moreira que veio fazer o seu statement político, respondendo a Pedro Nuno Santos, cujo artigo vinha, por seu lado, responder à terceira via defendida por Augusto Santos Silva.

Num post intitulado Geringonça: Uma história afeiçoada, publicado no seu blogue Causa Nossa, o constitucionalista e antigo eurodeputado socialista veio contestar a tese do secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares de que existe um governo maioritário. “Antes de mais, o acordo [com as esquerdas] não criou nenhuma 'solução de governo maioritária', nem trouxe o BE e o PCP 'para a esfera governativa', pois pelo menos o PCP faz questão de insistir que se trata de um governo minoritário e que não apoia o Governo”, escreve.

Por outro lado, lembra que, “em várias ocasiões, o Governo teve de beneficiar do apoio da direita contra os seus alegados aliados e noutras foi derrotado por uma aliança dos mesmos com a direita, numa 'geometria variável' típica dos governos minoritários”. 

Vital Moreira, que sempre foi contra a actual solução governativa, sublinha mesmo que o acordo à esquerda “cobrou um significativo preço político ao PS, na renúncia a parcelas importantes do seu programa eleitoral” como o imposto sucessório, o apoio fiscal ao rendimento dos trabalhadores com baixos salários ou a reforma eleitoral.

Mas é na análise aos resultados do governo que Vital Moreira é mais demolidor ao atribuir a recuperação económica às políticas que vinham do anterior executivo: “A retoma económica já vinha de trás, desde o final de 2013, e foi essencialmente puxada pela retoma económica europeia, pelo boom turístico e pela política monetária expansionista do BCE, pelo que teria existido, mais décima menos décima, qualquer que fosse o governo”.

Embora não rejeite o contributo da aliança à esquerda para a recuperação de rendimentos e direitos e reconheça que “a reversão mais rápida das medidas de austeridade proporcionou um aumento do poder de compra que ajudou a dinamizar a economia, induzindo um círculo virtuoso”, Vital Moreira insiste que não foi esse o ponto de viragem do ciclo económico. “Não foi o fim da austeridade que gerou o crescimento, mas sim o contrário: foi a retoma iniciada anteriormente na economia e no emprego que proporcionou as condições orçamentais para desactivar os cortes nos rendimentos e nas prestações sociais”, sublinha.

Para Vital Moreira, a actual solução governativa é irrepetível numa conjuntura menos favorável: “A geringonça revelou-se sobretudo uma solução conjuntural, limitada ao tempo das 'vacas gordas económicas', enquanto o excedente orçamental permite pagar os elevados custos da política de rendimentos imposta pelos parceiros no acordo, sem impossibilitar a política de consolidação orçamental”, escreve o constitucionalista.

Ainda em resposta a Pedro Nuno Santos, Vital Moreira rejeita o seu argumento de que foi a “geringonça” que "salvou o PS do destino de outros partidos europeus da mesma família política". Na sua opinião, o PS “salvou-se do desastre que atingiu outros partidos social-democratas” quando o Governo Sócrates foi derrubado nas urnas e o PS ficou “dispensado de gerir o penoso programa de assistência externa, tendo voltado ao Governo quando o 'trabalho sujo' já tinha sido concluído pela direita e a retoma da economia e do emprego já estavam em marcha”.

“Tivesse sido o PS a gerir o programa de austeridade, e teria sido punido nas urnas tão severamente como o foram outros partidos socialistas que não tiveram a mesma fortuna”, conclui.