Sem alternativas, ETA confirma a sua própria extinção
Há mais de seis anos que a via armada tinha sido abandonada, mas só agora é que os separatistas bascos confirmam o desmantelamento das suas estruturas.
Foi o comunicado de uma morte anunciada. A ETA declarou esta quinta-feira a sua dissolução formal como organização. Foi o acto final de um processo que se arrastava há já vários anos, depois de décadas de um terror de que pouco serviu para avançar os seus objectivos políticos.
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Foi o comunicado de uma morte anunciada. A ETA declarou esta quinta-feira a sua dissolução formal como organização. Foi o acto final de um processo que se arrastava há já vários anos, depois de décadas de um terror de que pouco serviu para avançar os seus objectivos políticos.
A sigla que significa Euskadi Ta Askatazuna (País Basco e Liberdade) terá sido utilizada pela última vez pela voz do dirigente histórico Josu Urrutikoetxea, conhecido como Josu Tenrera – um dos últimos operacionais que ainda liderou a estrutura durante a fase violência e que está hoje em paradeiro incerto. “A ETA, organização socialista revolucionária basca de libertação nacional, quer informar o País Basco do final da sua trajectória”, começou por dizer.
“A ETA dá por concluída a sua actividade política. Não será mais um agente que manifeste posições políticas, promova iniciativas ou interaja com outros actores”, continuou Tenrera. Mais para o final, o comunicado refere uma “nova fase histórica”, mas logo de seguida termina com um adeus definitivo: “A ETA surgiu neste povo e agora dissolve-se nele.”
Para sexta-feira está marcada uma conferência internacional em Cambo-les-Bains, no País Basco francês, em que participam mediadores internacionais e que servirá para assinalar a extinção definitiva da organização. Entre os participantes vão estar o advogado sul-africano Brian Currin e o presidente da autarquia de Baiona, Jean René Etchegaray, mas nenhum representante do governo autónomo do País Basco ou de Navarra.
Do terror à autodestruição
O caminho para a extinção da ETA foi iniciado muito antes, a 20 de Outubro de 2011, quando foi anunciado o fim do recurso à via armada. Para trás tinham ficado décadas de atentados que provocaram mais de 800 mortos, incluindo do antigo presidente do Governo franquista Luis Carrero Blanco, em 1973. Surgiu em 1958, mas a fase violenta seria iniciada apenas dez anos depois, quando o regime franquista estava perto do seu fim.
Na verdade, a época de maior violência coincidiu com os anos da Transição democrática, com o ano de 1980 a ser o mais mortífero – 93 homicídios. Para os separatistas bascos, o regime democrático embrionário e o governo autónomo no País Basco tornam-se tão seus adversários como era o franquismo. Em 1982, o braço político-militar (ETA p-m) dissolve-se e entra na legalidade. Permanecia a estrutura militar (ETA-m), que passou também a perseguir os antigos militantes que se tinham dedicado à via política.
Em 1992, dá-se a primeira detenção da cúpula da ETA em França, que nunca mais recuperou a capacidade organizativa que tinha alcançado. No início dos anos 2000, é posta em prática uma estratégia que viria a ser conhecida como a “socialização do sofrimento”, com centenas de homicídios de políticos locais, intelectuais e agentes das forças de segurança. A reputação da ETA junto dos sectores da opinião pública que ainda defendiam os seus objectivos políticos já tinha sofrido um forte abalo com o assassinato do autarca Miguel Angel Blanco, em 1997, e não mais recuperou.
Os anos seguintes são de várias iniciativas de negociação que trazem muitos poucos progressos. Acabou por ser derrotada no terreno com decapitações sucessivas dos elementos que compunham os seus órgãos dirigentes. Em 2011, quando anuncia o abandono da via armada, a ETA era já uma sombra da organização que tinha aterrorizado Espanha. Nos sete anos anteriores tinham sido capturadas quatro cúpulas militares consecutivas e a Guardia Civil calculava que estavam activos pouco mais de meia centena de militantes.
Desde então, a ETA reduziu-se a um veículo de negociação das condições de detenção dos seus militantes presos e essa tem sido a sua prioridade. A organização tem tentado negociar com Madrid reduções das penas e a transferência dos detidos para penitenciárias mais próximas do País Basco – a política das autoridades espanholas foi a de manter os "etarras" presos em estabelecimentos o mais longe possível dos seus locais de origem.
O perdão surgiu apenas no mês passado, através de um comunicado em que reconhece o “sofrimento desmedido” provocado, com “mortos, feridos, torturados sequestrados e pessoas que foram obrigadas a fugir para o estrangeiro”. Porém, as desculpas dirigem-se apenas às vítimas “que não tiveram uma participação directa no conflito”, aparentemente deixando de fora todas as outras, que são a maioria.