A coragem política e os interesses instalados
O movimento associativo juvenil tem duas faces: uma cheia de energia, inovação e criatividade, de ideias novas; e outra feita de repetição, de estruturas de poder cristalizadas.
Há dois anos tomou posse o atual secretário de Estado da Juventude. João Paulo Rebelo começou o seu mandato por onde se deve começar: pelos jovens, pelas suas organizações e pelas suas estruturas representativas. Com dedicação e empenho, recuperando uma prática anterior, fez um roteiro do associativismo, conhecendo no terreno, de lés a lés, o associativismo juvenil, contactando com as realidades locais em proximidade e na primeira pessoa.
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Há dois anos tomou posse o atual secretário de Estado da Juventude. João Paulo Rebelo começou o seu mandato por onde se deve começar: pelos jovens, pelas suas organizações e pelas suas estruturas representativas. Com dedicação e empenho, recuperando uma prática anterior, fez um roteiro do associativismo, conhecendo no terreno, de lés a lés, o associativismo juvenil, contactando com as realidades locais em proximidade e na primeira pessoa.
Deste périplo nacional concluiu rapidamente que o movimento associativo jovem reclamava uma revisão da lei que regulamenta o seu funcionamento (Lei n.° 23/2006) e colocou mãos à obra.
O movimento associativo juvenil tem duas faces: uma cheia de energia, inovação e criatividade, de ideias novas, voluntariado e vontade de transformar o mundo; e outra feita de repetição, de estruturas de poder cristalizadas, com financiamentos repetitivos quase garantidos (o fator histórico é preponderante…) e, o mais grave, com as mesmas pessoas que anos a fio se eternizam à frente dessas associações ou vão passando o poder aos seus comissários políticos… estes com interesses instalados que rejeitam qualquer mudança e afunilam os apoios a conceder à juventude para si.
Após dois anos, muitas reuniões de trabalho e tantas consultas, o secretário de Estado percebeu esta realidade e teve a coragem política de se colocar do lado dos jovens e avançou com a revisão da lei, em nome dos jovens de hoje – uma lei que os conservadores queriam cristalizada; ou melhor, que queriam rever para garantir mais benefícios fiscais para si, mas sem nunca introduzir um requisito essencial – que as associações de jovens devem ser lideradas por… jovens!
Pois, é verdade: há presidentes de associações de jovens com 40, 50, 60 anos. Presidentes de estruturas feitas à sua imagem e que se financiam através dos fundos destinados pelo Orçamento de Estado à juventude; sim, é verdade que estes só queriam esta revisão para terem mais benefícios fiscais e outras isenções tributárias, desde que a orgânica do setor permanecesse intocável – a história mostra-nos que é tendencialmente conservador quem o sistema mantém bem conservado…
Entristece-me muito que para devolver o associativismo jovem aos jovens seja preciso ter essa coragem política. Mas a realidade prova-nos isso. Pessoalmente, esperava mais do associativismo. Não devia ser necessária essa coragem para decidir a favor dos jovens, devolvendo-lhes o que lhes deve pertencer, retido até hoje pelos que cá estavam, os interesses instalados, que o tinham só porque sim: porque sempre foi assim, porque sempre foram estes...
Alguém compreenderia que uma associação de estudantes fosse presidida por uma mãe, um pai ou um diretor de escola: mesmo que todos os estudantes votassem nisso?! É que só passa pela cabeça de muitos que uma associação juvenil não seja presidida por um jovem porque um conservadorismo de interesses se instalou por demasiado tempo no nosso setor. Pessoas que quando chegaram eram jovens, mas que não souberam dar a vez a outros. Porque uma associação juvenil não é uma associação que faz coisas para os jovens, é uma associação de jovens, liderada por jovens, onde numa lógica de pares se realizam atividades, projetos e ações em prol da comunidade. Onde os jovens vivem a democracia, mas não para ela.
É de louvar que tenha tido um governante a coragem política necessária para exigir juventude ao setor da juventude, para empoderar os jovens para liderarem as suas associações, para colocar os jovens em primeiro lugar, preferindo-os a outros interesses instalados e tendo a coragem para resistir às suas pressões e fazer-lhes frente.
O secretário de Estado da Juventude dá-nos uma lição sobre Abril e sobre democracia, que o setor deve aprender. Porque se a democracia fosse sobre defender o status quo, se fosse sobre garantir o poder aos que estão há mais tempo ou aos que têm mais experiência, Abril não seria novo. Abril não seria dos jovens. Abril não seria nosso.
Feliz 30 de Abril, Dia do Associativismo Jovem.