Há um sarcófago cheio de amianto na base de Beja cujo destino é incerto
Um elevado volume do perigoso isolante terá de ser removida do imóvel onde vai funcionar uma unidade de desmantelamento de aeronaves,mas desconhece-se o seu destino final.
A Aeroneo, empresa de capitais suíços que arrendou ao Ministério da Defesa, na base aérea nº11 em Beja, um conjunto de hangares abandonados desde 1977 para neles instalar uma unidade de desmantelamento de aeronaves, vai enfrentar um grave problema ambiental que o Estado não resolveu em 23 anos. No local que os militares designam por “fábrica” existe uma cave, que ficou conhecida por “sarcófago”, e onde estão armazenados, desde 2005, cerca de 2400 metros cúbicos de amianto removidos entre 1995 e 1998 de vários hangares da base aérea construída pelos alemães nos anos 60 do século passado.
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A Aeroneo, empresa de capitais suíços que arrendou ao Ministério da Defesa, na base aérea nº11 em Beja, um conjunto de hangares abandonados desde 1977 para neles instalar uma unidade de desmantelamento de aeronaves, vai enfrentar um grave problema ambiental que o Estado não resolveu em 23 anos. No local que os militares designam por “fábrica” existe uma cave, que ficou conhecida por “sarcófago”, e onde estão armazenados, desde 2005, cerca de 2400 metros cúbicos de amianto removidos entre 1995 e 1998 de vários hangares da base aérea construída pelos alemães nos anos 60 do século passado.
A cave, depois de ter recebido, em 2005, o amianto acondicionado em sacos, foi selada com uma placa de betão com a promessa, feita naquele ano, pela Força Aérea Portuguesa (FAP), de que “logo que surja uma solução eficaz para o tratamento deste material isolante, este será retirado da unidade militar”. Mas tudo indica que a FAP não encontrou até hoje um método para tratar ou reciclar, com segurança, o amianto que os alemães utilizaram abundantemente na cobertura de tectos e paredes da base aérea.
A solução vai ter de ser encontrada, a curto prazo, quando a Aeroneo iniciar a recuperação da “fábrica” - um conjunto de hangares com quase 1,5 hectares de área coberta que se encontra abandonada desde 1977 - para instalar uma unidade de manutenção e desmantelamento de aeronaves.
Dada a especificidade do trabalho a realizar, o PÚBLICO perguntou ao Ministério do Ambiente se o amianto armazenado no “sarcófago” iria ser removido e que entidade procederia ao seu tratamento. A resposta chegou telegráfica: a remoção do amianto “é da competência do Ministério da Defesa”. Por sua vez, esta entidade adiantou que as perguntas “só poderão ser respondidas pela Aeroneo” mas a empresa alega que, “por se encontrar em fase de negociações com o Ministério da Defesa, não quer pronunciar-se” sobre qualquer assunto que se relacione com a utilização das instalações da unidade militar de Beja. Em alternativa, as perguntas foram colocadas a Luís Miranda, vereador da câmara de Beja, mas o autarca também não tinha resposta para dar. “A informação que me foi prestada pela Força Aérea é que não sabem se está ou não está, amianto na base aérea”, disse.
No entanto, o gabinete de relações públicas da FAP adiantou ao PÚBLICO que o contrato já celebrado com a Aeroneo (arrendamento do imóvel) “prevê que seja a empresa a remover todo o amianto identificado, assim como o que vier a ser encontrado no decorrer das obras”.
Nos mais recentes esclarecimentos prestados ao PÚBLICO pela FAP, esta entidade sublinhou que “não estão identificados edifícios da Base Aérea N.º 11 com amianto para além dos que constituem o complexo da 'fábrica'" onde se encontra o "sarcófago". Mas no levantamento efectuado em 2005, o gabinete de relações públicas da FAP adiantava que, para além dos 2400 metros cúbicos de amianto que tinham sido recolhidos em sacos entre 1995 e 1998, “havia mais nas paredes e tectos da fábrica", calculando que “houvesse ainda quase dez mil metros cúbicos de amianto por remover na base de Beja”. Por sua vez, a Inspecção-Geral de Trabalho (IGT), suspeitava que "ainda poderia haver amianto noutros edifícios" da base aérea.
O armazenamento de grandes quantidades de amianto dentro das instalações da “fábrica” e durante anos sem qualquer controlo veio a revelar-se muito deficiente. Os sacos de plástico utilizados no seu acondicionamento, com o decorrer do tempo foram-se deteriorando, facilitando a dispersão das partículas do mineral, constatação que suscitou protestos do PCP e da CGTP. Estas movimentações acabaram por envolver o Instituto Ricardo Jorge que efectuou, em Maio e Dezembro de 2005, medições no local para saber qual o grau de contaminação existente, mas os resultados nunca foram divulgados. A FAP confirmou a realização destas medições.
A base de Beja recebeu uma das mais perigosas aplicações de amianto através de flocagem por ter sido projectado quase puro nos tectos de vários dos seus edifícios como isolante térmico e protecção contra o fogo. Este método de aplicação em Portugal só foi efectuado na base de Beja e Teatro D. Maria II (de onde já foi removido).
Decorridos 23 anos do início da retirada do amianto, não se sabe a dimensão das consequências para a saúde pública e se o isolante tóxico que persiste na unidade militar será depositado num Centro Integrado de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos (CIRVER ) ou em aterro, onde o custo da deposição é mais baixo.