Ortega anula reformas que geraram protestos mortais na Nicarágua

Presidente da Nicarágua admite que as propostas para a Segurança Social não têm “viabilidade”.

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O Presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, anunciou neste domingo, através de uma mensagem na televisão, que desiste das reformas na Segurança Social, depois de estas terem gerado um feroz movimento de contestação que desembocou em violência mortal.

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O Presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, anunciou neste domingo, através de uma mensagem na televisão, que desiste das reformas na Segurança Social, depois de estas terem gerado um feroz movimento de contestação que desembocou em violência mortal.

Ao fim de cinco dias de protesto, e de pelo menos 25 mortos e dezenas de feridos, segundo organizações no terreno (o governo fala em sete mortos), Ortega tentou pôr fim à revolta anunciando que as reformas propostas serão canceladas. O Presidente admite que as medidas em causa não têm “viabilidade” e que “criaram uma situação dramática”. As manifestações populares foram brutalmente reprimidas, mas governo e outras entidades diferem nos números: a Reuters fala em "centenas de feridos" e sete mortos – os mesmos contabilizados pelo executivo.

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EPA/JEFFREY ARGUEDAS

No discurso deste domingo, Ortega informou que a direcção do Instituto da Segurança Social votou contra as medidas que tinham sido aprovadas na quarta-feira. Falou acompanhado dos representantes das maiores empresas do país, que leram um comunicado conjunto em que se referiram à escalada de violência e às consequências económicas negativas que tiveram os últimos cinco dias.

“Sentimos que já há uma reacção por parte da população, que pede o fim destes actos de violência e que não se continue a derramar o sangue dos irmãos nicaraguenses. É uma dor para as famílias, é um duelo para o país e por este caminho não vamos chegar a nenhuma solução”, concluiu Ortega, antes de revogar as reformas na Segurança Social, citado pelo canal nicaraguense TN8.

Na quarta-feira, foi aprovada nova legislação para a Segurança Social, que previa uma redução das pensões em 5% e o aumento das contribuições fiscais dos trabalhadores das empresas. As manifestações começaram nesse dia, depois de conhecida a nova reforma. Com o objectivo de salvar o Instituto Nicaraguense de Segurança Social, o Governo da Frente Sandinista de Libertação Nacional acreditava que as medidas lhe permitiriam poupar 250 milhões de dólares (cerca de 203 milhões de euros) – 1,5% do PIB –, mas os agentes económicos locais temiam que estas pudessem resultar num aumento brutal da taxa de desemprego e numa perda de competitividade económica, segundo contava então o diário espanhol El País.

Esta é a segunda vez que o Presidente fala ao país este fim-de-semana. No sábado, o chefe de Estado e ex-guerrilheiro admitiu que podia vir a “reconsiderar” a reforma. Mas salvaguardou que só estava disponível para dialogar com o sector empresarial, deixando de fora todos os interlocutores e representantes dos restantes sectores da sociedade civil.

Os empresários recusaram a proposta e mantiveram-se firmes na sua exigência do fim da repressão das manifestações civis. Ao longo de mais de quatro dias de protestos, as forças governamentais tiveram luz verde para usar balas verdadeiras contra os manifestantes.

Entre os que perderam a vida nos confrontos da polícia com membros da Juventude Sandinista e do exército está um jornalista que, segundo a imprensa local, foi baleado na cabeça enquanto fazia um directo para o noticiário El Meridiano, na cidade de Bluefields. O vídeo do momento foi repetidamente partilhado nas redes sociais nas últimas horas.

“Estamos nas ruas a pedir a Ortega e à sua mulher que se vão embora, isto já ultrapassou largamente a questão da Segurança Social”, criticava um manifestante de Manágua, citado pelo Guardian. “Assistimos a mortes e a ferimentos e ele [Ortega] nem sequer pediu desculpas pela repressão selvagem contra a população”, censurou.

Este domingo, houve pilhagens em supermercados, e realizaram-se funerais de alguns estudantes mortos nos confrontos com a polícia e forças do regime.