Hotel Infante Sagres abriu processos judiciais contra livraria centenária e câmara
Em causa está a classificação da livraria Moreira da Costa como loja histórica e o licenciamento de construção de um spa, que antecedeu o reconhecimento pela Câmara do Porto.
Abriu esta segunda-feira ao público, mas só hoje foi apresentado oficialmente. O Hotel Infante Sagres, do grupo The Fladgate Partnership (responsável por marcas como a Taylor’s, Fonseca, Croft e Khron), desde 2016, abriu de cara renovada e com três processos judiciais a decorrer. Tudo devido à construção de um spa, que ainda não arrancou devido à classificação da Moreira da Costa, “a mais antiga livraria da cidade do Porto”, como loja histórica e que partilha as paredes com o Hotel de cinco estrelas.
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Abriu esta segunda-feira ao público, mas só hoje foi apresentado oficialmente. O Hotel Infante Sagres, do grupo The Fladgate Partnership (responsável por marcas como a Taylor’s, Fonseca, Croft e Khron), desde 2016, abriu de cara renovada e com três processos judiciais a decorrer. Tudo devido à construção de um spa, que ainda não arrancou devido à classificação da Moreira da Costa, “a mais antiga livraria da cidade do Porto”, como loja histórica e que partilha as paredes com o Hotel de cinco estrelas.
Na apresentação do hotel, o CEO do grupo, Adrian Bridge, revelou que estão em curso “vários processos judiciais” uma vez que a construção do spa na cave foi licenciada a Junho de 2017 e só mais tarde, a Dezembro desse mesmo ano, é que a livraria foi classificada pela câmara. Em questão está a cave dos dois estabelecimentos, que são paredes-meias. Se de um lado se pretende construir um spa, no outro a livraria, que abriu portas em 1902, armazenou milhares de livros. A incompatibilidade? Adrian Bridge teme que os livros sejam inflamáveis e que, por essa mesma razão, sejam um perigo para os hóspedes.
Ao PÚBLICO, a esposa do proprietário da livraria, Susana Fernandes, diz que existem três processos em curso: dois contra a livraria e um contra a câmara, na qual se vêem integrados por serem parte interessada. A classificação como loja histórica, confessa, foi depois do licenciamento de obras do Infante Sagres mas isto apenas porque o concurso só abriu nessa altura. “O proprietário do hotel diz que só nos candidatámos depois nos ter sido mandada a carta de denúncia do contrato — o que é verdade —, mas nós só nos candidatámos a 3 de Julho de 2017 porque foi quando abriram as inscrições para o Porto de Tradição e para as lojas históricas”, explica Susana Fernandes. “Mas já tínhamos informado o proprietário que o iríamos fazer.”
Há uma primeira proposta da câmara para a classificação da livraria como loja histórica a 5 de Setembro mas devido a uma reclamação, no período de discussão pública, a decisão final é apenas de 21 de Dezembro. “Como é que o projecto [do hotel] está licenciado formalmente e depois há uma nova lei de lojas históricas que passa por cima do nosso licenciamento”, questiona Adrian Bridge. “É uma lei civil e dentro das leis portuguesas não é possível aplicar uma lei civil retroactivamente.”
A ideia, segundo o CEO do The Fladgate Partnership, que já explora o Yetman (Gaia) e o Vintage House (Pinhão, Douro), passou por “oferecer várias soluções”, incluindo “o pagamento de uma compensação mais generosa do que a lei prevê”. “Também propusemos que eles [proprietários da Moreira Costa] ficassem com a loja e nós com a cave, comprando-a.” Mas nenhuma das negociações deu fruto.
Susana Fernandes refere que tinha informado o proprietário do hotel quanto à sua ambição em classificar a livraria como loja histórica, em 2016. E depois surgiram as propostas, entre as quais passar para a esquina, manter a parte de cima e vender a parte de baixo, passando o espólio para um armazém em que os proprietários sabiam que “iriam começar obras” e depois surgiu mesmo uma negociação monetária, antecedendo à candidatura de classificação, a “qual não foi aceite”. “E então dissemos que não haveria qualquer tipo de acordo e que iríamos lutar, com todas as armas que tivéssemos, para que pudéssemos cá ficar.”
Adrian Bridge, por seu lado, diz-se preocupado com a segurança dos hóspedes. “Desde há anos e anos que [a livraria] tem lá o seu stock de livros” e estes são vistos como um risco, uma vez que “ninguém quer ter milhares de livros, que são inflamáveis, debaixo de sua casa”. Susana Fernandes contrapõe que os livros estão salvaguardados uma vez que estão reunidas todas as condições para prevenção e combate a incêndios.
A esposa do proprietário garante também que o contrato e a renda “de 1948” se mantêm. “Em 2004 houve a mudança de designação social da livraria, porque nenhum de nós era Moreira da Costa”, e nesse ano, então, o proprietário e fundador do hotel, Delfim Ferreira, decidiu reverter o valor da renda. “O proprietário do hotel tinha um enorme respeito por nós e achava que a livraria dava dignidade ao seu empreendimento”, sublinha Susana Fernandes. “E o que as pessoas também dizem é que estranham que o actual proprietário do hotel não tenha orgulho em ter uma livraria centenária no seu empreendimento, o que até dá um charme a este hotel tão antigo, que é lindíssimo e que faz parte da cidade. Como nós, que fazemos parte da cidade e queremos continuar a fazer.”
Texto editado por Ana Fernandes