Os azulejos portugueses são "a definição do luxo"
Suzy Menkes é a figura visionária por detrás da conferência de luxo da Condé Nast, que começa hoje, em Lisboa e reúne cerca de meio milhar de participantes.
A Condé Nast International Luxury Conference ocupa esta quarta e quinta-feira, 18 e 19 Abril, o Pátio da Galé, em Lisboa. O evento reúne nomes como Maria Grazia Chiuri, directora criativa da Dior; Frederico Marchetti, CEO do grupo Yoox Net-A-Porter e Hilary Swank, actriz e criadora da marca roupa desportiva Mission Statement, para falar sobre as indústrias do luxo, cruzando temas como moda, tecnologia, sustentabilidade e a forma como os mercados internacionais estão em constante mudança.
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A Condé Nast International Luxury Conference ocupa esta quarta e quinta-feira, 18 e 19 Abril, o Pátio da Galé, em Lisboa. O evento reúne nomes como Maria Grazia Chiuri, directora criativa da Dior; Frederico Marchetti, CEO do grupo Yoox Net-A-Porter e Hilary Swank, actriz e criadora da marca roupa desportiva Mission Statement, para falar sobre as indústrias do luxo, cruzando temas como moda, tecnologia, sustentabilidade e a forma como os mercados internacionais estão em constante mudança.
Na sua quarta edição, a conferência anual – que passou já por Florença, Seul e Omã, – chega a Lisboa com o tema “Language of Luxury - A Linguagem do Luxo”, debruçando-se na ligação entre os países lusófonos. A moderar grande parte dos debates estará Suzy Menkes, editora internacional da Vogue e uma das vozes mais influentes da indústria da moda. É também, desde o início, a força motora por detrás da conferência.
A substituir “o” de Vogue, no seu cartão-de-visita, está um cartoon feito à sua imagem, com a poupa do cabelo que se tornou uma imagem de marca e uma caneta e bloco de notas nas mãos – simbolizando a interacção directa que costuma ter com criativos dos mais diversos meios. Nos últimos meses, passou várias vezes por Portugal: assistiu a desfiles de moda, foi conhecer o atelier de alguns criadores de moda, visitou fábricas no Norte do país, passeou pelas ruas de Lisboa (à procura de espaços para os eventos da conferência) e, pelo caminho, apaixonou-se pelos azulejos.
Na conferência o que querem explorar sobre a “linguagem do luxo”?
Estamos a olhar para o efeito que os anos de colonialismo tiveram na forma como as pessoas compram. Pessoas diferentes vão falar de assuntos diferentes. A conferência abre com Alexandre Arnault e aquilo que ele está a fazer com a Rimowa [marca de malas de viagem]. Ele quer ter pessoas cool ligadas à marca, é um efeito de cruzamento de culturas. Temos a Maria Grazia, que é italiana, está nesta marca híper francesa e está a aprender inglês, mas quando a conheci não faltava nenhuma língua, excepto o italiano.
Como é que tudo isso se junta em algo coeso?
Não tenho a certeza que precise de ser coeso, porque a ideia é despertar a imaginação das pessoas. Queremos diferentes pontos de vista, diferentes ideias. Temos este duo, Awaytomars [uma marca portuguesa], ouvi falar deles nos desfiles [da ModaLisboa]. Fiquei absolutamente fascinada com esta ideia de alguém ter tornado possível o negócio de crowdsourcing no design. Agora estão em Londres, cheguei a ir visitá-los.
Uma das ideias que apresenta na conferência é o conflito entre a ideia de luxo “monolítico” e a personalização. Qual é o seu ponto de vista?
Acho que nada está definido. Há duas escolas de pensamento: uma é de ser inclusivo e atingir toda a gente e o outro é ser mais pessoal e fazer com que as pessoas sintam que as coisas que compram são especiais. Não acho que as grandes marcas já tenham decidido o que querem mesmo fazer. Estão a testá-lo.
Há quem fale também em personalização de massas...
Sou alérgica à palavra "massas". Mas se é aquilo que as pessoas querem, é o que terão. Sabemos que a moda é hoje para toda a gente. Os dias em que era apenas para alguns estão absolutamente acabados. Mas a pergunta que faria sobre isso é a seguinte: se formos comprar um par de sapatos e alguém puser um carimbo com o nosso nome, isso dá-nos mesmo a sensação [de que se trata de uma peça de luxo]? Não queremos sentir que aquele objecto foi tocado por mãos humanas, que alguém o criou especialmente para nós?
Esta é a quarta edição da Condé Nast International Luxury Conference. Com que propósito começou?
Para mim, conta como se fosse o 18.º ano, porque foi quando estava no International Herald Tribune que tive a ideia de começar as conferências de luxo. O propósito é sempre o mesmo: tentar olhar de forma inteligente para as ideias das pessoas na indústria. Quero que as pessoas saiam a sentir que aprenderam algo ou que foram surpreendidas. Ou talvez que confirmem aquilo que pensavam. Mas quero que tenham algum tipo de reacção.
Quais foram alguns dos momentos mais marcantes?
Acho que ter o Jony Ive [executivo responsável pelo design da Apple] a abrir a conferência em Florença foi uma experiência inesquecível porque estávamos num daqueles edifícios antigos e incrivelmente bonitos. Ter o Jony Ive lá, nesse ambiente, parecia mesmo um encontro entre o passado e presente – talvez pudéssemos mesmo dizer: passado e futuro.
Por falar em ambientes, na apresentação da conferência refere que os azulejos de Lisboa a convenceram a fazer a conferência nesta cidade. É mesmo verdade?
Pode não ter sido mesmo o que me convenceu, mas não me consigo fartar deles. Seria muito feliz se todos os edifícios em Lisboa tivessem azulejos. Às vezes passeio só para olhar para eles. Há algo que capta a imaginação. Porque são todos tão diferentes e são todos tão imaginativos e têm um trabalho manual tão bonito. Na verdade, são a definição do luxo.
As pessoas têm diferentes definições de luxo. O que é para si?
Concordo que há sentimentos diferentes sobre o luxo. Se encontrássemos uma nova palavra, acho que teríamos de a usar. Do meu ponto de vista pessoal, gosto de objectos que foram tocados por mãos humanas. E gosto de sentir que são especiais para mim. É o oposto daquilo que muitas pessoas consideram, que é ter o logótipo ou nome de algo – como a Supreme [uma marca desportiva] – impresso na mala. Para mim, o luxo tem de ser feito de forma maravilhosa. Se não houver mestria artesanal, não sei como é que consegue genuinamente ser chamado de luxo. Pode ser a mestria no trabalho de costura ou pode ser no escolher do tecido.
Pode ser também a forma como se comunica com as pessoas?
Sim, mas quando nos referimos à presença de uma marca online tem sido difícil transmitir o mesmo glamour que muitas pessoas sentem quando entram numa loja física. Esse é o desafio: fazer com que estas coisas pareçam preciosas.
Passou bastante tempo a conhecer Lisboa e incluiu temas e oradores portugueses na conferência. Porquê?
Aparte de tudo o resto, este é o momento de Portugal. Toda a gente fala nisso, toda a gente está fascinada. E nunca sabemos por que é que estes momentos acontecem. Eu venho porque quero saber mais sobre o país. Não quero chegar, como se estivesse a chegar de Marte e dizer "olá aqui está a nossa conferência. Adeus!”. Encorajamos as pessoas a chegar cedo e a ficar mais tempo [na cidade]. Acho que em todas as conferências que fiz tentei ser muito inclusiva. Portugal é considerado como um sítio onde se fazem os produtos bem. Claro que a Itália faz muitas coisas bonitas, mas Portugal é escolhido por muitos designers como sendo de confiança, muito bom no trabalho manual, por exemplo, fui ao Porto ver como fazem os sapatos.
Muito desse trabalho é destinado a marcas estrangeiras, que ficam com o valor acrescentado…
Sim, é. Mas não acho que o luxo tenha de estar sempre associado à marca. Pode ser linda mestria artesanal.
Nesse caso, como é que se afirma no mercado?
É muito difícil. Tento ter uma ou duas marcas na conferência de uma escala mais pequena, como a Awaytomars, que está longe de ser uma Louis Vuitton. Podem não ter aspirações de vir a ser uma grande marca, mas podem ser bastante interessantes.
A partir da mestria artesanal, Portugal tem potencial para afirmar as suas próprias marcas de luxo?
Penso que sim. Estou nesta área há tanto tempo que, quando fui pela primeira vez a Itália, era apenas um país que produzia para outros. França era o único país que as pessoas consideravam que tinha designers. Depois, os designers italianos foram chegando, um a um... Giorgio Armani e todos os outros.
O que podemos aprender com esse caso?
Alguém deveria fazer um estudo, para perceber exactamente como aconteceu, se o Governo tomou alguma decisão... O que posso dizer é que há potencial, mas é o país que tem de decidir. Quando falamos por exemplo em tapeçaria, a ideia de ter alguém que se concentrasse mesmo nisso, por outras palavras, que houvesse por exemplo uma faculdade especializada nisso.
O que acha que define a mestria artesanal portuguesa?
Acho que o trabalho com pele é muito interessante. Estou a falar em olhar para o produto acabado, que tem muita qualidade. Quando digo que certas malas parecem de designer parece rude, mas o que quero dizer é que a qualidade parece impressionante. Com a joalharia também, fiquei bastante surpreendida. Fiz alguma pesquisa e encontrei livros sobre joalharia dos tempos da monarquia, era mesmo excepcional.
Descobriu mais alguma coisa?
Tenho vontade de ir descobrir mais. Esta não vai ser a minha última visita a Portugal. Vou regressar. Acho que seria muito bom se as pessoas que fazem os desfiles de moda em Lisboa e no Porto tornassem estas coisas [a mestria artesanal] mais visíveis.
Há espaço para marcas portuguesas de luxo se afirmarem no mercado externo?
Acredito que vai haver dois canais distintos: um será para as marcas gigantes – pensamos sempre na Louis Vuitton porque é enorme — e do outro lado, haverá marcas mais pequenas que têm uma boa hipótese [de se afirmarem no mercado] e que não são menores em termos de importância. De certa forma, quanto maior os outros se tornarem, mais oportunidades haverá para os mais pequenos encontrarem o seu próprio percurso. Espero que isso aconteça, sou sempre a favor de algo novo e fresco.
Por curiosidade, como nasceu o seu famoso penteado?
Estava a falar sobre isto com os meus netos no outro dia. Acho que foi no final dos anos 1990. Não parece muito um penteado dos anos 1990, pois não? Era a altura em que toda a gente estava completamente caótica. Eu não aguentava que o meu cabelo caísse para cima da cara quando estava a tentar trabalhar. Disse à cabeleireira que queria uma forma de manter o cabelo longe da cara, mas sem ter de o apanhar.
E assim se tornou uma imagem de marca...
Seria difícil cortar agora!