Deputada do PSD-Madeira vai devolver dinheiro. PS responsabiliza deputados socialistas
Sara Madruga da Costa também vai devolver as verbas recebidas no caso da duplicação de abonos de transporte para os deputados das regiões autónomas. PS-Madeira aproveitou a polémica para atacar anterior direcção.
Depois de o deputado do Bloco de Esquerda Paulino Ascenção ter renunciado segunda-feira de manhã ao mandato em São Bento e decidido entregar a instituições de solidariedade social a verba recebida através do Subsídio Social de Mobilidade (SSM), Sara Madruga da Costa, do PSD-Madeira, foi a segunda parlamentar a admitir que o expediente possa ser “eticamente questionável”.
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Depois de o deputado do Bloco de Esquerda Paulino Ascenção ter renunciado segunda-feira de manhã ao mandato em São Bento e decidido entregar a instituições de solidariedade social a verba recebida através do Subsídio Social de Mobilidade (SSM), Sara Madruga da Costa, do PSD-Madeira, foi a segunda parlamentar a admitir que o expediente possa ser “eticamente questionável”.
A deputada social-democrata, que foi cabeça-de-lista pela Madeira, ficou a meio caminho. Vai “devolver as verbas recebidas” por uma “questão de consciência” e diz-se disponível para um “debate” em torno da revisão do sistema. Sobre a possibilidade de renunciar o mandato, nenhuma referência no comunicado emitido durante a noite de segunda-feira.
“Agi de acordo com aquilo que entendi ser a lei, embora reconheça, com toda a humildade que tal possa ser eticamente questionável”, diz Sara Madruga da Costa, referindo-se à acumulação de abonos que os deputados das duas regiões autónomas na Assembleia da República têm beneficiado.
Em causa, está uma notícia avançada no sábado pelo Expresso, que dava conta de que para além dos 500 euros semanais (no total de 2000 ou 2500 euros por mês) que os deputados dos Açores e da Madeira recebem para custear as viagens até ao círculo eleitoral, independentemente de viajarem ou não, a maioria dos parlamentares solicitava depois, ao abrigo do SSM, o reembolso correspondente das viagens efectivamente realizadas.
O subsídio de mobilidade, criado para garantir a continuidade territorial, estabelece que os residentes nas regiões autónomas tenham parte do valor da viagem reembolsado, mediante a apresentação do comprovativo numa estação dos CTT. No caso açoriano, o reembolso é feito para despesas acima dos 134 euros, e para a Madeira a partir dos 86 euros para passagens até aos 400 euros.
Um apoio que pelo menos oito dos 12 deputados das regiões autónomas admitem receber. A excepção, entre os que já aceitaram comentar o caso, é a da também deputada do PSD-Madeira, Rubina Berardo. A vice-presidente da bancada social-democrata não tem residência na Madeira – já vivia em Lisboa antes de ser eleita em 2015 – e por “opção pessoal” não recorreu ao SSM.
O caso, que além de Paulino Ascenção e Sara Madruga da Costa envolve pelo menos os deputados Carlos César, Lara Martinho, João Azevedo Castro, Luís Vilhena, Carlos Pereira e Paulo Neves, tem provocado ondas de choque na Madeira e nos Açores. Não está em causa o apoio do Parlamento às deslocações dos deputados aos círculos eleitorais por onde foram eleitos, mesmo porque esse abono existe para todos, sendo que a diferença é que para continente o valor não é fixo, mas determinado pelos quilómetros percorridos. Está em causa a ética da acumulação de apoios.
Para esclarecer a questão, o grupo parlamentar do PSD solicitou também na segunda-feira, e com “carácter de urgência”, um parecer à subcomissão de Ética. “Urge saber se esta situação se confirma, se é regular e se a lei permite mesmo esta duplicação de apoios”, lê-se no requerimento enviado ao presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Bacelar de Vasconcelos.
Sara Madruga da Costa apoia “incondicionalmente o pedido de parecer”, mas não quis esperar pela apreciação. “Por uma questão de consciência, decidi, ainda antes de saber o resultado do parecer da Assembleia da República, devolver as verbas recebidas”, anunciou, ressalvando que o pedido de reembolso não foi uma “prática regular”. Até porque, acrescentou, sempre teve dúvidas sobre o seu acerto.
Mais à esquerda, o PS-Madeira aproveitou a polémica para atacar a anterior direcção do partido. Carlos Pereira, um dos deputados envolvidos, foi presidente dos socialistas madeirenses até Janeiro deste ano, altura em que foi derrotado por Emanuel Câmara, numas eleições internas bastante divididas.
O caso veio sublinhar que as feridas ainda não estão saradas. “O secretariado do Partido Socialista da Madeira comunica que, em relação às viagens aéreas dos deputados da Assembleia da República, não se revê numa possível acumulação de subsídios de reembolso”, lê-se num comunicado emitido na noite de segunda-feira, em que os dois deputados eleitos pelo PS-Madeira (Carlos Pereira e Luís Vilhena) são responsabilizados.
“É um tema da consciência moral e ética de cada um, que devem avaliar, esclarecer e tomar as devidas acções em função de quem representam”, acrescenta o documento assinado pelo secretário-geral dos socialistas madeirenses, João Pedro Vieira, que ainda encontra espaço para pessoalizar a mensagem, recuperando o título da moção que Carlos Pereira (‘Verdade e credibilidade’) levou ao último congresso regional do partido. É, escreve o secretário-geral, uma questão de verdade e credibilidade.
Do particular para o geral, o PS-Madeira termina lembrando que a “ética da República é a ética da Lei”, para defender a necessidade da Assembleia da República “corrigir os procedimentos”, de forma a credibilizar a política junto da sociedade.