A Áustria veio a Guimarães para dar música ao Westway Lab

A quinta edição do festival terminou este sábado com os bilhetes esgotados. Para ver Manel Cruz e o japonês Stereociti, mas também os Leyya, parte da significativa comitiva do país que veio este ano mostrar-se no evento.

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O que é que conhecem da música feita em Portugal?, pergunta à banda austríaca Cari Cari o director artístico do Westway Lab, Rui Torrinha, num dos encontros entre artistas e público do festival que terminou este sábado, após quatro dias de concertos, conferências e showcases na presença de um dispositivo internacional de cerca de uma centena de representantes da indústria musical. 

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O que é que conhecem da música feita em Portugal?, pergunta à banda austríaca Cari Cari o director artístico do Westway Lab, Rui Torrinha, num dos encontros entre artistas e público do festival que terminou este sábado, após quatro dias de concertos, conferências e showcases na presença de um dispositivo internacional de cerca de uma centena de representantes da indústria musical. 

“Nada”, responde um dos membros do grupo, depois de um momento de pausa para reflexão. Para os que eventualmente pudessem estar surpreendidos com a resposta, a questão foi devolvida ao público e aos músicos portugueses, questionando o seu conhecimento da música austríaca. A resposta foi exactamente a mesma.

Terá sido também por isso que, pela primeira vez em cinco edições, o festival de Guimarães abraçou um programa decidido a estreitar os laços musicais entre países europeus. Além do Westway Lab, mais sete festivais compõem a rede INES – Innovation Network of European Showcases: Liverpool Sound City, Spring Break (Polónia), Monkey Week de Sevilha, MENT (Eslovénia), Sonic Visions (Luxemburgo), Live at Heart (Suécia) e Waves Vienna. A rede funciona numa lógica de intercâmbio: este ano, o país convidado para rumar a Guimarães foi a Áustria, na próxima edição do Waves Vienna o country focus será dedicado a Portugal.

E foram cinco os projectos escolhidos para vir dar a cara pelo país de Wolfgang Amadeus Mozart. A variedade apontada como um dos critérios de selecção confirmou-se; no que toca à originalidade, nem tanto.

Não será quase no fim da segunda década do século XXI que se vai inventar algo que substitua a roda, mas é sempre possível reinventá-la. Mais próximos de o conseguir fazer estiveram os Leyya, que no sábado à noite mostraram no Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor (CCVF) uma pop electrónica que, em doses contidas, arrisca sair fora de pé para um experimentalismo sónico mais cru, apoiado na guitarra eléctrica.

Os Cari Cari, que já se tinham mostrado na primeira noite do festival, quarta-feira, integrando os showcases das residências artísticas promovidas pelo festival, voltaram a fazê-lo na sexta-feira. O duo aborda o rock’n’roll com pés de lã: mais sedutor do que duro, mais frágil do que viril, consegue envolver o público numa teia composta por elementos que remetem para uma paisagem desértica. Poderá ser uma opção estética, mas fica a sensação de que por vezes sobra contenção e falta explosão. As aptidões técnicas da baterista não serão as melhores para o efeito (será aliás arrojado catalogá-la como tal), mas consegue compensar esse défice com as linhas de voz que divide com o guitarrista.

Competentes, mas deixando uma sensação de déjà vu no ar, mostraram-se AVEC e o duo Molly. A primeira, acompanhada pela banda, faz uma folk bem desenhada, mas sem personalidade – por vezes, deixa-se arrastar por um lado mais dark que automaticamente nos faz lembrar Lana Del Rey. Já os Molly movem-se no espectro do shoegaze e do pós-rock. Bem gizado, mas falta algo para que não sejam apenas mais uns nestes dois géneros já saturados e com nomes sólidos firmados há vários anos. Na quinta-feira à noite, ainda passou pelo café-concerto do CCVF a electrónica mais dançante de MOTSA. Não deixou marcas.

Surpresas e confirmações

Foi durante a tarde de sábado que nos deparámos com uma surpresa e com uma confirmação. No âmbito dos city showcases, o público foi convidado a percorrer quatro salas do centro de Guimarães, um roteiro com que o festival quis também dar a conhecer a diversidade de espaços e de equipamentos acima da média, em qualidade e em quantidade, de uma cidade desta dimensão. Num raio de poucos quilómetros há o Centro Cultural Vila Flor, com as suas três salas, a black box no Centro Internacional das Artes José de Guimarães e ainda o palco do CAAA – Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura. 

Começamos a viagem no Café Convívio para espreitar a indie-folk do vimaranense Gobi Bear, seguimos para o Bar da Ramada para ouvir o universo electrónico de Daily Misconceptions, damos um salto ao CAAA para experimentar Nery, aqui acompanhado por uma banda jazz, e estacionamos definitivamente no bar All Guimarães, onde somos surpreendidos pela violoncelista Joana Guerra.

Quantas possibilidades existem para este instrumento associado à música clássica? Tantas quantas são e poderão ser exploradas por esta violoncelista lisboeta editada pela editora vimaranense Revolve, que usa o instrumento como veículo para a experimentação. É uma experiência sonora que ganha valor acrescentado com a performance visual, que não é mais do que apenas e só a forma como a violoncelista aborda e executa o violoncelo. Recorre a um kazoo e funde-o com o som das cordas, usa linhas de voz ora em português, ora em francês ou inglês, e com uma amplitude vocal notável transporta-nos para um universo guardado por génios como Diamanda Galás ou até uma Jarboe.

Não quisemos mais sair dali, até porque após esta surpresa queríamos confirmar o que a norte-americana Vita, que já tinha participado num showcase a meias com :papercutz, seria capaz de fazer com os temas dos seus Vita and the Woolf. Não trouxe a banda, mas usou o mesmo reportório e entregou-o com muita competência e de alguma forma suplantando ao vivo o trabalho feito em estúdio. Conseguiu com isso chamar a atenção de alguns agentes europeus que ali estavam; foi de resto com essa finalidade que veio ao festival, disse ao PÚBLICO.

Na noite de sábado, em que os Dear Telephone, Leyya, Toulouse, Stereociti e Manel Cruz esgotaram o Grande Auditório do CCVF, Nuno Saraiva, da AMAEI – Associação de Músicos Artistas e Editoras Independentes, que há cinco anos lançou à cooperativa A Oficina o desafio de arrancar com o festival, diz-nos que é para a criação desta rede de contactos que o Westway Lab serve. “Todos os anos há uma parceria que aqui nasce”, diz-nos, dando o exemplo de bandas que nasceram no festival a partir da colaboração entre artistas nacionais e internacionais, como os The Melonas, que nasceram da fusão de Ivan & The Parazol, da Hungria, com o portuense We Bless This Mess, ou os Phila, colaboração entre Pedro Lucas, da dupla Medeiros/Lucas, e o esloveno Tine Grgurevic, nome por trás de Bowrain.