O hipócrita tecnológico
Durante anos, o lema do Facebook foi “mexer com rapidez e partir coisas”. É um dos lemas mais bem-sucedidos da história.
O espectáculo hollywoodesco da audição de Mark Zuckerberg no Congresso americano foi decadente. O líder do Facebook repetiu uma estafada filosofia bacoca sobre “aproximar o mundo” e “fazer do planeta um lugar melhor” que já não serve para disfarçar a arrogância em que está baseado um modelo de negócio que depende da abdicação dos dados pessoais dos utilizadores.
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O espectáculo hollywoodesco da audição de Mark Zuckerberg no Congresso americano foi decadente. O líder do Facebook repetiu uma estafada filosofia bacoca sobre “aproximar o mundo” e “fazer do planeta um lugar melhor” que já não serve para disfarçar a arrogância em que está baseado um modelo de negócio que depende da abdicação dos dados pessoais dos utilizadores.
Durante anos, o lema do Facebook foi “mexer com rapidez e partir coisas”. É um dos lemas mais bem-sucedidos da história. A empresa, acompanhada por muitas outras que seguem o modelo de desenvolvimento aplicado em Silicon Valley, conseguiu partir muitas coisas, a começar pelo direito à privacidade dos utilizadores.
A razão pela qual o Facebook nunca foi transparente nas suas políticas de privacidade é porque sabe que se o fosse, nunca teria o sucesso que teve. A empresa sempre se aproveitou da ignorância dos utilizadores e da margem que a tecnologia lhe permitiu para espiar os utilizadores quando estavam a usar a sua aplicação e também quando não estavam.
Há quem julgue que não se deve limitar a acção da empresa, simplesmente porque o bom mercado (os utilizadores) a quer. Mas este é um argumento incompreensível. Qualquer empresa que abuse do seu acesso ao mercado para vender um produto abusivo será sancionada pelas autoridades. Se uma farmacêutica vendesse um comprimido altamente eficaz para a gripe que incluísse uma qualquer droga que causasse uma enorme dependência, seria imediatamente travada. E se um canal de televisão programasse pornografia para um espaço de programação infantil, seria fechado pelas autoridades no mesmo dia. Mas apesar de ser isto que empresas como o Facebook e a Google fazem, aproveitando para promover práticas monopolistas e fugir aos impostos de todas as maneiras possíveis e imaginárias, ainda há quem pense que as autoridades não devem intervir.
Ainda ontem, nas audições no Congresso americano, se elogiou o trabalho do Facebook como um exemplo do “sonho americano”. Foi risível, mas compreensível: os legisladores americanos sempre protegeram os empreendedores de Silicon Valley, em parte por ignorância, em parte por vaidade, e essa é uma das poucas acções que Trump e Obama partilharam. Só Margrethe Vestager, a comissária europeia da Concorrência, teve coragem de afrontar os gigantes tecnológicos e de os multar principescamente para os obrigar a cumprir a legislação europeia. Vai ser preciso fazer muito mais.