Município angolano que é maior que Holanda não tem nem um quilómetro de asfalto
O Alto Zambeze tem 48 mil quilómetros quadrados e 20 mil pessoas. É uma das regiões mais isoladas do país.
O bispo do Moxico alertou esta quarta-feira para as condições de vida no Alto Zambeze, um dos municípios mais isolados de Angola, maior do que a Holanda ou a Suíça, mas sem qualquer quilómetro de estrada asfaltada.
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O bispo do Moxico alertou esta quarta-feira para as condições de vida no Alto Zambeze, um dos municípios mais isolados de Angola, maior do que a Holanda ou a Suíça, mas sem qualquer quilómetro de estrada asfaltada.
O bispo, o argentino Tirso Blanco, está à frente daquela diocese católica no leste de Angola há dez anos. Mas ali já tinha estado, na mesma função, no período da guerra civil angolana, entre 1986 e 1991. Recorrendo às redes sociais, o bispo católico criticou a rede viária até ao Alto Zambeze, que no período colonial foi um dos maiores produtores de arroz em Angola, ilustrando com fotos da única picada, totalmente esburacada e coberta de lama, que liga ao centro daquele município.
Nestas condições, a viagem facilmente se transforma num "martírio" de dois dias.
"Há 16 anos [4 de Abril de 2002] que Angola recebeu a paz desde Moxico. Esta é a única via possível para chegar a Cazombo [comuna capital do Alto Zambeze], que não tem aeroporto nem comboio", apontou.
No extremo leste de Angola, o Alto Zambeze tem 48 mil quilómetros quadrados e apenas 20 mil habitantes, ocupando uma área, por exemplo, semelhante à da Dinamarca. Sem estradas, a alternativa, segundo o bispo Tirso Blanco, passa por recorrer a serviços básicos do outro lado da fronteira, na República Democrática do Congo e na Zâmbia.
O isolamento do município é agravado nesta altura do ano, devido ao período das chuvas (Agosto a Maio), com intensa precipitação, que habitualmente deixa várias comunidades isoladas durante vários dias.
"Em todo esse território não se encontra onde comprar uma arca, uma geleira, o único hospital não tem mais que a boa vontade dos médicos. Raio X? Reagentes? Controlar a glicémica? Só na Zâmbia, depois de uma penosa viagem", criticou o bispo, que regularmente usa as redes sociais para alertar para a situação de isolamento da província do Moxico.
Recordando que foi no Moxico que acabou a guerra civil angolana, em 2002, com a morte em combate de Jonas Savimbi (UNITA) e a assinatura dos acordos de paz em Luena, capital da província, Tirso Blanco diz que é tempo de as várias promessas dos últimos anos serem cumpridas.
Isto porque, aponta, a construção da estrada entre o Luena e o Cazombo, de mais de 400 quilómetros, nunca saiu do papel, apesar de agora voltar a ser colocada em cima da mesa pelas autoridades locais.
"No ano de 2009 ‘ameaçaram' asfaltar a estrada, mas sem dar explicação a ninguém, os trabalhadores foram-se embora e até hoje não voltaram. No ano de 2013 outra empresa começou e fez uma grande movimentação de equipamentos e pessoal técnico, os trabalhadores foram-se embora e até hoje não voltaram. Agora novamente escutamos o suave barulho das promessas", criticou.
"Será desta vez? Até quando este território, que ocupa uma superfície duas vezes maior que Kuanza-Norte [província angolana] merecerá ter um pouco de asfalto, pois até agora, nem sequer um quilómetro tem", referiu Tirso Blanco.
A difícil situação da rede viária do Moxico foi admitida também à Lusa, em Fevereiro passado, pelo vice-governador da província, já que apenas 5% são estradas asfaltadas.
"Neste momento, infelizmente, em termos de estradas, primárias e terciárias na província não têm o melhor cenário. Mas nós acreditamos que com os esforços que estão sendo feitos nós vamos poder reverter esta situação", admitiu o vice-governador do Moxico, Carlos Alberto Masseca.