O dia em que imigrantes e funcionários do SEF estiveram na mesma luta

“Fomos confrontados com esta manifestação que, no fundo, reflecte a incapacidade de os serviços lhes responderem", diz presidente do Sindicato dos Funcionários do SEF no primeiro de três dias de greve. Imigrantes querem resposta a pedidos de autorização de residência.

Fotogaleria

O indiano Suresh Kumar tem empunhado um poster: “Eu existo com ou sem visto”. Está no meio de uma enorme massa de homens sobretudo do sudeste asiático que empunham outros tantos cartazes, alguns já carregados em anteriores protestos. A reivindicação é, afinal, antiga: a falta de resposta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) aos pedidos de autorização de residência de imigrantes como ele.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O indiano Suresh Kumar tem empunhado um poster: “Eu existo com ou sem visto”. Está no meio de uma enorme massa de homens sobretudo do sudeste asiático que empunham outros tantos cartazes, alguns já carregados em anteriores protestos. A reivindicação é, afinal, antiga: a falta de resposta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) aos pedidos de autorização de residência de imigrantes como ele.

“Ninguém é ilegal”, “em 2010 os imigrantes descontaram 316 milhões para a Segurança Social”, “direitos iguais”. Num megafone um homem lança o grito – e a multidão repete em coro: “Residência para todos”.

Só que hoje, terça-feira de manhã, esta é uma manifestação diferente das outras. Em frente ao edifício do SEF, no Marquês de Pombal, em Lisboa, estão dezenas de imigrantes mas também delegados sindicais do Sinsef, o sindicato dos funcionários daquele organismo.

Manuela Niza, presidente do Sinsef, olha curiosa para a multidão de imigrantes: “Não programámos nada disto”, afirma, depois de ter dito que conseguiu unir cerca de 75% de trabalhadores não-policiais daquele organismo no primeiro de três dias de greve. "A esmagadora maioria dos postos encerraram. Lisboa ficou a meio gás", com mediadores culturais a atenderem utentes, afirmou no final do dia. Conseguiram também uma reunião com o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, para dia 3. Os dados do SEF são diferentes: apenas 10 dos 37 postos encerraram e, dos 523 funcionários não-policiais, só 83 fizeram greve (quase 16%). 

“Fomos confrontados com esta manifestação que, no fundo, reflecte a incapacidade de os serviços lhes responderem. Não quer dizer que todos tenham direito [a autorização de residência] mas têm direito a uma coisa: a uma resposta e que seja célere. Ou os integramos ou mandamos embora. Mas temos de lhes dar resposta."

Os trabalhadores do SEF dividem-se em duas categorias: funcionários da Carreira de Investigação e Fiscalização (os inspectores) e funcionários de outras carreiras (documental, informação e apoio à actividade policial). Segundo a sindicalista, o SEF precisaria de 1000 a 1500 técnicos nesta última categoria, onde estão 500 trabalhadores, de modo a assegurar o normal funcionamento do sistema.

Falta de pessoal

Como raras vezes, a manifestação dos imigrantes e a greve dos funcionários do SEF transmitem uma mensagem convergente. Manuela Niza compreende a revolta do paquistanês Zulfiqar Ali, um jovem de 29 anos que diz estar há sete anos à espera de receber resposta. De tantas vezes que foi ao SEF já o conhecem, garante. Trabalha na construção civil, desconta para a Segurança Social. Não pode sair do país para visitar a mãe doente, caso contrário fica sem hipótese de regressar.

“Não há pessoal suficiente para dar resposta aos imigrantes, porque a parte documental é uma das missões do SEF e é deficitária, não tem enquadramento na lei orgânica nem no estatuto de pessoal. Andamos há anos a gritar para mudar a lei”, diz a sindicalista.

A revisão que desejam implicaria uma mudança que lhes traria a hipótese de integrar cargos de direcção ou receberem subsídio de especificidade de funções. A média salarial destes funcionários é de 600 euros, refere. O sindicato exige que, numa primeira fase, recebam um complemento e um passe social. “Isto representa um investimento de 1,5 milhões euros anuais. Permitia responder a esta gente toda, atrair mais vistos gold e atrair mais pessoas para a parte documental”.

Rana Uddin, presidente do Centro islâmico do Bangladesh e da Associação Amizade Bangladesh-Portugal, não empunha um cartaz, mas veio prestar solidariedade. “Temos que lutar sempre, alertar para a situação dos imigrantes”, afirma. Ao lado, Timóteo Macedo, dirigente da Solidariedade Imigrante (Solim), que marcou a concentração, afirma que se trata de mais uma das várias lutas pelos direitos dos imigrantes. É "a maior em frente ao SEF", afirma, confiante. “Estamos contra estas políticas discriminatórias, securitárias e racistas que não legalizam quem trabalha e desconta para a Segurança Social e não vêem uma luz ao fundo do túnel.”

A lei mudou em Agosto do ano passado com alterações que o dirigente considera positivas, houve alguns ajustes feitos desde então para acelerarem os processos. Mas Timóteo Macedo continua a questionar vários pontos e um deles é a obrigatoriedade de entrada legal em território nacional como condição para os estrangeiros se regularizarem – muitos chegaram a outro país do espaço Schengen antes de se mudarem para Portugal.

Na rua, vários dos imigrantes nestas condições queixam-se de receber respostas negativas. O director-nacional do SEF ficou de transmitir à Solim a sua reacção à reivindicação das associações para alterar a exigência de entrada legal. Contactado, o SEF não respondeu sobre esta questão.