Do Raf Park, que ia trazer multidões a Matosinhos, sobra a ruína
Desde 2012 sem qualquer serventia, após o encerramento do parque que durou quatro meses, a autarquia quer integrar aquela área no Parque Ecológico Monte de São Brás, servindo de incubadora de espécies de árvores que vão reflorestar o Corredor Verde do Rio Leça. Às estruturas que se mantêm de pé pretende dar-lhes uma nova função.
Duas piscinas abandonadas, um edifício de três blocos com os interiores destruídos e outras três estruturas cuja construção ficou a meio é o que sobra do parque de diversões que anualmente levaria a Matosinhos 300 mil pessoas. O Raf Park, no Monte de São Brás, em Santa Cruz do Bispo, não durou tempo suficiente para que fosse possível fazer a correspondência entre os números estimados e a primeira contagem. Aproximadamente quatro meses foi o tempo que passou desde que o empreendimento para o qual estava previsto um investimento no valor de sete milhões de euros por parte da empresa Ritmolândia, numa área de cerca de seis hectares, abriu em Junho de 2012.
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Duas piscinas abandonadas, um edifício de três blocos com os interiores destruídos e outras três estruturas cuja construção ficou a meio é o que sobra do parque de diversões que anualmente levaria a Matosinhos 300 mil pessoas. O Raf Park, no Monte de São Brás, em Santa Cruz do Bispo, não durou tempo suficiente para que fosse possível fazer a correspondência entre os números estimados e a primeira contagem. Aproximadamente quatro meses foi o tempo que passou desde que o empreendimento para o qual estava previsto um investimento no valor de sete milhões de euros por parte da empresa Ritmolândia, numa área de cerca de seis hectares, abriu em Junho de 2012.
Fechou, sem aviso prévio, em Outubro do mesmo ano. Na altura, o investidor justificou o encerramento, expectavelmente temporário, como necessário por força da necessidade de obras de manutenção. Nunca mais abriu. Os fundos europeus que garantiam a viabilidade do projecto nunca terão chegado e a empresa foi obrigada a abrir insolvência. Durante anos entregues ao abandono, os terrenos comprados antes da abertura do espaço pela autarquia que arrenda outros três e sempre suportou os custos associados ao contrato de arrendamento, foram recentemente limpos para serem recuperados para outra finalidade. Diz a câmara que dificilmente voltarão a ser usados para um projecto semelhante.
Não que não se tenha tentado antes. Em Julho de 2013, quase um ano após o encerramento, o executivo camarário, na altura liderado por Guilherme Pinto, ainda no PS, meses antes de renovar o mandato, mas como independente, anunciou o interesse de um investidor espanhol. Contra a vontade do PSD de Pedro da Vinha Costa e dos independentes Matosinhos Sempre de Narciso Miranda, na oposição, havia data marcada para assinatura do protocolo. Não chegou a acontecer.
Só um ano mais tarde, em Junho de 2014, é que a autarquia rescinde o contrato válido por um período de vinte anos com renovação automática por períodos de dez anos, assinado com a Ritmolândia em Novembro de 2012, já um mês depois do parque encerrar. Diz a câmara que o contrato terá sido celebrado só nessa altura para que fosse oficializada a cedência dos terrenos e por existir a expectativa de que o parque voltaria a funcionar.
Terrenos sem uso continuam a ser pagos pela câmara
Também não aconteceu e daí em diante os terrenos deixam de ter serventia. Continua a câmara a ser responsável pela factura que liquida desde Outubro de 2011, correspondente a duas parcelas com cerca de 27 mil metros quadrados e a outra mais pequena, com 2430 metros quadrados, arrendada desde Outubro de 2012, altura em que o parque deixa de funcionar. A renda mensal destas três parcelas é de 3140 euros. Estima-se que terão sido gastos, até à data, aproximadamente 200 mil euros no arrendamento das parcelas. Na compra dos outros dois terrenos afectos ao Raf Park foram gastos 446,3 mil euros, sendo que um deles, contíguo à capela de São Brás, com quase 15 mil metros quadrados, já tinha sido adquirido pela autarquia em 1989 por 74 mil euros. O segundo, comprado em 2012, aproximadamente com a mesma área, custou ao município 372 mil euros.
Como a câmara afirma nunca ter sido cobrada à empresa qualquer renda, desde 2011, o parque que não funcionou mais do que 4 meses custou até ao início de 2018, se excluirmos o valor da compra do primeiro terreno, cerca de 600 mil euros. Continuará a autarquia a pagar os 3140 euros mensais. Diz a câmara que um dos terrenos, que servia de parque de estacionamento do parque de diversões, continua a servir o mesmo propósito, mas para aqueles que visitam o Parque Ecológico Monte de São Brás.
Estruturas vandalizadas
Num dia da semana, no parque de estacionamento em terra batida e gravilha está estacionada apenas uma carrinha que arranca pouco depois de chegarmos. No local que servia de entrada principal para o Raf estão três blocos coloridos, de cimento armado, alvos de vandalismo. No chão do interior dos edifícios não há mais do que entulho e pedaços de cerâmica retirados das paredes.
No interior do parque já lá não estão as estruturas de alguns carrosséis que durante anos após o encerramento ainda lá permaneceram por entre o mato que não era cortado. Sobram duas piscinas que servem de tela para graffiti e algumas bases em cimento que serviam de apoio aos carrosséis. Há ainda três edifícios que continuam de pé que não passaram a fase do tijolo.
A vedação foi retirada e o mato do terreno que agora tem acesso aberto foi cortado recentemente, sendo possível percorrer toda a extensão do terreno. Contudo, quem lá se deslocar que não tire os olhos do chão. Numa zona do parque, no solo, estão duas entradas de saneamento abertas, com cerca de quatro metros de profundidade, sem qualquer protecção.
Depósito de material furtado
No centro do parque, numa plataforma em cimento, está um carro estacionado. Dirige-se para lá um morador das imediações. É uma das duas ou três pessoas que por ali vimos passar. É um hábito diário de vários anos. Sempre que pode, vai fazer uma caminhada até ao Monte de São Brás. Já o fazia muitos anos antes de se falar da construção do parque de diversões.
Tem um parque de estacionamento à disposição, mas preferiu estacionar a viatura no interior do espaço onde o Raf funcionou. Dali diz que consegue vê-lo enquanto passeia. Perguntamos se é uma zona perigosa. Diz que não sente grandes riscos, mas afirma ser um local escolhido para depositar objectos roubados e que por vezes não é “bem frequentado”. Embora não tenhamos visto ninguém dentro dos edifícios diz que há quem os use para dormir. Não terá sido única a vez em que viu carros abandonados no Monte de São Brás e outros materiais alegadamente furtados. A poucos metros do edifício que funcionava como entrada principal, já em zona arborizada, está naquele dia uma máquina de tabaco vandalizada e uma de brindes. Estão as duas abertas e vazias.
Terrenos estão limpos e terão nova função
A presidente da câmara de Matosinhos, Luísa Salgueiro, que na altura da assinatura do contrato com a Ritmolândia estava na Assembleia Municipal, pelo PS, diz que os terrenos vão finalmente voltar a ter utilidade. Longe do propósito para o qual estavam destinados em 2012, serão usados como base de apoio a outra obra que será realizada neste mandato por este executivo: o projecto Corredor Verde do Rio Leça.
Esta intervenção, de autoria da arquitecta Laura Roldão Costa, orçada em 10 milhões de euros, consiste na ligação dos passadiços da orla costeira e as margens do rio Leça, ao longo de uma extensão de 18 quilómetros, desde o Parque das Varas, em Leça do Balio, até à foz do rio Leça, em Matosinhos. Este percurso será arborizado, mas para isso será necessária uma incubadora para a plantação das espécies que para lá serão transferidas. A autarca diz que é nos terrenos do extinto Raf Park que serão plantadas as árvores que serão posteriormente levadas para as margens do Leça. Sendo estes terrenos contíguos ao parque ecológico, passarão também a fazer parte do mesmo.
Quanto aos equipamentos que ainda lá estão, entende ser necessário que lhes seja dada uma nova função, de forma a serem integrados nos “trabalhos de promoção ambiental” que ali vão ser levados a cabo. “A piscina foi vandalizada, mas o tanque continua em bom estado. O edifício pode ser adaptado facilmente”, afirma.
Na campanha eleitoral das últimas autárquicas passou pelo local e admite que aquela área estava em “muito mau estado”. Há pouco tempo voltou lá e diz ter visto um cenário completamente diferente, após os trabalhos de limpeza que diz terem sido levados a cabo recentemente. “Ao fim de uns meses, quem viu aquela área e a vê agora já consegue perceber o fim que aquilo pode ter e de que forma se enquadra na política de reflorestação e promoção do parque ambiental”, conclui.