Eucalipto só dominava num dos sete grandes incêndios de Outubro

Relatório dos peritos mostra que, para a propagação do fogo, mais importante do que a espécie é se há acumulação de matos ou não.

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paulo pimenta

Dos sete grandes incêndios de Outubro de 2017, em apenas um o eucalipto era a espécie dominante. Dos restantes, cinco atingiram áreas onde o pinheiro-bravo imperava e um ocorreu em zonas de matos. Isto vem confirmar que, quando os fogos atingem determinada dimensão, é irrelevante que vegetação cobre o terreno. O que é crucial é se há acumulação de matos ou não, ou seja, se há gestão. É aqui que está o busílis da questão, não na espécie.

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Dos sete grandes incêndios de Outubro de 2017, em apenas um o eucalipto era a espécie dominante. Dos restantes, cinco atingiram áreas onde o pinheiro-bravo imperava e um ocorreu em zonas de matos. Isto vem confirmar que, quando os fogos atingem determinada dimensão, é irrelevante que vegetação cobre o terreno. O que é crucial é se há acumulação de matos ou não, ou seja, se há gestão. É aqui que está o busílis da questão, não na espécie.

A Comissão Técnica Independente (CTI) conclui que foram, obviamente, o pinheiro-bravo e o eucalipto as espécies que mais arderam em 2017 pois são também estas as espécies dominantes nas zonas do país atingidas pelos incêndios. “Em média a área de pinheiro-bravo ardida em 2017 correspondeu a 17,4% da área existente em 2010”, conclui a CTI. A média global do eucalipto foi de 11,9%.

O que realmente faz a diferença é a existência ou não de matos nestas áreas, ou seja, se há gestão. Face aos dados, a CTI conclui que “as áreas de eucaliptal puro com mato arderam numa percentagem de 14,6% em comparação com as áreas sem matos em que essa percentagem foi apenas de 6,0%”. Quanto ao pinheiro, “arderam 11,1% das áreas de povoamentos puros sem matos contra 19,6% de povoamentos puros com matos”. Quando as duas espécies se juntam numa mesma zona, onde ainda por cima exista muito material seco no solo, o resultado é explosivo.

O ideal é a mistura destas espécies com outras como os carvalhos, o pinheiro-manso ou o sobreiro. Mas, reforça a CTI, “é de registar a muito significativa redução da probabilidade de arder de povoamentos puros com a redução dos matos no seu sob-coberto”, isto é, geridos.

O exemplo mais óbvio desta premissa é o que aconteceu nas áreas de eucalipto sob gestão industrial das celuloses, zonas onde o fogo não teve grandes hipóteses de progredir, quer porque há plantações jovens, quer porque não há muito combustível à superfície. Aliás, mesmo na restante área ardida, os dados da CTI mostram uma “diminuição da severidade do fogo para maiores taxas de ocupação por eucalipto, e o seu aumento quando os matos estão mais representados”. As explicações para isto são as mesmas: provável gestão mais activa e povoamentos mais jovens. 

Mas há um terceiro factor: o pinheiro arde mais porque o fogo é de copas e as chamas podem atingir os 10, 20, 30 metros. No caso do eucalipto, o fogo é de superfície, portanto as chamas não passam dos cinco a dez metros, explica Paulo Fernandes, que fez parte da CTI. Em contrapartida, embora todas as espécies façam projecções, nenhuma bate o eucalipto que pode lançar faúlhas a três quilómetros de distância.

Quanto às espécies que menos ardem, como o pinheiro-manso, o sobreiro, a azinheira ou o castanheiro, todas têm menos mato o que torna mais difícil a propagação de fogos de copa, que são os mais difíceis de combater.

No fundo, “há um certo racismo na comparação das espécies face ao fogo porque a diferença está na gestão. Se esta existir, a espécie torna-se irrelevante”, conclui Paulo Fernandes.